Isabel Mota iniciou a sessão da manhã começando por apresentar o retrato das políticas sociais em Portugal, para depois explanar o seu ponto de vista sobre o desenvolvimento de Portugal num contexto de coesão social e implementação Políticas Públicas.
A oradora do tema da manhã começou por diagnosticar as questões demográficas mais determinantes para o País, do ponto de vista social, como o envelhecimento da população, a integração dos imigrantes e a reabsorção do desemprego estrutural. Estes são, para Isabel Mota, os grandes desafios em termos das políticas sociais para os próximos anos. “O futuro do nosso Estado Social depende do nosso crescimento económico.
Não pode haver mais estado social sem crescimento económico. É demagógico dizer que o país tem uma política social boa, se não existe crescimento económico”, afirmou.
Isabel Mota alertou os alunos da Universidade de Verão para a situação portuguesa, que considera preocupante, dado que dezoito porcento da população encontra-se em risco de pobreza e que vinte e seis porcento da população em risco de pobreza é idosa – faixa em que as oportunidades são obviamente menos.
Para a oradora, que é administradora da Fundação Calouste Gulbenkian, a coesão social nos próximos anos dependerá do progresso económico, mas também do inevitável ajustamento do modelo social actual.
No pensamento de Isabel Mota, o novo modelo social assentaria, desejavelmente, na responsabilidade do Estado como garante da universalidade de acesso a serviços sociais essenciais como são a educação, a saúde ou as pensões. Tal condição exige o “redimensionamento do papel do Estado como prestador directo desses serviços sociais, apostando numa maior diversidade e mais forte competição entre prestadores desses serviços e numa maior responsabilidade e oportunidade e liberdade de escolha dos cidadãos”.
Por seu turno, exige-se ao Estado “a responsabilidade na criação de uma rede social eficiente no combate à exclusão social, focalizada nos sectores mais fragilizados da população, dando à sociedade civil possibilidade de participar nos projectos”.
Isabel mota não considera viável qualquer aumento de impostos para aumentar as prestações sociais.
Defende, por seu turno que o novo modelo social deve assentar na implementação de políticas públicas de inclusão que sejam incentivadoras da integração no mercado de trabalho e mobilizadoras da energia da sociedade civil. Assim, o reforço e capacitação de instituições da sociedade civil que intervêm na área da protecção social torna-se forçoso neste novo modelo social.
A oradora aprofundou a temática, dando o exemplo de algumas medidas que podem enformar um novo modelo social, como seja através da reorganização do envolvimento dos indivíduos no mercado de trabalho por políticas de diferenciação ao longo da vida activa, ou pelo prolongamento da vida activa, desde que compatível com a qualidade de vida, passando também por uma reforma dos sistemas de pensões que permita uma melhor gestão dos impactos económicos e sociais da dinâmica demográfica, bem como pela mobilização de poupanças para o desenvolvimento.
Como focos prioritários de acção no curto prazo, Isabel Mota identificou a situação da população idosa, mais carenciada em termos de saúde, que carece de apostas em mecanismos integrados de acompanhamento.
A situação dos desempregados em faixas etárias entre os 40 e os 50 anos, a integração social da população imigrante e o combate às forças de marginalidade ou a situação das famílias com maiores problemas de endividamento, de forma a evitar maiores rupturas sociais são outros focos prioritários em que urge tomar medidas de curto prazo.
No período destinado às questões dos alunos, através dos interpeladores nomeados no seio dos grupos foram abordadas questões como: política de natalidade; funcionamento, articulação e apoio às Instituições Particulares de Solidariedade Social e associações; ensino especial; solidão e apoios sociais no interior do país; renegociação dos acordos entre o Governo e os ATL; recurso ao crédito; idade legal de aposentação, e o fracasso do complemento solidário para idosos.
Durante a tarde, Garcia Leandro e Armando Marques Guedes debateram-se num frente-a-frente, na defesa dos seus candidatos à Casa Branca. Os alunos da Universidade de Verão não são indiferentes à actual realidade política internacional e por isso a UV2008 consagrou um espaço de debate dedicado às eleições presidenciais nos Estados Unidos da América.
Os brilhantes intervenientes debateram-se afincadamente pelas ideias e candidaturas que defendiam: Garcia Leandro, por John McCain e Armando Marques Guedes por Barack Obama.
As perguntas colocadas pelos alunos após o debate, incidiram sobre o posicionamento dos candidatos relativamente a questões como a segurança e política externa, relacionamento EUA-UE, sistema de saúde, educação, médio oriente, energia e armamento nuclear.
O conferencista do quinto dia da Universidade Francisco Sá Carneiro foi Arlindo Cunha.
Como é tradição da Universidade de Verão, o director Carlos Coelho lançou a pergunta que introduziu a conferência.
Carlos Coelho questionou Arlindo Cunha sobre a escalada do preço dos bens alimentares, adiantando que “a cada ano temos que ter recursos para alimentar mais 28 milhões de habitantes. Cerca de um terço da população mundial sobrevive com menos de um euro e sessenta cêntimos por dia”.
Uma enorme parte destas populações tem que comprar a sua alimentação e por isso, “há locais onde a subida de preços é a diferença entre viver e morrer”, disse.
Feita a introdução à conferência, Carlos Coelho solicitou que Arlindo Cunha transmitisse o seu pensamento sobre a política agrícola seguida pelo governo socialista.
O antigo ministro, que presidia o Conselho de Ministros de Agricultura da UE que aprovou a reforma da Política Agrícola Comum (PAC) em 1992, começou por apresentar um enquadramento da “crise altista dos preços nos mercados agroalimentares mundiais”.
O antigo deputado europeu do PSD responsável pela área da agricultura explicou que o ciclo contínuo de descida dos preços nos últimos trinta anos foi abruptamente interrompido pelo fenómeno a que chamou sismo dos mercados de 2007 e 2008. Num curtíssimo espaço de tempo, os preços de bens essenciais subiram entre 25 e 50%, “matéria que de modo algum devemos deixar de considerar grave”, por acarretar consequências sociais graves nas famílias de mais baixos rendimentos.
Sobre a crise propriamente dita, esta deveu-se a diversos factores conjunturais e estruturais como o “aumento da procura nas economias emergentes, maus anos agrícolas em alguns países, especulação financeira nos mercados com produtos financeiros commodity based, o desvio da produção para biocombustíveis e o aumento dos custos dos combustíveis, com efeitos efeitos nos transportes, energia e produção pecuária”.
Arlindo Cunha apresentou aos alunos da UV2008 estimativas de duplicação da procura alimentar em 2050, para mais 3.000 milhões de habitantes. O orador afirmou que o pico da escalada nos preços está desfeito, mas que ficaremos num planalto por longos anos (…) como terminou a época do petróleo barato, também acabou o tempo da comida barata”, avisou.
O antigo ministro da Agricultura deixou ainda um relato de algumas lições a extrair para o futuro. Arlindo Cunha considera urgente “repensar políticas de globalização e liberalização” e informou que quando a crise começou, os países mais liberais foram os primeiros a impor restrições às suas exportações”. Verifica-se pois “a necessidade de maior regulação dos mercados que permita aos países menos avançados condições para desenvolver a sua produção”.
Arlindo Cunha defende que se deve repensar a política de novas tecnologias, dado a evidência do fim do ciclo da evolução tecnológica baseada na mecanização e nos agro-químicos, devendo apostar-se nas biotecnologias e “acabar com a política de meias tintas em matéria de autorização de transgénicos/Organismos geneticamente modificados”.
Para o orador convidado para o jantar do quinto dia da UV2008, é “importante repensar o modelo de reforma da PAC seguido nos últimos 20 anos num contexto de mercados excedentários, em que o objectivo era desencorajar os agricultores de produzir”.
A crise deve fazer-nos rever o programa de apoio à produção de biocombustíveis e “buscar soluções que não conflituem tanto com produção alimentar, como são o caso a jatropha, a cana do açúcar, o cardo e a biomassa florestal”, disse.
Arlindo Cunha lamentou que “apenas uma crise profunda dos mercados agroalimentares tenha feito perceber que a agricultura tem uma evidente importância estratégica para a estabilidade e soberania das sociedades”.
Para finalizar o período da sua intervenção, Arlindo Cunha referiu-se à situação portuguesa, apontando os erros do Governo em matéria de política agrícola.
O Governo “conseguiu acabar com a electricidade verde, mas mantém congelado o subsídio ao gasóleo agrícola”, num contra-senso.
Ao elaborar o PRODER (Programa de Desenvolvimento Regional) para 2008-2013, o Governo excluiu das fileiras estratégicas os cereais, o leite, as oleaginosas, a carne e os ovos, mas consegue incluir outros produtos bem menos “essenciais” como os cogumelos e produtos tradicionais. O Governo conseguiu mesmo manter-se durante mais de metade do mandato sem distribuir qualquer apoio à modernização da agricultura.
Arlindo Cunha criticou o plano, “por apoiar apenas 6% do número total de agricultores, num período de seis anos”. O Governo conseguiu esquecer-se de tal maneira da agricultura que recentemente devolveu a Bruxelas 70 milhões de euros por não ter os 15% de investimento pela comparticipação nacional.
O actual governo acabou também com um “processo de descentralização que passava pelas organizações de agricultores2. O Ministro da tutela “anunciou a realização de uns Estados Gerais da Agricultura, mas certamente vai fazê-los sem os agricultores”, ironizou.
Após a intervenção inicial seguiu-se um período de perguntas por parte dos alunos.
Arlindo Cunha foi questionado em matérias como o futuro da vitivinicultura em Portugal, o licenciamento de actividades pecuárias, a política para as florestas, os problemas ambientais associados à produção agrícola, a ruralidade e a política para as pescas. |