ACTAS  
 
9/6/2008
As Fronteiras do Direito: Direito, Direitos e Questões moralmente controversas
 
Dep.Carlos Coelho
- Eu saúdo a presença do prof. dr. Miguel Poiares Maduro que veio de propósito de Bruxelas, melhor deveria dizer do Luxemburgo para a Universidade de Verão. O Prof. Miguel Maduro é como sabem um português, um português notável, ele como Presidente do Colégio de Advogados Gerais do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, é professor universitário, tem como hobby o hedonismo em geral, mas em particular o cinema, cozinhar e jogar futebol. Eu acho que isto do cozinhar é só para vosso consumo, porque quando ele me convidou a casa dele dizendo que era ele que cozinhava foi um serviço de catering que assegurou a refeição.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- É que o deputado Carlos Coelho não quis correr riscos como é óbvio. (Risos)
 
Dep.Carlos Coelho
- A comida preferida é a que está constantemente a ser reinventada; o animal preferido é o cavalo; (se eu vos disser você fez uma pergunta que nem um cavalo é um elogio não é uma crítica), o livro que sugere é “Imperfect alternatives choosing institutions in law economics and politics”; o filme que sugere “Mr. Smith goes to Washington” do Frank Capra e “Unforgiven” do Clint Eastwood; e a principal qualidade que mais aprecia é a honestidade.

O prof. Poiares Maduro aceitou este exercício diferente. Ele esteve na última Universidade de Verão a dar uma aula, muito interessante, mas clássica sobre Europa. E aceitou desta fez não vir fazer uma intervenção mas vir responder às vossas questões sobre os temas que foram seleccionados.

Vamos repetir as regras, o grupo faz a pergunta em dois minutos, o prof. Poiares Maduro vai responder em 4 a 5 minutos, a seguir há uma repergunta de 1 minuto e há uma resposta rápida do nosso convidado de 2 minutos. Depois o tempo final, se sobrar, será de debate aberto. Portanto 2, 5, 1, 2. Vamos começar com o primeiro tema sobre a “Inviolabilidade da vida humana - a questão da pena de morte” e quem vai fazer a pergunta é a Ana Veloso do Grupo Amarelo.

 
Ana Velosa
- Bom dia. Eu neste dia trágico e complicado, uma situação que abalou toda a minha, a vida da minha família, peço desculpa. É complicado falar sobre este assunto tão recente, toda esta situação faz com que eu não consiga olhar para este sujeito que tenho ao meu lado, que foi capaz de fazer a maior atrocidade, foi capaz de me tirar o chão.

Aproveitando a ausência do meu cunhado foi capaz de violar as minhas duas sobrinhas uma de sete e doze anos, crianças, crianças indefesas que não se podiam defender a si próprias. Para além disso violou a minha irmã, como se não bastasse assassinou-a, tirou a vida da minha irmã, ela jamais irá voltar. Como é possível, não foi a primeira, não foi a segunda foram várias vezes que este indivíduo foi capas de fazer isto e eu pergunto, eu pergunto: será que poderemos admitir isto. Este sujeito não merece viver, porque a minha família sofreu com tudo isto e jamais, jamais conseguiremos ser os mesmos. Obrigado.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
Em primeiro lugar, lamento as circunstâncias pessoais que vive neste instante. Mas como é óbvio, as respostas que o Direito e que uma comunidade política deve dar a esse tipo de questões não podem ser dominadas apenas, e só, embora a dor de uma vítima deva ser tida em conta, não podem ser determinadas nesses instantes que são dominados pela emoção de alguém que foi vítima de um acto particularmente grave, sério e que de certa forma alterou completamente a sua vida.

Mas antes de responder à sua pergunta e à questão concreta da aplicação da pena de morte, e de discutir um pouco convosco essas questões, eu queria só dizer duas coisas prévias, que acho que é importante.

Estes temas que estão aqui e penso que outros que eventualmente serão suscitados, são temas que suscitam questões de natureza moral, filosófica com que se confronta qualquer sistema jurídico e qualquer sistema de justiça. Mas, as respostas a dar a essas questões são fundamentalmente respostas de natureza política, não são respostas do domínio da ciência e da técnica.

Eu digo isto, porque, em Portugal, muitas vezes há uma tendência de fazer uma espécie de outsourcing técnico de questões políticas. Enquanto muitas destas questões no fundo obrigam-nos a tomar posição sobre o equilíbrio, e o balanço que nós queremos fazer na nossa sociedade: entre valores de segurança e privacidade, ou segurança e liberdade. Como é que queremos distribuir o risco no contexto da nossa sociedade. E isso, são questões fundamentalmente políticas. Agora o que acontece é que a política tem que ser informada. Por um lado, tem que ser informada por uma filosofia política, que é uma concepção que temos sobre os princípios em que se deve assentar a nossa comunidade política, que nos vai ajudar precisamente a tomar essas opções, entre os equilíbrios que queremos entre segurança e liberdade e outro tipo de matérias.

E tem de ser depois informada pela técnica e pela ciência, que nos ajuda a tomar essa opções de uma forma consciente, racional. Para que esse processo seja um processo deliberativo racional.

Queria dizer-vos isso para acentuar que as respostas que eu vos vou dar, por um lado, é para vos procurar na medida do possível, e na medida dos meus conhecimentos, porque muitas destas questões não são questões da minha especialidade enquanto jurista, e, portanto, nalgum aspecto eu vou estar aqui a reflectir convosco; e nalguns casos, como é o caso da pena de morte, em princípio quase todos somos contrários, a procurar de certa forma articular porque é que nós temos essa intuição de oposição à pena de morte. Explicitar as razões para isso.

Isso implica necessariamente que, por um lado, eu irei procurar dar alguma informação e discutir convosco quais podem ser as consequências, o que é que deve resultar dessa informação, do que nós conhecemos relativamente a essas matérias; e, por outro, será inevitável que relativamente a algumas dessas questões, na medida em que eu tomo posição também exprima uma certa, a minha filosofia relativamente a estes temas. A minha filosofia política, a filosofia política que está subjacente às tomadas de posições que eu adoptar nesse sentido.

No que concerne à pena de morte, a resposta mais típica mais usual que é dada relativamente à pena de morte é dizer que as posições que se tomam quanto à pena de morte estão em dois pólos opostos, uns que entendem que, que se baseiam e que defendem a pena de morte no contexto de uma lógica retributiva e vingativa até do Direito Penal. No sentido em que o criminoso deve ser obrigado a sofrer tanto como a vítima sofreu.

E do outro lado do pólo oposto, aqueles que se opõem à pena de morte numa lógica, defendendo que o Estado nunca pode agir contra a vida humana, nunca pode colocar em causa a vida humana. E que mais do que isso, nós temos de acreditar no potencial humano de reabilitação, de que qualquer pessoa pode ser reabilitada.

Ora, a verdade é que há algo de artificial nesta resposta, porque é possível defender a pena de morte sem o fazer numa lógica retributiva, é possível opor-se à pena de morte e é o meu caso, sem acreditar necessariamente, totalmente nesta segunda posição.

O ponto de partida no nosso Estado de direito democrático constitucional que temos hoje em dia, é que esse Estado assenta numa ideia fundamental de protecção da dignidade humana. E que essa ideia de dignidade humana corresponde a um conceito de que toda a vida humana tem igual valor, e de que as vidas humanas não são comparáveis, nem fungíveis. Não podemos trocar umas por outras, não podemos aceitar uma lógica utilitarista, de que salvar um certo número de vidas humanas pode justificar matar um número mais reduzido de vidas humanas.

Mas isso não significa que o Estado não avalie a vida humana. Avalia muitas vezes quando aceita certo tipo de riscos em sociedade e avalia igualmente quando aceita certo tipo de acções que visam a morte de alguém para salvar outras pessoas.

Vejam o caso recente do sequestro que aconteceu, nessa circunstância todos nós aceitamos, não sei se essas condições estavam reunidas nesse caso concreto, isso implica um inquérito que está a ser realizado nessa matéria. Mas numa circunstância abstracta daquele tipo, em que alguém está a ameaçar directamente a vida de outra pessoa, é óbvio que nós aceitamos o uso da força pelo Estado.

Ora, o que acontece é que esse uso da força apenas pode ter lugar em circunstâncias excepcionais que é a legítima defesa, ou a legítima da própria pessoa ou a legítima defesa de terceiros que é uma circunstância desse tipo.

O que acontece igualmente, é que, há crescentemente, quem defenda a pena de morte numa lógica desse tipo de legítima defesa, dizendo que no fundo a pena de morte tem uma função preventiva. Basicamente o argumento assenta em estudos económicos que demonstram que a pena de morte tem uma função de prevenção de mais homicídios, há um grande número de estudos económicos que demonstram que por cada pessoa que é executada pode-se evitar entre 3 e 8 homicídios.

Mas estes argumentos só seriam válidos, ou seja, só poderíamos aceitar essa lógica de que a prevenção que é gerada pela aplicação da pena de morte, em termos de prevenirmos outros homicídios, corresponde a uma forma de legítima defesa colectiva, só seriam válidos se, por um lado, não houvesse uma alternativa à pena de morte. Eventualmente que é a prisão; e em, segundo lugar, se não houvesse o risco de erro. Que é a possibilidade de que não vamos matar alguém que é responsável, não seria uma pessoa que iria cometer um crime mas vamos matar um inocente.

E portanto, a partir do momento em que há a possibilidade de erro na pena de morte é óbvio que entramos numa lógica utilitarista, de que nós podemos aceitar trocar a morte de alguns inocentes para salvar um número muito maior de mais inocentes. E a partir do momento em que entramos por aí é muito difícil estabelecer uma fronteira, e onde é que nós paramos não é, a esse respeito.

Claro que isto suscita depois uma outra questão que é: então se nós racionalizarmos nestes termos a nossa oposição à pena de morte, não numa ideia de protecção absoluta da vida humana, porque na realidade nós sabemos que o Estado não protege de forma absoluta a vida humana; mas numa ideia de que ela não corresponde a uso legítimo da defesa colectiva, ou da defesa de terceiros.

O que é que acontece com questões como, por exemplo, a prisão perpétua, o que é que acontece relativamente a isso? Que situação é que o Estado deve tomar relativamente a isso? E essa é uma outra questão interessante, mas se quiserem nós podemos eventualmente no decurso da debate falar sobre isso.

 
Dep.Carlos Coelho
- Juliana Catarino Grupo Rosa.
 
Juliana Catarino
- Bom dia, nós temos para perguntar: afinal que direito é que tem a sociedade ou outro ser humano de retirar a vida a outro? Se estamos a falar como falou aqui a colega, que falou um senhor que violou, que matou. Mas, afinal, a sociedade perante estas situações, ela pode decidir o que é justo e o que não é justo? Falamos de vidas humanas, não é. Obrigada.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Bem, a sociedade pode decidir o que é justo e não é justo, fá-lo constantemente quando pune pessoas. A questão é que como a vida humana tem um valor particularmente reforçado, não é um valor absoluto como vos disse, porque nós aceitamos situações de legítima defesa, e aceitamos mesmo situações que é o Estado que age pondo em risco a vida de uma pessoa, o caso do sequestro para salvar a vida de outra. Mas como a vida humana tem um valor particularmente forte e protegido na nossa sociedade, essa circunstância deve se excepcional por um lado, deve ser particularmente grave para permitir isso, e não deve existir outra alternativa possível.

O que eu quero aqui é, de certa forma, ser transparente nas razões pelas quais nós nos devemos opor à pena de morte. Não é suficiente para mim dizer a vida humana é um valor absoluto, isso é de certa forma uma falácia. Porque da forma como o Estado organiza o seu exercício do poder por vezes não é um valor absoluto. O que é, é a pena de morte não é necessária, e é excessiva face a outras formas que temos de proteger, de exercer essas instâncias de legítima defesa.

Legítima defesa própria ou legítima defesa colectiva.

 
Dep.Carlos Coelho
- Muito obrigado vamos continuar com este caso da dignidade da pessoa humana com uma pergunta do grupo Rosa, a Catarina Gomes.
 
Catarina Gomes
- Bom dia a todos. Todos os dias são noticiados novos casos sobre este animal, e uma vez que não se pode aplicar a pena de morte exijo no mínimo que o Ricardo seja pelo menos castrado. Quero que a castração química de pedófilos reincidentes seja aprovada. Este monstro seja castrado para que nunca mais volte a destruir a vida de seres inocentes.

Prof. Miguel Maduro, o sr. concorda? Muito obrigado.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Em primeiro lugar, penso que se estão a referir à castração química, não é. Não à castração física. Que ainda é aplicada nalguns regimes, mas curiosamente, por um lado, é uma mutilação, portanto, de novo é uma intrusão particularmente grave na dignidade humana. A dignidade humana inclui o respeito à integridade do corpo de alguém; e, por outro lado, a castração física é tremendamente ineficaz, porque não elimina o desejo sexual.

A castração química, para aqueles que não sabem, baseia-se fundamentalmente na aplicação de contracepção feminina aos homens, visando diminuir a testosterona, e, portanto, o desejo sexual dos homens. Ela é hoje em dia curiosamente aplicada voluntariamente nalguns países da Escandinávia. Na Escandinávia ela existe, a castração química, mas de forma voluntária. Ou seja, pessoas que foram condenadas por determinados crimes sexuais, podem depois solicitar ao Estado que lhes seja aplicada a castração química. Há outros Estados nos Estados Unidos e na França discute-se isso hoje em dia igualmente, existe para além dessa possibilidade voluntária, uma possibilidade de solicitar a castração química como condição de liberdade provisória. Portanto, alguém que foi condenado por um crime sexual incluindo a pedofilia, e que tem a possibilidade de ser libertado de forma provisória, com liberdade condicional, só pode ter essa se o juiz lhe impuser um regime de castração química, portanto é um outro regime voluntário. Não há nenhum sistema que eu conheça que imponha obrigatoriamente a castração química.

O problema da castração química é um problema de respeito da dignidade humana de novo. Porque a dignidade humana incluiu de novo uma valoração particular da vida de todas as pessoas, isso incluindo a sua integridade física, mas inclui outro aspecto que é uma ideia de autonomia pessoal. Qualquer indivíduo deve poder traçar o curso da sua vida através de uma sucessão de escolha entre diversas opções, no fundo. Procurar ter o seu caminho de felicidade, e que isso inclui, necessariamente, a sua vida sexual também.

A castração química é em princípio algo que afecta a dignidade pessoal das pessoas, e, desde logo, isso é um dos problemas acrescido à castração química.

Há outro problema interessante que é o problema discriminação, é que a castração química é discriminatória. Porquê? Porque só pode ser aplicada a homens e não são apenas homens que cometem crimes sexuais.

No entanto, atendendo a que a crítica principal da castração química é, essa ideia de que nós estamos a delimitar o leque de opções de vida de alguém, na medida em que for voluntária, penso que pode ser considerada admissível. Na medida em que seja voluntária a castração química até deve ser vista não como uma punição, mas como uma forma de tratamento. E é dessa forma que ela é concebida em muitos regimes.

Da mesma forma que as pessoas que cometem crimes sexuais estão sujeitas a tratamentos de carácter psiquiátrico, a castração química é vista nalguns dessas países, por exemplo, na Escandinávia, mas hoje em dia também no Reino Unido é outro país em que se discute isso, como uma forma adicional, complementar desse tratamento.

Mas ela só pode ser concebida como tratamento se for concebida de forma voluntária, como uma escolha que essas pessoas podem ter.

E há outra circunstância a ter em conta: é que a castração química nem sempre é eficiente. Há um debate muito grande sobre a eficiência da castração química. Eu quando o Carlos me deu uma ideia destes temas fui ler alguns textos, e alguns estudos a esse respeito e os estudos científicos parecem variar muito. Há quem diga que pode eliminar 80% da taxa de reincidência dos crimes sexuais, porque essa é a primeira, isso é que está na origem das solicitações de imposição da castração química, é que a taxa de reincidência é particularmente elevada, é 45%.

Mas, por outro lado, há uma discussão muito grande em termos científicos para saber até que ponto é que a castração química, que no fundo procura eliminar o desejo sexual, é ou não eficaz, também.

E um dos problemas a esse respeito é que parece que os crimes sexuais têm muitas origens, nem todos têm a sua origem no desejo sexual, curiosamente. Há outros que têm outro tipo de origem. As pessoas cometem crimes sexuais mas na verdade são motivadas por circunstâncias totalmente diferentes. E isso de novo leva a acentuar que a aceitarmos a castração química ela deve ser concebida como um tratamento, e portanto deve ser uma decisão jurídica mas sobretudo dirigida através de uma avaliação médica e complementar a um tratamento de carácter psiquiátrico.

 
Dep.Carlos Coelho
– Grupo Roxo, Marie Claire.
 
Marie Claire
- Muito bom dia. Nós concordamos com a posição que o dr. Poiares Maduro acabou de nos apresentar aqui. No entanto, a nossa dúvida prende-se com as críticas que muitas vezes são feitas à castração química.

Então, o que é que o sr. dr. opina quando lhe são apontadas críticas como, o facto de ser considerado um atraso para a humanidade e uma inconstitucionalidade, na medida em que, precisamente vai e atenta contra a dignidade humana do agente? Muito obrigado.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Primeiro ponto era que era considerado inconstitucional, era o segundo o primeiro já não me recordo, a primeira crítica.
 
Marie Claire
- Um atraso para a humanidade.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Esse é o tipo de expressões que eu tenho sempre muita reserva em abordar, porque tenho que explicar porque é que é um atraso para a humanidade, e eu até posso considerar que isso é assim. Mas dito dessa forma é apenas um instrumento de retórica. E o que eu acho que nós devemos atender nesta matéria é que, ela pode ser um atraso para a humanidade pela segunda razão que diz, se atentar contra a dignidade humana.

Eu não tenho dúvida que a castração física atenta contra a dignidade humana, já quanto à castração química se de forma voluntária, e se conduzida através de uma análise médica, eu não estou tão seguro que atente necessariamente contra a dignidade humana. Penso que pode ser concebida como uma forma de tratamento. Mais, até porque em muitas circunstâncias a castração química pode ser reversível, e até há alguns estudos médicos que dizem que nalgumas circunstâncias, não sei bem porquê, mas, uma pessoa que tenha cometido crimes sexuais e que seja sujeita a esse tipo de tratamento, o tratamento da castração química, pode manter o desejo sexual em relação ao seu parceiro habitual embora o perdendo em relação a terceiros. O que é uma coisa que eu não sabia, não sei bem porquê, mas em termos médicos alguns dos estudos aparentemente indicam isso.

Portanto, se nós concebermos a castração química dessa forma, como uma opção voluntária que as pessoas podem tomar, e na medida em que ela possa realmente ter um efeito nessa matéria, pode ser concebida como uma forma de tratamento e não vejo que seja necessariamente um atentado contra a dignidade humana.

 
Dep.Carlos Coelho
- Bem, passamos para um tema diferente: “Limitação de mandatos electivos”, Grupo Roxo, Ivan Duarte.
 
Ivan Duarte
- Exmo. Sr. Prof. Miguel Poiares Maduro, o meu governo está no comando político da nossa pátria há três mandatos consecutivos, este é um sinal de que este governo e o PSD têm toda a confiança do povo para os representarmos. Como é sabido publicamente, o PS apresentou um projecto-lei cujo conteúdo político visa impedir que este governo se volte a candidatar para um quarto mandato. Quero mostrar, desde já, a minha tristeza e repúdio, enquanto Primeiro-Ministro e enquanto cidadão, por este tipo de actuação anti-democrática, ainda por cima vindo de um partido que se apregoa defensor da democracia.

Tendo em conta a nossa Constituição da República, o artigo 1º é bastante explícito: “Portugal é uma república baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular, e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”.

Todos nós elementos deste governo dedicámo-nos a 100% a esta função que o povo nos destinou, sacrificando a nossa vida familiar e académica, com muito gosto e sentido de missão, e reitero voltaríamos a fazer o mesmo.

Caros companheiros, não podemos é consentir que meia dúzia de compadres e de meninos de monopólio venham brincar e bloquear quem quer governar, para dar ao povo o bem estar e a felicidade que merecem. Por ser a eles que dedicamos a nossa existência, sem eles não seríamos os memos.

Gostaríamos, então, Exmo. Sr. prof. Miguel Poiares, qual a sua posição em relação a esta problemática? Muito obrigada.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- A questão da limitação dos mandatos, no fundo, para respondermos a essa questão temos que partir duma discussão sobre qual é a nossa noção de democracia. Acho que todos estamos de acordo em que a democracia parte de uma ideia de igual dignidade política de todos os cidadãos e que, no fundo, a organização do regime democrático visa maximizar a participação e representação de todos os cidadãos. Ou seja, que todos tenham o direito de ter voz no processo político, mas igualmente inerente à ideia de representação está que as decisões do processo político devem, por exemplo, atender ao seu diferente impacto, em diferentes grupos, em diferentes pessoas.

Daqui resulta que a democracia não é necessariamente uma questão de um maior número. Ou seja, não é apenas e só que o maior número deve ter sempre razão. E a forma como moderamos a democracia, nesse aspecto do princípio maioritário na democracia é através do constitucionalismo.

No fundo o constitucionalismo que institui mecanismos próprios, especiais através dos quais a vontade popular é organizada, e que institui também limites a essa vontade popular, é um instrumento que visa garantir que as decisões democráticas sejam racionais, no sentido em que elas não só ao reflectirem o interesse de todos, reflectem-no de uma forma racional, ou seja, atendendo a todos os custos e benefícios dessas decisões na medida do possível.

Isso significa que normalmente o constitucionalismo visa garantir que não só um maior leque de pessoas possa participar mas, igualmente, que a intensidade com que diferentes interesses são afectados, seja tido em conta no processo político, em primeiro lugar. E, em segundo, que as decisões democráticas sejam livres, informadas e intersubjectivas no sentido em que nós construímos a nossa vontade em debate com os outros. A nossa autonomia individual só é verdadeira quando as nossas preferências não são construídas e elaboras de forma isolada, mas sujeitando-nos ao debate com o outro, à interacção com os outros.

E se nós virmos as constituições democráticas elas têm imensos mecanismos que visam precisamente moderar e modelar a democracia dessa forma. O sistema representativo é um desses aspectos. E quando discutirmos o Referendo se quiserem podemos de novo voltar a essa questão. Visa no fundo o sistema representativo, dar qualidade ao processo deliberativo e diminuir os custos de informação e transacção. Ou seja, permite-nos lidar melhor ao concentrar mais informação num grupo de pessoas que nos representa.

Mas também temos um outro limite à vontade maioritária que são os direitos fundamentais. Mesmo que a maioria num determinado Estado decida alguma coisa, se essa decisão contrariar certos direitos fundamentais essa decisão não é válida, não é aceitável na nossa comunidade política. Portanto, essa é mais um limite à vontade democrática.

Ou pensem, por exemplo, no contexto hoje em dia tão comum (...)

 

(Um minuto inaudível)

 

(...) No fundo, a limitação aos mandatos políticos, a questão que se coloca é: É essa limitação ao princípio puro do voto da maioria, benéfico ou não, a longo prazo, ao funcionamento do sistema democrático? E isso é sempre se quiserem, relativo ao contexto, context related. Ou seja, depende da cultura política desse Estado, predominante nesse Estado, depende dos riscos políticos em determinadas instituições. Em Portugal, por exemplo, é possível que os nossos índices de fraca participação política e de fraca renovação política, justifiquem adoptar medidas como os limites aos mandatos, que no fundo promovam de forma activa essa renovação do processo político. Nós podemos igualmente atender ao tipo de instituição que está em causa, consoante a forma como o processo político aí é tradicionalmente exercido. Ou seja, há ou não riscos de captura desse processo político se as pessoas que o exercerem estiverem permanentemente no poder, de captura por determinados interesses concentrados. Isso depende da instituição concreta. Portanto, o que eu defendo aqui é que de um ponto de vista de princípio de organização democrática de uma comunidade política não há nada que impeça os limites aos mandatos.

Do ponto de vista da sua implementação concreta, não é uma resposta que se possa dar em abstracto, é uma resposta que depende a que instituição é que se referem, que cultura política é que predomina aí, e é na base dessas circunstâncias que nós depois devemos tomar essa decisão.

 
Dep.Carlos Coelho
- Paula Coutinho, grupo encarnado.
 
Paula Coutinho
- Bom dia. De facto a limitação de mandatos é uma problemática que tem sido debatida entre o PS e o PSD e não só, claro. A questão é, não acha que a limitação de mandatos deveria ser os políticos, ou melhor, os políticos eleitos deveriam permanecer nos seus cargos até quando o povo bem entender, tal como referiu o colega do grupo roxo. Ou seja, temos casos e situações em que os políticos estão no Governo ou estão a desempenhar o papel há imenso tempo, no entanto se eles estão lá é porque o povo assim o entendeu e porque estão a desempenhar um papel relevante na sociedade, concorda com a limitação dos mandatos? Obrigada.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Há um risco muito grande, eu dizia enorme, quando nós tiramos consequências sistémicas de circunstâncias individuais. Ou seja, o que eu quero dizer, nesta matéria, é o seguinte: do facto de haver até um político que num determinado momento nós poderíamos entender que ele merecia permanecer no poder, e que o país até pode perder imenso se ele abandonar esse poder, não devemos retirar daí uma regra de princípio para a organização do nosso sistema político, isso é extremamente perigoso. Porque ao retirarmos essa regra ela não vai ser aplicada só nesse caso, vai ser aplicada em muitos outros casos. E portanto a questão nunca deve ser colocada em termos de confrontarmos o risco de irmos perder esta determinada pessoa, que exerce muito bem uma certa função, versus limite de mandatos; mas deve ser sempre colocada em termos do que é que é melhor para o funcionamento a longo prazo do nosso sistema democrático e do nosso sistema político.

E do meu ponto de vista, em princípio, é uma ideia de renovação política e é uma ideia de limite e de constrangimentos aos riscos de captura de alguém que permanece muito tempo na mesma posição, por determinados interesses que estão sempre à volta de qualquer exercício de poder e do risco de concentração de poder. E é nessa medida que a decisão deve ser tomada, em termos de princípio, de princípio de organização do sistema política, não, nunca deve ser uma decisão que nós devemos tomar em função de quanto gostamos ou não de certo titular de um cargo político em concreto. E quanto à circunstância do povo nesse caso pretender que a pessoa permaneça, como já vos disse, o povo também se pode auto-limitar, nós como na vida pessoal, no fundo uma Constituição, é uma forma de auto-disciplina, para as decisões futuras, em que diz, bem, mesmo que eu no futuro venha a entender desta forma, eu hoje em dia auto-limito-me, e no fundo é isso que justifica certos limites à vontade maioritária, e justifica que nós possamos dizer que a nossa concepção das vantagens para o sistema política de um eventual limite aos mandatos, justifica que se impeça que a vontade popular concreta, relativamente a uma determinada pessoa possa vingar nessas circunstâncias.

 
Dep.Carlos Coelho
- Deixem-me só acrescentar uma coisa, complementar aquilo que o Prof. Poiares Maduro disse. O grupo Roxo no caso que levantou, levantou um caso que nunca seria possível, isto é, a limitação dos mandatos faz-se, ou pensa-se relativamente a órgãos executivos directamente eleitos pelo povo, o Governo não é directamente eleito pelo povo, é indirectamente, portanto, é legitimado através dos deputados, nós nunca elegemos o Governo, elegemos é os deputados da Assembleia da República. E em bom rigor, em bom rigor, o facto de se pensar na limitação de mandatos de órgãos executivos directamente eleitos pelo povo, significa que há um preconceito de subversão das regras democráticas por esse poder executivo, ou seja, presume-se que o poder executivo se consiga eternizar e tem que ser imposta a sua limitação por via da lei, porque o regime democrático não é suficientemente capaz de resolver a situação, portanto, nesse caso. É por isso que se fala de limitação de mandatos para as Câmaras Municipais, que são órgãos executivos directamente eleitos, mas não para o Governo. Nós na nossa Constituição temos um caso típico de limitação de mandatos, o Presidente da República, o Presidente da República não pode fazer mais do que dois mandatos consecutivos, e nem sequer é um poder executivo, é um poder moderador, mas é um órgão unipessoal, e portanto, para impedir a eternização no poder.

Em bom rigor, nós nos Governos não vemos muito, é raro na Europa, um Governo que faça três mandatos, porque é muito complicado; já em órgãos executivos directamente eleitos, ou em figuras uninominais é mais comum haver uma reeleição sistemática.

Muito bem, vamos então para outro caso, o próximo caso é um caso de Referendos, e quem vai falar é do grupo Encarnado a Verónica Pereira.

 
Verónica Pereira
- Bom dia, a classe política e os partidos do regime, mais uma vez enganaram o povo, prometeram um referendo sobre a Europa, mas receando os resultados, optaram pela ratificação parlamentar, o povo deve reconquistar a soberania que lhe roubaram. Mas há mais, se num determinado referendo o Sim ganhar com 95% dos votos, estas pessoas podem ainda ser contrariadas pelo Governo, apenas e porque os votantes não atingiram 50% dos eleitores inscritos nos cadernos eleitorais. Isto tem de mudar, mesmo que só votem 100 mil portugueses, sempre são mais do que 232 deputados nos seus cadeirões de São Bento. Proponho uma alteração constitucional que obrigue a sujeitar a referendo todos os Tratados Europeus, o lançamento de novos impostos e questões essenciais do sistema educativo e do código penal, e que o referendo possa ser vinculativo independentemente da afluência às urnas. Prof. Dr. Miguel Maduro, concorda?
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Em primeiro lugar, começo pelo último ponto, que o referendo seja vinculativo independentemente da adesão ao voto, do número de participação, de percentagem de participantes no referendo. A razão pela qual existe essa condição, na maior parte dos países relativamente aos referendos é porque um dos principais riscos inerente aos referendos, é precisamente a sua captura, a captura por aqueles que têm um interesse particularmente concentrado. Ou seja, normalmente em quase todos os assuntos da vida em sociedade há pessoas que são mais intensamente afectadas por eles, e que são mais intensamente mobilizadas por esses assuntos e há outros que tendo uma posição até clara relativamente a eles, não têm uma relação tão próxima com esses assuntos e são chamados interesses difusos, não é? E portanto, têm um incentivo à participação política no que concerne a esses assuntos mais diminuídos. Eu dou-vos um exemplo, que hoje em dia é muito comum nos Estados Unidos da América, nos Estados Unidos da América é conhecido que 80% dos americanos são favoráveis ao controlo em matéria de posse de armas, 80% dos americanos, mas não há um único político americano, incluindo nas actuais eleições presidenciais, que defenda isso. Por uma razão muito simples: é que entre esses 80% de americanos que são favoráveis ao controlo, à posse de armas individual, são muito poucos aqueles que decidem o seu voto em função dessa questão; enquanto nos outros 20% que são favoráveis à liberdade de uso e posse de qualquer arma, eles são muito susceptíveis a decidir o seu voto apenas e só na base dessa questão e isso significa que nenhum político tem o incentivo de ir contra estes, porque sabe que não ganha necessariamente o voto dos outros e perde necessariamente o voto destes 20%. Portanto há 20% de pessoas que capturaram o processo político americano relativamente a esta questão. Ora, nos referendos existe muitas vezes este problema também. Eu dou-vos um exemplo relativamente precisamente aos Tratados Europeus. Quando foi o Tratado de Nice e ele foi referendado na Irlanda, da primeira vez, apenas houve aproximadamente 30% de participação eleitoral, e é óbvio, quem é que foi participar eleitoralmente? Aqueles que estão mais mobilizados, mais anti-europeistas, os outros que beneficiam da Europa normalmente têm uma visão positiva, mas não têm um incentivo particular para ir exprimir a sua oposição à questão europeia, ou a sua posição relativamente à questão europeia nos referendos e portanto o que aconteceu é que desses 30% houve uma maioria que era contrária ao Tratado. Será que isso era a vontade democrática dos irlandeses? Não necessariamente. Porque quando nesse caso houve depois um segundo referendo, não muito tempo depois, com uma participação mais elevada, e como entretanto os outros tinham percebido que havia um risco para a participação irlandesa no processo de integração europeia, a participação foi mais elevada, muitos dos outros que inicialmente não estavam mobilizados e que eram favoráveis ao processo de integração europeia mobilizaram-se, e portanto, vieram participar e acabou por ganhar o voto favorável.

Atenção, que eu não estou a fazer aqui um paralelismo com a solução que deve necessariamente ocorrer agora, no contexto dos actuais problemas com a ratificação do Tratado de Lisboa pela Irlanda, mas apenas a dar um exemplo de qual é a razão para a existência dessa exigência de uma participação mínima para os referendos serem vinculativos. É que se não for, há o risco de eles serem capturados por determinados interesses concentrados. E na realidade, ser uma minoria dentro do Estado que acaba por definir essas políticas.

Dito isto, acho que nem sequer o facto de existir esse requisito de participação mínima, evita os problemas dos referendos, o primeiro é porque eu acho que essa questão da vinculação jurídica ou não, é altamente ilusória nesta questão, nesta matéria. Porque mesmo que a vinculação jurídica não exista, a vinculação política será muito forte. Esse é um dos problemas com os referendos, ou seja, a ideia de que o requisito, o estabelecimento de um requisito de participação mínima é suficiente para proteger esse tipo de situações, não é totalmente verdadeira, porquê? Porque cria, mesmo que a participação seja baixa isso coloca um ónus particularmente forte no sistema político para não ir contra essa decisão referendária, e portanto, pode não existir vinculação política, mas provavelmente existirá vinculação, não digo vinculação jurídica, mas provavelmente existirá vinculação política e isto leva-nos então a outros problemas do referendo.

Eu tenho muitas reservas em relação aos referendos por várias razões. A primeira, é que os referendos promovem as decisões que eu denominaria de decisões de soma zero, ou seja, quem ganha num referendo, ganha tudo, quem perde, perde tudo. Ora no contexto de uma sociedade democrática, muitas vezes é necessário elaborar consensos e é necessário muitas vezes quando nós estamos numa posição de maioria, maioritária, aceitar alguns dos interesses da minoria porque nós sabemos que noutras situações podemos estar numa situação contrária. E esta é uma das vantagens do sistema representativo, que não promove decisões tão radicais em que quem ganha, ganha tudo, e quem perde, perde tudo.

No sistema representativo há sempre um incentivo para atender a alguns dos interesses daqueles que estão em posição minoritária na nossa comunidade política, enquanto o referendo necessariamente provoca decisões mais radicais, de soma zero. Um dos outros problemas dos referendos que é particularmente claro num contexto por exemplo de referendos a Tratados Europeus é que os referendos não conseguem reproduzir as condições deliberativas que são necessárias para certo tipo de questões. Será possível no contexto de um referendo nós reproduzirmos aos cidadãos o contexto negocial próprio de um Tratado Internacional? Quando as pessoas vão referendar, elas vão referendar aquele Tratado em comparação com quê? Com o Tratado que existe? Com outro Tratado hipotético? Mas seria esse Tratado hipotético possível no contexto do poder negocial que o nosso Estado tem? Como é que nós conseguimos reproduzir essas condições? E há outros problemas em termos deliberativos, que há questões particularmente complexas que exigem que a informação seja concentrada num grupo mais pequeno de pessoas que possa tratar essa informação. São no fundo os custos que os economistas designam de informação e transacção, quanto maior o número de pessoas, mais difícil para nós é discutir determinadas questões, mais difícil é todos nós termos a informação suficiente para decidir essas questões de forma informada e daí que nós temos que ser particularmente cuidadosos, há muitas matérias nas quais o referendo não pode ter lugar de acordo com um processo deliberativo informado e racional - e esse é um dos riscos.

Finalmente, o referendo tem outro problema, é que muitas vezes não oferece um mandato democrático, pensem na questão precisamente de novo dos Tratados Europeus, pensem na questão, na recusa, de referendar o Tratado Constitucional em França, qual é o mandato que resulta da rejeição do Tratado para os Governos Nacionais, para os Parlamentos Nacionais? As pessoas querem mais ou menos a Europa? Não há um mandato democrático que daí resulte. Há uma rejeição! Mas nós não sabemos o que fazer e portanto não nos dá uma orientação política para a acção dos cargos políticos. Portanto, é muito susceptível de manipulação porque qualquer instituição política, qualquer partido político, qualquer grupo político pode interpretar e obter uma legitimação particular a partir do referendo da forma que bem entender.

 
Dr.Pedro Rodrigues
- Grupo cinzento. Bruno Barracosa.
 
Bruno Barracosa
- Muito bom dia, Dr. Miguel Poiares Maduro. Focou aqui uns pontos bastante interessantes em relação à questão do referendo, eu gostava de levantar só mais alguns para promover mais alguma discussão. A questão da minoria que acaba dentro do Estado por definir as políticas. Falou da questão da captura e falou da questão de nalguns casos, se não houver este tipo de barreiras, 20% da população, por exemplo, conseguir vincular a restante. A verdade é que num modelo de participação em que se exige uma participação de X percentagem da população, esse risco continua sempre a existir, ou seja, o único verdadeiro modelo em que possivelmente conseguiríamos garantir uma certa representatividade de quem sai vitorioso de um processo de referendo, seria provavelmente a vinculação ou não do referendo, basear-se numa percentagem absoluta, favorável ou não relativamente à população desse país, gostaria saber se concorda, ou se não concorda.

Por outro lado, referiu que muitas vezes nos referendos não é a vinculação jurídica que tem maior relevância mas sim a política. Em diversos casos, já assistimos, políticamente falando, a/ou opções divergentes do referendo, ou caso o referendo não seja favorável a determinados interesses político, económicos, sociais, mais cedo ou mais tarde a discussão volta a ser acesa, pode ser feito outro referendo ou por vezes mesmo pela via parlamentar. Um exemplo desta situação é por exemplo, como referiu o caso da Irlanda em que apesar de ter havido um NÃO no referendo, obviamente que há uma vinculação política e as pessoas, toda a comunidade europeia afirma que será ultrapassável. Ou seja, até que ponto é que a vinculação política também é tão relevante? E para terminar, muito brevemente, o processo de criação da pergunta de um referendo também era algo que eu gostaria que abordasse, dado que também em si é delimitativo na expressão da vontade do povo. Obrigado.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Em relação, em primeiro lugar à questão da participação e do requisito de participação mínima, eu penso que em quase todos os sistemas normalmente é 50%, nalguns mais do que isso e penso que o que está por detrás da selecção desse valor, 50%, é a ideia de que se houver pelo menos 50% da população que participa, esses 50% já é um universo suficientemente representativo, incluindo dos interesses difusos. Ou seja, por outras palavras, que um grupo concentrado nunca pode, nunca chega a ser numa determinada sociedade 25% dessa comunidade política, e que esses 50% portanto garantem-nos que não é apenas esse grupo concentrado que vai estabelecer o processo. Claro que é um número que nós poderemos discutir, deveria ser mais, deveria ser menos, mas é no fundo esse tipo de dedução que é feita e na base da qual assenta a selecção, a escolha desse valor. Quanto à questão dos novos referendos, no fundo isso é um problema, e da possibilidade de fazer um novo referendo, e de voltar a referendar as mesmas questões, isso é outro dos problemas que colocam por vezes os referendos, não é? Que é uma ideia de paralisia do processo político, certas questões são como colocadas no congelador, deixam de pertencer ao domínio da deliberação democrática o que é problemático, embora, por outro lado, nós tenhamos também nas democracias muitas matérias que nós decidimos, bem, vamos insular estas questões da paixão política do dia-a-dia, fazemos isso, as constituições de novo, há determinadas matérias para as quais exigem maiorias particularmente reforçadas e que no fundo consubstancia isso, a ideia de que o processo político no seu dia-a-dia não deve estar sempre a re-deliberar estas questões.

Mas é óbvio que subjacente a isto está um problema de fundo, que é um problema da chamada democracia inter-geracional, entre gerações. Em que medida é que as gerações futuras devem estar vinculadas às decisões das gerações anteriores? Mas também aqui é possível nos referendos e nos mecanismos referendários, aí é possível ter sistemas referendários que regulam essa questão, normalmente estabelecendo prazos durante os quais a decisão referendária se mantém vinculativa, mas após os quais é possível de novo referendar essa mesma questão.

A elaboração da pergunta é outro mecanismo através do qual se procura precisamente racionalizar o processo deliberativo inerente ao referendo. O que se presume nessas circunstâncias é que se a pergunta for bem elaborada ela provocará uma decisão política racional, no sentido em que as pessoas podem obter a informação suficiente, ou já detêm a informação suficiente para optar de forma informada relativamente a essa questão. E ao mesmo que depois a resposta que é dada, é susceptível de uma leitura democrática clara, aquilo que eu dizia, para evitar os problemas da ausência de um mandato democrático claro e uma ausência de manipulação.

O que eu acho é que na maior parte das questões referendárias é muito difícil elaborar questões que na realidade correspondam a esse ideal.

 
Dep.Carlos Coelho
- Tema seguinte: “Uso da força e monopólio do Estado”. Grupo cinzento, Hugo Sampaio.
 
Hugo Sampaio
- Na qualidade de Presidente da Associação de Ex-Combatentes do Ultramar da Vila de São Jorge da Murranhanha, na última semana senti a necessidade de mobilizar os meus camaradas porque a autoridade nada faz, e quando apanho alguns desses marginais o Sr. Dr. Juiz bota-os cá fora. Esses vândalos andam-nos a roubar o gado, e ainda ontem rebentaram à machadada a porta da igreja para roubar o nosso S. Jorge. Já não podemos acreditar na justiça, eles não param, mas nós vamos parar com eles. Agarramos nas armas que já defenderam a Pátria e juntamos uma milícia para guardar o povo da vila, temos o direito a defender-nos. Subscreve?
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Lamento, mas não. Não subscrevo. A atribuição do monopólio do uso da força ao Estado funda-se numa ideia muito simples, que é a ideia de que esse uso da força deve estar sujeito a regras que garantam o respeito dos direitos de todos e em última análise a legitimidade democrática do exercício dessa força. Porque qual é a alternativa a isso? A alternativa a isso é entendermos que a resolução dos conflitos, ao admitirmos situações como milícias seja sujeita não a processos racionais que determinem quando é que a força deve ser usada, quem é que a pode usar, contra quem é que ela pode ser usada, mas no fundo, qualquer um de nós possa utilizar a força, sempre que entenda que a isso está legitimado pelas circunstâncias a que foi sujeito, pelas circunstâncias sociais. E qual é a consequência disso? É que a resolução dos conflitos nessa altura faz-se apenas e só pela ponderação das forças em presença, por quem tem mais força Não pela legitimação democrática do uso da força e pela sujeição a determinados controlos que nós definimos todos de força colectiva na sociedade, mas acabará por ganhar aquele que tiver mais força, é tão simples como isso. Porque quem lhe diria a si, que nessa circunstância que os criminosos não teriam até mais força que essa milícia popular, por exemplo? Ou que não haveriam outras pessoas que por outras razões não se arrogariam também o exercício da força?

Daí a importância de mantermos uma ideia de monopólio do uso da força por parte do Estado, porque isso é fundamental em termos do nosso sistema democrático e da garantia dos nossos direitos individuais. Isso não significa que não possa, e nós assistimos a isso hoje em dia, que às vezes não possa existir uma espécie de privatização do uso da força, mas isso não é uma perda do seu controlo estadual, nós assistimos a isso, há empresas de segurança privadas, hoje em dia até se fala do Governo fazer acordos com empresas de segurança privada relativamente a essa matéria, mas esse uso da força estará sujeito a regras determinadas pelo Estado. Ou seja, regras que nós determinamos no contexto do nosso processo democrático, e que em última análise são controladas por nós enquanto comunidade política.

Isso não significa igualmente que eu não ache que não se deva atender a essas preocupações sociais de uma determinada comunidade, que a comunidade local que reage dessa forma e que tem esses instintos de exercício da força para repor a segurança que subitamente perdeu, não seja um factor importante que o sistema penal e que o sistema de justiça deva ter em conta, mas deve-o ter em conta de outra forma, digamos que essa contextualização social das questões de segurança e do uso da força devem ser importantes de duas formas, do meu ponto de vista.

A primeira é, por exemplo, algo que eu nunca vejo discutido em Portugal, que é, até que ponto é que nós devíamos atender na composição das nossas forças policiais a uma diversidade étnica e a uma diversidade social, por exemplo. Até que ponto as forças de polícia não deviam atender a circunstâncias como essas.

Em segundo lugar, outra questão muito importante, é a questão do chamado capital social. Há um autor que eu gosto muito americano, de ciência política e de ciências sociais, chamado Robert Putnam, que elaborou um conceito muito interessante, que é conceito de capital social, que é a ideia de que a rede de relações sociais comporta uma mais-valia para a sociedade, que se traduz em mais-valia para a sociedade. Ou seja, a família é uma mais-valia não só em termos individuais dessas pessoas, mas em termos societários, porque muitas vezes é uma espécie de mini Estado social, assegura certas funções sociais, e a mesma coisa relativamente às pequenas comunidades locais, e a outras formas de associação que existam. E uma das coisas que está provada é que onde há mais capital social, ou seja, onde os vizinhos se conhecem, por exemplo, e onde as pessoas comunicam e se organizam socialmente e se reúnem com frequência em determinadas aldeias, ou em determinados bairros, a criminalidade é mais baixa, por exemplo. As taxas de insucesso escolar são mais reduzidas também. E portanto isso diz-nos que uma das circunstâncias que nós devíamos atender, por exemplo, no combate à insegurança é o reforço desse capital social. É até que ponto é que esse capital social tem vindo a ser perdido e até que ponto é que nós poderíamos adaptar medidas para reforçar esse capital social, para reforçar essas redes sociais que no fundo comportam esse tipo de valores.

 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo Castanho. Luís Castro.
 
Luís Castro
- Bom dia Excelentíssimo Sr. Prof. Miguel Poiares Maduro. Para o grupo castanho a segurança é sem dúvida um dos pilares da sociedade e faz parte das funções do Estado, perante a Constituição da nossa República também, apenas as forças policiais e militares na nossa opinião podem usar o uso da força. A questão que nós colocámos e ainda ontem quando estávamos a debater aqui, sobre este tema no nosso grupo, era se existiria alguma vantagem ou se realmente era necessário perante as condições que hoje em dia temos no nosso país e que já não são as mesmas de há vinte, trinta anos atrás, de termos duas forças polícias, quer a GNR, quer a PSP. Hoje, quando entrei aqui nesta sala fiquei deveras surpreendido porque ao ler ali nos monitores, onde temos as nossas notícias a passar, ficámos a saber que o Estado está a ponderar nessa situação. E a questão que nós colocamos fundamentalmente é se realmente é uma boa solução ou não para aquilo que acontece hoje em dia, e se tem ou não tem vantagens para a sociedade portuguesa. Obrigado.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Eu não posso honestamente dar-lhe uma resposta clara a essa pergunta, eu sou contrário àquilo que eu chamo as opiniões de palpites. Eu aqui há pouco tempo num blogue em que eu escrevo muito ocasionalmente, eu dizia que nós somos um país de palpites. E em que muitas vezes as pessoas exprimem opiniões sem terem informação suficiente. Esse é um caso para mim, ou seja, eu admito as duas possibilidades, pode haver razões para ter duas polícias, por exemplo uma especialização de competências, pode justificar, pode haver razões para centralizar, a ideia de que por exemplo é uma coordenação mais eficiente, de que permite uma melhor troca de informações, portanto, pode haver justificações nos dois sentidos, a ideia da separação pode igualmente assentar numa ideia de impedir uma concentração de autoridade numa única força, uma força policial, não sei até que ponto é que isso hoje em dia necessariamente será problemático, a partir do momento em que elas sejam sujeitas a um controlo, por exemplo, judicial efectivo em que existe uma verdadeira separação de poderes nessa matéria e em termos de investigação, por exemplo. Mas, como dizia, acho que pode haver justificações para as duas coisas, para ter um regime de polícias integradas, ou para ter separadas, o que acho importante é que se tivermos um sistema separadas existam mecanismos de coordenação efectiva, e mecanismos de troca de informação efectiva. E que se as tivermos separadas que isso assente numa lógica de especialização de competências e que portanto que possa exigir eventualmente uma reconfiguração das actuais competências que cada uma dessas polícias têm. Será que por exemplo essa configuração de competências ainda é adequada ao actual tipo de criminalidade que temos e, por exemplo, há contaminação de um crime por outro, ou seja, se nós apurarmos que hoje em dia certos tipos de crime, certo tipo de criminosos começam por cometer certos crimes, depois transitam para outros tipos de crimes, essa relação talvez deva promover a que esse conjunto de crimes seja investigado pela mesmo polícia.

Mas isso são questões que eu acho que nós temos de estudar, é o que eu digo, nós temos de ser muito cautelosos nesta matéria. Nós vimos isso, eu ontem vi um artigo do Dr. António Vitorino que curiosamente reproduzia algo que eu tinha nesse post sobre o país de palpites, que era, eu nunca compreendi como é que se alterou tão facilmente as regras relativas à prisão preventiva, porque criou-se esta noção popular que Portugal tinha um índice de prisão preventiva muito superior a outros Estados europeus que não era verdadeira, porque assentava numa comparação errónea, é que em Portugal as pessoas que são condenadas em primeira instância desde que recorram, são consideradas como estando ainda em prisão preventiva, o que não sucede praticamente com nenhum outro Estado que tenha essa regra. Uma coisa é até a pessoa ser condenada, beneficia da presunção, mas após a condenação em primeira instância deixam de ser consideradas como estando em prisão preventiva, Ora é óbvio que atendendo a isso, parecia que Portugal tinha muito mais pessoas em prisão preventiva que outros Estados europeus e não era verdade. E portanto, tomaram-se posições públicas nesse sentido, adoptou-se até legislação na base de palpites, é o que digo e nós temos de ter muito cuidado na circunstância, por isso é que eu não quero opor a uma política de palpites, outras propostas baseadas em palpites.

 
Dep.Carlos Coelho
- Passamos para outro tema: “Eutanásia, direito de escolha sobre a própria vida”, grupo castanho, Carlos Milheiro.
 
Carlos Milheiro
- Bom dia, como médico tive recentemente serviço de banco de urgências do hospital. Chegou uma jovem de 20 anos, vinda de um acidente bastante grave, a única hipótese que nós tínhamos naquela altura era pôr em coma profundo, porque a sua hipótese de sobrevivência era estar ligada àquela máquina

Foi comunicada à família o sucedido, a família pediu-nos como médicos para fazer a eutanásia, que era a única hipótese que tinham para acabar com aquele sofrimento.

Como médico eu não posso realizar isso. No mesmo dia, no final do turno, apareceu um outro caso, de uma senhora já de 40 anos e que tinha muito maiores hipóteses de sobrevivência só que devido ao espaço e todas as condições nós conseguimos salvar a vida dessa pessoa.

Agora a pergunta que eu faço, concorda com a aprovação de uma lei que permita a opção da prática da eutanásia?

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- A minha primeira reacção, eu não reflecti ainda suficientemente de forma profunda sobre a questão, mas em termos de princípio eu não me oponho à eutanásia. Eu diria mais ao suicídio assistido que é aquilo que referiu, porque a eutanásia pode implicar uma decisão por um terceiro, e aí estou em desacordo, ou seja, e pelo próprio princípio pelo qual posso estar de acordo com a eutanásia que é, a ideia de que autonomia individual do meu ponto de vista, inclui o direito de uma pessoa a definir o significado da sua vida e isso inclui do meu ponto de vista igualmente, a definição de entender quando é que ela deixa de fazer sentido. Do ponto de vista de princípio, para mim, esse é o ponto de partida e mais, mas isso significa que eu só admitira enquanto decisão individual da própria pessoa, não decidida por terceiros, mesmo familiares, teria de haver uma decisão da própria pessoa nesse sentido. E uma das razões que eu também juntaria para reforçar essa situação é que na realidade do meu ponto de vista, nós hoje em dia já temos circunstâncias, aceitamos circunstâncias que são mais graves em termos de intrusão do valor à vida quase e da autonomia individual da pessoa do que essa decisão de um suicídio que é decidido de forma racional, deliberada, informada. Quais são? Por exemplo, a diferença entre recusar, em relação ao direito a recusar tratamento e o suicídio assistido é muito pequena, é muito pequena. Muitas vezes diz-se, ah, não num caso envolve a omissão, o noutro caso envolve a acção. Mas qualquer filósofo vos dirá que a distinção entre a acção e omissão é largamente ficcional, ela só é relevante quando a acção e a omissão são dirigidas a uma finalidade distinta. Ora, se a omissão é propositadamente dirigida a provocar a morte naquela pessoa, que é o caso do direito à recusa de tratamento, ela é substancialmente idêntica ao suicídio assistido. Mais, hoje em dia nós já assistimos também, a maior parte das sociedades assistem a isto, eu não sei exactamente qual é a circunstância em Portugal, o caso em Portugal, mas na maior parte dos Estados é assim, (penso que em Portugal também), aquilo que os médicos designam como tratamentos paliativos à dor que sabe que vão resultar na morte, ou seja, doente em estado terminal a que são dados determinados medicamente teoricamente, ou melhor, que são apresentados como visando reduzir a dor, mas que se sabe que inevitavelmente irão provocar a morte, e portanto a diferença disto com o suicídio assistido, do meu ponto de vista, é muito pequena.

Qual é o meu problema com o suicídio assistido, portanto? Não é um problema de princípio, é um problema prático da possibilidade de concretizar em termos práticos esse princípio, esse respeito pela autonomia individual das pessoas, que é, como é que se determina que a pessoa está realmente competente e que a sua decisão é livre, informada, racional? Isto é difícil, porque por exemplo, as pessoas podem estar deprimidas, não é? Qual é a diferença entre um doente que em estado terminal está deprimido devido à sua circunstância; ou a de alguém que porque está totalmente imóvel não consegue fazer nada, não pode mover-me mais na vida, entra num estado de depressão e com base nisso pensa no suicídio e qualquer outra pessoa que no contexto da depressão, pensa no suicídio e que em vez de se atirar de um prédio vai a um médico e diz, eu quero suicidar-me, - é muito difícil fazer essa distinção.

E há outros riscos igualmente, que é o risco da pessoa a partir do momento em que sabe que se pode suicidar e que sabe ao mesmo tempo que é um peso para os seus familiares, ser de certa forma, haver um impulso em relação ao suicídio, porque na medida em que a sociedade normaliza essa circunstância, ao dizer esta circunstância da eutanásia é aceitável, a pessoa começa a auto-responsabilizar-se, por dizer, bem, eu poderia acabar com este sofrimento não só para mim, mas como para os outros que me são próximos e não estou a fazer. Há igualmente quem apresente problemas relativos à circunstância dos próprios médicos poderem incentivar as pessoas nesse sentido, induzir os pacientes nesse sentido.

E, portanto, para mim o problema fundamental é de ordem prática, mas atenção, isso não implica que eu exclua a possibilidade de se chegar a uma situação desse tipo e do Estado autorizar isso de forma regulada, porquê? Desde que me seja demonstrado e é isso que eu gostaria de estudar melhor, e só perante um estudo mais profundo, que realmente é possível nós garantirmos essas condições, uma decisão livre, racional, informada, mas mais, que os riscos inerentes a admitir isso são inferiores aos riscos que actualmente já temos. É que os riscos inerentes, por exemplo, à decisão dos médicos ou das famílias de não dar certo tipo de tratamentos ou de dar determinado tipo de tratamento paliativo da dor, que acaba por levar à morte e isso nós já temos hoje em dia, e nós já temos hoje em dia de forma não regulada, nós não sabemos verdadeiramente como é que isso é decidido. E mais, a pessoa tem uma participação muito menor no caso de um suicídio assistido que seja claramente regulado pelo Estado, ou seja, acabamos por delegar muitas vezes nos familiares e nos médicos, não sei até que ponto é que não seria melhor deixar essa decisão às pessoas. E, portanto, eu acho que nós temos de equilibrar estes dois riscos, mas como vos disse, para mim é uma questão é possível implementar ou não isto em termos práticos e de comparar esse tipo de riscos, não é uma questão de princípio, ao menos para mim.

 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo Verde, Rita Batista.
 
Rita Batista
- Bom dia. Perdoe-me mas o argumento facilitismo não me parece muito válido, acho que devemos confiar no valor dos profissionais, dos médicos, psicólogos e acreditar que as famílias querem o melhor para os seus. Prolongar a vida destes doentes independentemente do seu nível de consciência impedidos de uma vida e morte condigna não será uma forma futura infligida pelo Estado, como acontece no ordenamento jurídico português e o Estado não deveria ser responsabilizado por isso? Tenho dito.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Repita-me a última parte da pergunta, que eu estava a escrever a sua primeira.
 
Rita Batista
- Se não será uma espécie de tortura o Estado português não apoiar os seus doentes e deixar que eles tenham uma morte condigna?
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Começo pelo último ponto, no fundo isso reforça a posição de princípio que eu tomei, não é? Mas também devo dizer que há muitas pessoas que se opõem ao suicídio assistido dizendo que hoje em dia, com os meios médicos que existem, e com os mecanismos de controlo da dor que já estão disponíveis para os médicos, que essas circunstâncias são raríssimas, são muito raras. Por outro lado, há quem defenda que isso é assim para quem tem meios económicos, ou seja, que pode beneficiar de tratamentos médicos particularmente sofisticados. E que isso é mais um indício, mais uma razão para aceitar o suicídio assistido, que é para não discriminarmos, entre aqueles que estão sujeitos a uma dor, a uma morte lenta penosa; e outros, porque beneficiam de determinadas condições médicas particulares e determinada informação e de certa forma até de uma certa proximidade aos médicos, obtêm no fundo, um suicídio assistido ou uma morte não tão dolorosa. E daí que esse seja mais um argumento no sentido de que em termos de princípio o Estado deveria eventualmente... Atenção, porque é importante aqui: o Estado não mata neste caso, o Estado não pune, mas é quem ajuda alguém na sua decisão livre de suicidar-se. Mas essa é igualmente uma razão para responder ao seu primeiro problema, que é devemos confiar nos médicos, nos familiares? Eu apenas noto um paradoxo, se devemos confiar nos médicos, porque é que devemos confiar mais nos médicos e nos familiares para decidir a vida dessa pessoa do que na própria pessoa? Eu acho que a decisão relativamente à nossa vida, é uma das decisões fundamentais e portanto se nós entendermos que a dignidade humana inclui esse valor de autonomia individual, então é a nós que nos deve competir tomar essa decisão.
 
Dep.Carlos Coelho
- “Voto obrigatório”, a pergunta é do grupo verde, Sílvia Oliveira.
 
Sílvia Fernandes de Oliveira
- Muito bom dia a todos, bom dia Dr. Miguel Poiares Maduro. Queria colocar aqui uma reflexão e no fim chegar a uma pergunta. Há umas semanas atrás tive uma discussão, uma discussão que foi pacífica é claro, mas foi uma discussão que me fez olhar para o voto de um ponto de vista que eu não tinha visto assim com esta frontalidade. Ou seja, explicando-me melhor, o voto foi algo difícil de conseguir, foi algo que, o voto pelo como temos agora, é um direito jurídico, constitucionalmente consagrado na nossa Constituição, e que até há trinta anos atrás foi reprimido e não podia ter sido exercido como é efeito agora, houve uma grande luta, uma luta como nós sabemos com o 25 de Abril e que permitiu às pessoas poderem votar e escolher os seus representantes. E nessa discussão, foi uma discussão, que eu ainda não disse, mas com pessoas que viveram nessa época, pessoas que neste momento conseguem ver as diferenças de uma forma mais explícita do que nós, que não vivemos, pelo menos eu não vivi, e que me alertaram, alertar se calhar não é a palavra mais indicada, mas que me fizeram ter um ponto de vista um bocadinho diferente daquilo que eu tinha. Indo mais directamente ao assunto, fizeram-me ver que o voto, como todos nós sabemos, é uma forma de participação política, é uma forma convencional de participar e é uma forma que nós temos para eleger os nossos representantes. E então eu vi, quando essas pessoas me estavam a dizer “como forma de eleger os nossos representantes” que se nós não o fizermos, ou pelo menos se o fizermos em minoria, esses representantes (...)

 

(Um minuto inaudível)

 

(cont.) (...) estão, desculpem a redundância, mas a representarmo-nos não com tanta legitimidade, porque só uma fracção da população ou uma pequena parte está a elege-los.

Portanto, participar políticamente tem que ser uma participação de todos, para que os nossos políticos tenham uma maior legitimidade, sendo assim, eu concluo e conclui dessa conversa que eu tive, que o voto ou pelo menos quem não exercer está a atentar contra a própria democracia e por isso mesmo devem ser punidos, não concorda Dr. Miguel Poiares Maduro? Obrigada

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Sabem que o voto é um dos maiores mistérios da ciência política. Não o direito de voto mas o facto de as pessoas exercerem o seu direito de voto, porque a ciência política contemporânea assenta grande parte dela numa ideia de escolha e da acção racional. Ou seja, de que as pessoas agem sempre na prossecução do seu interesse egoístico e, portanto, só agem quando têm um determinado interesse. Ora, acontece que o nosso voto é uma decisão totalmente irracional, digo-vos já, do ponto de vista individual, por uma razão simples, o nosso voto individual nunca determina uma eleição. Está demonstrado na ciência política. Portanto, é uma acção sem qualquer consequência, tomado do ponto de vista individual. Portanto, do ponto de vista individual é uma decisão irracional, daí que seja um mistério para a ciência política, porque é que as pessoas votam? Porque é que agem irracionalmente indo votar? É racional do ponto de vista colectivo, e daí que seja um problema de acção colectiva, ou seja, do ponto de vista colectivo é importante que todos votem. Há muitas pessoas que defendem a obrigatoriedade do direito de voto precisamente nessa lógica, que é para impor essa forma de cooperação colectiva, é importante impor-se essa cooperação porque racionalmente em termos individuais não faz muito sentido votar. O que acontece é que as pessoas votam em termos individuais mesmo em sistemas que não têm sistema de voto, o princípio do voto obrigatório porque hoje em dia também cada vez mais e com frequência se fala daquilo que se chama a Embedded rationality. Ou seja, a racionalidade é também determinada por factores culturais e que portanto nos levam a atender interesses mais vastos, um dos quais é o nosso sentido de dever cívico, isto está crescentemente em voga, hoje em dia até na economia, aqui há pouco tempo estava a ler no New York Book Reviews que aparentemente esta corrente da escola chamada Behavioral Economics é uma das correntes que está a influenciar muito os programas de acção económica do Obama. Portanto a lógica de que nós não podemos deduzir que o sistema económico funciona de acordo com comportamentos racionais dos actores, mas sim com base, muitas vezes também, noutros factores. Portanto, a ideia de que se nós nos limitarmos a dizer isto nós não podemos organizar a sociedade, com base no pressuposto que as pessoas actuam racionalmente, bem, dito assim isto poderia ser, no fundo, digamos que a consequência que resultava daqui, então não vamos fazer nada, não é? Porque não há nada que nós possamos fazer, não podemos organizar, nós nunca podemos presumir como é que as pessoas vão reagir aos incentivos que nós vamos criar, portanto não vamos fazer nada. O que esta escola da Behavioral Economics por exemplo cria, ou a Embedded rationality, tudo isso, é procurar construir em termos objectivos que outros factores que não a racionalidade pura determinam o comportamento das pessoas e construir modelos para isso em termos económicos, mas em termos de acção política.

O que é que resulta disto em termos de sentido de voto. Acho que em certas sociedades, como forma de promoção inicial desse exercício de um dever cívico, e portanto como forma de assegurar essa processo de cooperação colectiva que é no fundo a democracia, a democracia é um processo de cooperação colectiva, porque a alternativa à democracia é a anarquia ao poder dos mais fortes, ou a ditadura, exactamente, que é o poder dos mais fortes, não é? E portanto, como forma de assegurar isso, pode ser necessário. Mas numa sociedade onde a cultura política já esteja suficientemente evoluída, eu não entendo que seja necessário impor isso. E acho que é importante salvaguardar essa liberdade das pessoas, de dizer por exemplo: para mim é indiferente participar no processo político. Enquanto isso não chegar a um nível que coloque em causa o próprio funcionamento do sistema democrático, eu acho que nós devemos respeitar essa situação.

 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo bege, Duarte Martins.
 
Duarte Martins
- Professor Miguel Maduro, a abstenção não será um dos maiores cancros da democracia representativa? Nós estamos a enveredar pelo facilitismo, nem sequer nos preocuparmos com simples actos de votar, não será necessário chegar a medidas extremas? Não sendo esta a ideal, não será esta um mal menor na defesa da democracia participativa? Obrigada.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Eu acho que a solução não é a obrigatoriedade do voto, sem dúvida que a abstenção é um problema grave, mas a solução não é obrigatoriedade do voto. Porque obrigar a votar pessoas que não querem participar no sistema política vai levar a decisões provavelmente ainda mais irracionais. O que eu acho que é muito mais importante e de novo há crescentemente estudos políticos nesse sentido, ainda há pouco tempo há um livro muito interessante de um colega meu de Yale, que acaba de sair, que se chama Deliberation Day, que é a necessidade de complementar esse tipo de democracia, ou melhor, de motivar a participação no processo democrático através da organização de fóruns deliberativos. Ou seja, o exemplo deles e fizeram-no, foi, organizar nesse caso um referendo local, mas era obrigatório para a organização do referendo local que todas as pessoas, que para que as pessoas pudessem votar no referendo, que participassem em Assembleias deliberativas. Em que todos os interesses podiam estar presentes, exprimir a sua posição e as pessoas que tinham de lá estar, era condição do exercício do voto no referendo, portanto, informarem-se e contrastarem a sua posição com os outros. E eu acho que nós temos de pensar mais em mecanismos desse tipo. Ou seja, para mim, mais importante que eu pôr o voto é desenvolver mecanismos e de certa forma até que promovam que as pessoas participem de uma forma deliberativa mais informada, mais intensa. No fundo é construir de novo uma respública, no sentido da ideia de que uma comunidade política se constrói debatendo as questões com os outros, e isso leva-nos a decidir de forma mais racional, de forma mais informada, mas igualmente a estar aberto a mudar as nossas posições. Porque, de novo, a ideia de autonomia individual que eu frisei tanto ao longo de várias questões, só é verdadeira quando é uma autonomia crítica reflexiva, ou seja, quando nós estamos dispostos a questionar as nossas posições iniciais sobre uma determinada questão, e e aí é fundamental o confronto com os outros.

O que eu acho é que é importante reforçar a qualidade do processo deliberativo na democracia, mais que impor necessariamente o voto.

 
Dep.Carlos Coelho
- Passamos para o tema 8, “Adopção por casais do mesmo sexo” e agora sim a Goretti.
 
Goreti Martins
- Bom dia a todos, hoje venho-vos contar uma história, mas ao contrário das histórias infantis aqui não vai haver nenhuma princesa, aqui vai haver uma bruxa má, uma lei má, o meu nome é Andreia, tenho 32 anos, tenho uma relação com a Ana de 27 anos, que está aqui ao meu lado. Dizem de nós que somos um casal perfeito, que temos tudo para ser felizes, mas nós sentimo-nos incompletas, um dia, conhecemos aqui o Miguel, um menino de apenas três aninhos, amamos o nosso Miguel como fruto do nosso amor, do amor que nos une. O Miguel só tem três anos, mas é com esses mesmo três anos que vive numa instituição, é com esses mesmos três anos que passa os dias a chorar, é com esses mesmos três anos que é infeliz, quem concebeu o nosso pequeno Miguel não tem condições, não tem interesse, nem quer fazer dele uma criança feliz, a sua mãe biológica, prostitui-se, o seu pai está preso. O Miguel, e recordo a todos que o Miguel tem apenas três anos, o Miguel sofreu abuso por parte daquele que dizem ser seu pai, três anos, apenas três anos tem o nosso Miguel. O sonho do Miguel é ter-nos a nós as duas como seus pais, para que o sonho do Miguel se realize só é necessária uma pequena mudança, uma pequena mudança, só é necessário que nos seja permitido adoptar o Miguel. Nós somos um casal do mesmo sexo, sem dúvida, somos um casal que se ama também, um casal que pode, um casal que deseja, um casal que tem condições, este é o grande sonho do Miguel.

Prof. Miguel Maduro, o Sr. concorda que é possível realizar o sonho deste menino e apagar a bruxa má desta história?

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- É importante esclarecer, eu não sou esse Miguel, mas podia estar aberto à questão… (Risos) De novo, a minha posição relativamente a essa matéria, e acho que é aquilo que deve ser a nossa posição, não decorre da minha posição moral relativamente à homossexualidade, nem ao que eu entendo, poderia entender moralmente sobre a adopção de crianças por homossexuais. Porque eu acho que nós temos de distinguir claramente entre aquilo que é a nossa posição moral individual, e aquilo que nós entendemos deveria ser a posição que o Estado deve ter relativamente à pluralidade de concepções morais existentes numa sociedade.

Uma política do Estado, do meu ponto de vista, numa sociedade liberal democrática, nunca deve depender da posição moral de quem o lidera; mas deve sim pelo contrário, ser tolerante relativamente a uma pluralidade de concepções morais sobre a vida nessa sociedade. Disto isto, para mim, ou precisamente por causa disto, para mim, a resposta a essa pergunta é muito simples, depende do melhor interesse para a criança, tão só.

O que é que isso significa? Significa que em si mesma, do meu ponto de visto, a homossexualidade não constitui um factor impeditivo da adopção, mas por outro lado a adopção também não deve ser concebida como um instrumento de engenharia social para utilizar, no fundo, a adopção e a criança, de forma a mudar a moral social vigente na sociedade. Ou seja, o Estado deve ter aí uma função mais agnóstica possível, não deve nem promover uma determinada moral social, nem ser factor de engenharia de uma outra, e mudar essa moral social vigente. E a partir desse ponto de vista é fácil deduzir. Se se demonstrar que em termos médicos, científicos, que tem mais interesse para essa criança eventualmente e há estudos científicos, mas aparentemente algo contraditórios ainda nessa matéria, - mas isso foi um tema, esta é uma pergunta que nem sequer tive oportunidade de estudar -, mas se se demonstrar que, por exemplo, é mais vantajoso para uma criança ser adoptada por um casal homossexual do que viver num lar, eu não vejo porque é que o Estado se há-de opor a isso.

Mais, de facto isso já acontece hoje em dia, porque o que acontece é que as adopções têm lugar a título de pessoas solteiras. E, portanto, de novo é melhor tornar essa questão transparente e regulá-la para decidirmos de que de forma informada, e com os conhecimentos científicos e com os estudos existentes nos permitirem a essa respeito, mas o critério fundamental deve ser o interesse da criança e tão só esse.

 
Dep.Carlos Coelho
- André Matias, grupo azul.
 
André Matias
- Muito obrigado caríssimo reitor, antes de mais felicitar a brilhante personalidade do Dr. Miguel Poiares Maduro, por ser mais uma a que a nossa Universidade já nos habituou, para o Dr. ter uma pequena noção nós até já tivemos aqui oradores que conseguem o notável feito de ouvir declarações do Ministro do Ambiente. Mas ao fim de muita problemática, eu penso que numa coisa estamos em sintonia: é que não existe nada mais difícil do que alterar mentalidades, valores, crenças, princípios. E, portanto, perante a dúvida que tenho relativamente à resposta do Miguel, de quem é o meu pai, eu gostaria de saber quais são os pontos abordados por uma proposta de lei, tendo em conta todas as questões ideológicas e sociais pela sociedade de hoje? Muito Obrigado.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Atendendo à resposta anterior que eu dei, ou seja, que o interesse fundamental deve ser o da criança, o que nós devemos ver é o seguinte, em primeiro lugar, em termos de estudos médicos existentes, estudos científicos que existem e têm sido feitos parece que é vantajoso para as crianças, parece, em termos de conhecimento científico dominante, ter um pai e uma mãe, portanto, um casal, ser adoptado por um casal heterossexual, na maior parte dos casos do que por casais homossexuais. Mas também há muitos estudos que dizem que, por outro lado, é claramente mais vantajoso para a criança ser adoptada por um casal homossexual do que viver numa instituição, por exemplo, em termos de consequências futuras, de qualidade da vida da criança. E portanto o que nós temos de ver é fazer esse estudo, em termos desse estudo determinar critérios que depois, juízes em conjunto com comissões científicas, avaliem esses casais, as propostas desses casais à luz desses critérios gerais e determinem se sim ou não essa adopção deve ter lugar, para mim a questão é muito simples nesse sentido.
 
Dep.Carlos Coelho
- Muito bem, passamos para o penúltimo tema, “liberalização das drogas”, tem a palavra pelo grupo azul, a Maria Pires.
 
Maria Pires
- Muito bom dia, eu tenho 18 anos, aliás já fiz 18 anos o ano passado, sou adulta, sou maior de idade, sou responsável, eu decidi que quero tomar drogas, mas o Estado não me permite, proíbe-me de comprar, proíbe-me de andar com elas. Ontem, junto com uns amigos estivemos a discutir esta questão e chegámos à conclusão de que um toxicodependente é um deficiente por opção, e escolha ou opção é aqui a palavra-chave, não terei eu o direito de decidir o que quero fazer à minha saúde? Ora se nem a minha mãe tem o direito, agora, de decidir o que eu faço com o meu corpo porque teria o Estado a ver com isso? O Estado não tem o direito de não deixar escolher, se é meu, é a minha escolha. Qual é a sua consideração acerca disto, Professor? Obrigada.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- O primeiro problema com o que diz é que, uma das questões fundamentais com as drogas é que elas eliminam a escolha, ou seja, quem é viciado numa droga não tem escolha. E, portanto, desde logo desse ponto de vista isso diminui a força desse argumento, ou seja, de que a droga é um exercício de autonomia individual, não é um exercício de autonomia individual. Mas, paradoxalmente, também diminui o argumento favorável à criminalização das drogas, porquê? Porque o argumento fundamental relativamente à criminalização das drogas é a prevenção. Ora a criminalização das drogas não previne, não consegue dissuadir o consumo das drogas, precisamente porque os viciados estão viciados e curiosamente, paradoxalmente também quanto mais dura é a droga, quanto mais grave é a droga, menos é o efeito dissuasor que tem a criminalização do consumo de drogas. É um dos paradoxos que nós temos.

Mas queria dizer alguma coisa, não? Diga.

 
Maria Pires
- Mas a questão é, é da opção individual se deve experimentar tendo em conta todas as repercussões, ou não deve experimentar, aí é que está a escolha.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Sim. Mas o problema para mim nesse sentido é que há dois tipos de externalidades nessas circunstâncias que justificam que o Estado possa intervir aí e limitar esse direito de escolha. O primeiro é uma ideia de que vai, ao tomar essa decisão automaticamente estará a limitar a sua vontade livre futura, portanto, há aqui em termos de vista filosóficos há uma tensão no exercício da autonomia individual. Mas o segundo, que é a principal no fundo justificação para a criminalização das drogas, precisamente porque o efeito da prevenção não funciona em termos de drogas, em termos criminalização das drogas, é em termos de externalidades, ou seja, dos custos sociais que isso comporta, porquê? Para os familiares, em termos de baixa produtividade no emprego, em termos de custos no sistema de saúde. Eu não estou a dizer que eu sou necessariamente contrário a uma descriminalização das drogas, aliás, ela já acontece hoje em dia com certo tipo de drogas e mesmo em relação ao tráfico, a uma regulamentação de tráfico. O que eu estou a dizer é que do meu ponto de vista não é nem uma questão de autonomia individual, neste caso, nem uma questão de efeito de prevenção de prevenir o consumo de drogas, ou de dissuasão de eficácia do sistema penal, não funciona dessas bases. É uma questão de comparação entre externalidades sociais, que provoca o consumo das drogas, por um lado, e que provoca, por outro lado, a criminalização desse consumo, porquê? Porque a criminalização aumenta o custo das drogas e portanto tem uma correlação com o aumento da criminalidade. E de novo é uma matéria que eu acho que nós temos de estudar, mas essa deve ser a base da decisão, vamos comparar esses dois tipos de externalidades que o consumo de drogas provoca por um lado, e portanto a sua liberalização e o eventual aumento vai provocar, esses custos sociais em termos de produtividade, trabalho, custos até morais para as famílias, custos em termos familiares, custos para o nosso sistema de saúde, vamos comparar isso com os custos que a actual criminalização também comporta em termos do impacto, por exemplo, em termos de aumento de criminalidade, em termos de problemas até de saúde, porque a droga consumida na clandestinidade provoca problemas de saúde importantes - e são esses dois tipos de externalidades que nós temos que comparar.
 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo laranja, Alberto Simão.
 
Alberto Simão
- Bom dia, Dr. Miguel Poiares Maduro, como a Maria disse, ela escolheu e não sei se é a título pessoal ou se é uma personagem encarnada, escolheu o consumo de drogas como opção e não é só ela, hoje em dia no mundo, 200 milhões de pessoas escolheram consumir drogas consideradas ilícitas neste país. Mas 200 milhões de pessoas são 5% da população mundial. Os fundos associados à droga são de 13 mil milhões no sector de produção, 94 mil milhões no sector intermediário e 322 mil milhões no sector retalhista, isto corresponde a 0,9% do PIB mundial.

Representando o grupo laranja, eu gostaria de saber e partindo do exemplo da Holanda, porque um estudo recente do relatório anual sobre a evolução do fenómeno da droga na União Europeia e do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, a Holanda é dos países que tem um consumo de droga mais baixo. Ou seja, se ao criarmos aquela célebre questão do “fruto proibido é o mais apetecido”, se liberalizando a droga, o consumo não iria cair? E em que cenário seria realista os tais fundos 0,9% do PIB, usados a favor da sociedade e não a favor dos traficantes e dos contrabandistas?

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Eu estou aberto a essa situação por aquilo que acabei de dizer. Mas seria um bocadinho prudente, de novo, porque eu também já vi estudos que são muito mais cautelosos relativamente à situação na Holanda do que isso, que dizem na realidade a liberalização dessa droga provoca outro tipo de consumos e provoca outro tipo de criminalidade, e provoca outro tipo de problemas sociais, não é? Por exemplo, porque provoca mais facilmente a transferência de uma para outra, embora isso é contestado, porque há quem diga que o consumo de drogas leves não se traduz no consumo das drogas duras e o contrário. Mas por isso mesmo eu que há pouco acentuava que eu acho que a distinção entre drogas leves e drogas duras não é tão importante como isso, e a regularmos, e a decidirmos regular provavelmente devíamos pensar em ambos os casos, não é? Eu acho que no fundo o que leva as pessoas a fazer a distinção é ainda apreciar o problema de um ponto de vista moral, mais grave o consumo de um e de outro, e não de um ponto de vista do seu impacto social, quando eu acho que deve ser este segundo aspecto que deve determinar a política pública na matéria. Mas de novo é uma questão que acho que nós podemos estudar e com base nisso decidir, não numa lógica pura de somos favoráveis a drogas, ou não somos favoráveis a drogas, mas sim, que impacto na sociedade, que custos para a sociedade é que comporta uma situação e que pode comportar a outra, não é?
 
Dep.Carlos Coelho
- Muito bem. Vamos então para o último tema, “proibição de tortura”, grupo laranja, Angel Gutierrez.
 
Angel Gutiérrez
- Bom dia, eu considero inadmissível que capturem um terrorista em flagrante, que tenham sido encontrados planos de ataques futuros e agora não o consigam fazer falar. Digam-me, como será quando as outras bombas explodirem? Digam-me, como é que eu posso deixar sair os meus filhos de casa? Digam-me, como é que eu posso viver sem medo? Não podem haver limites, repito, não podem haver limites no interrogatório para a alcançarmos a verdade. É a segurança de todos que está em jogo. Não acha o mesmo, Sr. Professor?
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Esta é uma questão que é fácil responder do ponto de vista do direito vigente. No Direito Internacional há inúmeros tratados que proíbem de forma absoluta a tortura e do Direito Constitucional da maior parte das democracias actuais proíbem também a tortura. Mas há, é verdade que há, hoje em dia, uma discussão cada vez mais crescente sobre o chamado, o cenário da ticking bomb. O que é que acontece realmente se houver alguém..., e o exemplo que é dado é: nós sabemos que há uma pessoa que detém informação sobre uma bomba, que está prestes a explodir na nossa cidade e que pode matar milhares de civis. Não devemos poder utilizar a tortura nesse circunstância? Este exemplo envolve no fundo uma falácia, qual é a falácia? É que para nós autorizarmos o uso da tortura nessa circunstância, nós nunca sabemos ex-ante se aquela pessoa realmente detém essa informação ou não, e portanto nós o que estamos a autorizar é o uso da tortura sempre que a polícia ou as autoridades entendam que pode haver informação relevante para prevenir uma tragédia civil. E onde é que nós estabelecemos o limita aí? Onde é que se estabelece a fronteira? Vamos imaginar que nós suspeitamos que não é aquela pessoa, mas que é uma entre 50 pessoas que habitam numa determinada residência que terá informação que permitirá evitar esse cenário, essa bomba, vamos torturar as 50? Já achamos isso aceitável? Este é o problema deste cenário. É que imediatamente nos leva numa lógica utilitarista, consequentalista, de que algumas vidas e neste caso, algumas vidas inocentes podem ser de alguma forma trocadas por outras. Havia um escritor britânico, há muitos anos que disse: o problema com os utilitaristas e os consequentalistas é que, para eles há uma discussão que vale a pena entre a morte de um milhão de pessoas e um milhão e uma pessoas. E é o problema que nos leva este tipo de raciocínio. Isto não significa que as sociedades não sejam realmente confrontadas, e que qualquer um de nós não fique, não tenha um problema com a questão deste cenário da ticking bomb, o que fazer nessa circunstância.

Mas no fundo há duas abordagens possíveis, uma, que tem vindo a ser defendida e, por exemplo, foi defendida recentemente por um grande constitucionalista e penalista americano Alan Dershowitz, não sei se lembram de um filme de um barão acusado de matar a mulher, o papel era feito pelo Jeremy Irons, não sei se lembram disso, em que havia um professor de Harvard depois com a sua equipa o conseguia absolver, esse professor de Harvard é este, e alguém que é considerado nos Estados Unidos da América um liberal, o que nos Estados Unidos da América é alguém bastante de esquerda, bastante progressista e ele defendeu um livro, chamado de ”Ticking bomb scenery”, em que ele diz que é melhor regular este tipo de circunstâncias, tornar transparente, porque se a polícia ficar confrontada, realmente isso vai ocorrer e, portanto, o melhor que nós temos a fazer é realmente regular esse cenário. Impor por exemplo a exigência de um mandato judicial que permita a tortura nessa circunstâncias e as condições em que esse mandato judicial podem ser dado.

Mas há outra solução, que eu prefiro, porque o meu problema com esta solução é precisamente esse novo, o deduzir de uma circunstância excepcional, uma prática futura. Ou seja, um impacto no sistema, porque nós vamos estar a autorizar a polícia, vamos estar a dizer, estamos a legitimar todas as circunstâncias em que houver suspeitas nesse sentido. Qual é a alternativa? A alternativa é uma alternativa que encontramos por exemplo em decisões do Supremo Tribunal Israelita e numa circunstância paralela numa decisão do Tribunal Constitucional Alemão, que é a chamada invocação de “estado de necessidade”. Ou seja, a tortura é proibida em todas as circunstâncias, quem a faz comete sempre um crime, mas eventualmente se se vier a demonstrar que aquele acto salvou a vida de milhares de pessoas podem invocar o estado de necessidade como circunstância atenuante ou desculpante daquela acção. Um exemplo, o Supremo Tribunal Israelita decidiu dessa forma, proibindo a tortura em todas as circunstâncias, mas sujeito a essa possibilidade; e o Tribunal Alemão decidiu num caso que não é de tortura, da ticking bomb scenery, mas que é um caso semelhante, que foi uma legislação relativa à possibilidade do Estado disparar sobre um avião com civis que se dirigia eventualmente, tomado por terroristas, que se dirigiria contra alvos civis, com ainda mais civis, e eles disseram que isso não era legítimo, mas que eventualmente as autoridades que decidissem em última instância esse disparo poderiam sempre invocar o estado da necessidade. Para mim, essa é a melhor solução porque ela coloca um ónus particular naqueles que decidirem utilizar a tortura. E portanto, coloca uma imposição, uma prudência de uma cautela excepcional e mantém em termos sociais a integridade da proibição da tortura e portanto, a ideia de que o Estado não pode desumanizar os outros - essa é a nossa diferente com os terroristas. É que o que leva a acção terrorista é precisamente a desumanização dos outros, a ideia de que há certas vidas que têm menos valores em certos circunstâncias do que outras, para prosseguir certos objectivos políticos. E portanto nós não podemos proceder a essa desumanização, sob a pena de cair no mesmo tipo de comportamento com os terroristas. Os terroristas combatem o direito, nós combatemos o terrorismo através do Direito e através do respeito dos direitos fundamentais.

Há outra questão importante, é que a tortura em geral é tremendamente ineficaz, eu lembro-me de conversar com Barak que deixou de ser há dois anos Presidente do Supremo Tribunal Israelita, que é alguém conheço, e que me contava a seguinte história, que quando era o Presidente do Supremo Tribunal, foi juiz relator nesse processo e que portanto decidiu a proibição do uso da tortura, que na altura foi muito criticado, mas que dois anos depois, o chefe dos Serviços Secretos e dos Serviços de Informação Israelita lhe disse que lhe queria agradecer por essa decisão, porquê? Porque ele disse, é que isso obrigou-nos a desenvolver meios de investigação que na realidade se demonstraram ser muito mais eficazes. Porque sob tortura as pessoas confessam tudo, incluindo aquilo que não sabem, com o objectivo único de deixar estar sujeitos àqueles actos. E isso leva muitas vezes as autoridades criminais em investirem nesse meio que leva a informação falsa, quando poderiam investir em meios de pesquisa e de investigação que na verdade se traduzem em informação muito mais fiável. Mesmo do ponto de vista da eficácia, a tortura é contrária aos interesses da investigação criminal.

 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo amarelo, Filipa Bandeira.
 
Filipa Bandeira
- Obrigada, em relação a este caso de grave terrorismo, em primeiro lugar, penso que é importante respondermos se estamos perante uma verdadeira situação de tortura, a mim parece-me que não. Não podemos considerar tortura a imposição de um sofrimento que é consequência da imposição de uma sanção legítima, esta intimidação feita ao terrorista serve aliás como as reacções criminais para reforçar a vigência de um ordenamento jurídico que se espera respeitado. Além do mais, reconhecendo que este castigo possa implicar uma restrição de um direito fundamental do sujeito em causa, penso que devemos, aliás, como decorre de uma obrigação que nos é constitucionalmente imposta, dar prevalência ao abrigo do princípio da concordância prática à segurança das pessoas. Obrigado.
 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- Há um vício lógico, desculpe que lhe diga, no seu raciocínio inicial, que é que como uma sanção é legítima, logo não pode ser considerada como tortura. É que isso poderia levar-nos a legitimar todas as formas de tortura, partiria do princípio que a partir do momento em que nós legalizávamos um determinado meio de exercício da força, ou seja, que como um determinado exercício da força está previsto na lei ele é legitimo, logo não pode ser tortura, não é? O conceito de tortura é externo e é o que determina o que o Direito deve aceitar, ou não aceitar, se é legítimo ou não um determinado sistema jurídico aceitar aquela forma de imposição da força.

Eu acho que nós temos de ser particularmente cuidadosos nessa matéria. Por exemplo, há uma outra decisão num tribunal alemão que considerou que a própria ameaça de tortura entrava no campo da aplicação da tortura. Eu acho que esse já é um caso mais de fronteira, embora pense que sim, penso que provavelmente sim, porque em termos psicológicos isso é uma forma, provavelmente terrível para a pessoa, não sei, imaginem vocês estarem numa situação em que vocês estão numa dependência total física da outra pessoa, estão maniatados, presos, não se podem mover e há alguém que aparece com os cabos eléctricos, a dizer, nós vamos… e realmente nunca a chega a colocar esses cabos eléctricos, mas ameaça isso, eu acho que isso é uma situação de tortura, por exemplo, é uma tortura psicológica, mas tem um efeito semelhante. A tortura muitas vezes do ponto de vista psicológico pode ser mais dura, é a mesma coisa, a privação do sono é considerada uma forma de tortura, pode ser mais forte muitas vezes do que a própria tortura física. Depende porque razão e para que motivo é que vocês de privaram do sono, não é.

 
Dep.Carlos Coelho
- Se o Prof. Poiares Maduro me permitir mais uma dica, nós tivemos ontem um debate aqui sobre Obama contra McCain, em que o General Garcia Leandro recordou o momento que para mim foi o momento mais simpático da vida parlamente do Senador John McCain. Convém recordar que a os Estados Unidos da América como a maior parte dos países desenvolvidos do Mundo estão vinculados a convenções internacionais que proíbem claramente a tortura e os tratamentos desumanos e degradantes. Portanto o direito internacional proíbe esses comportamentos que são contra o património civilizacional dos valores que abraçamos, e as nações livremente associaram-se a essas convenções. Ninguém obrigou Portugal a assinar, Portugal quis assinar, ninguém obrigou os Estados Unidos a assinar, os Estados Unidos quiseram assinar. E portanto devem aplicar as convenções internacionais a que se vincularam voluntariamente. O que é que acontece?

Acontece que na prática estava a haver tortura nos Estudos Unidos, como hoje é público e notório. Então há um congressista que apresenta uma proposta de lei, uma iniciativa legislativa no Congresso americano, que diz só isto: é proibida qualquer forma de tortura. A proposta aplicava-se aos militares e foi feita no sistema jurídico americano que é muito diferente do nosso, como uma emenda ao orçamento militar. E o Presidente Bush, fez uma coisa muito notável, disse ao Congresso: que se os senhores aprovarem essa Emenda eu veto o orçamento, e não há dinheiro para a tropa. Foi a ameaça pública do Presidente Bush. E o Senador John McCain, como o General Garcia Leandro vos contou, levantou-se no Senado e disse aos representantes do Governo: os senhores falam daquilo que não sabem, eu falo do que sei porque fui torturado no Vietname e sei muito bem que quando um homem é torturado, raramente diz a verdade, quase sempre diz aquilo que pensa que o torturador quer ouvir para acabar com o sofrimento.

Eu em Washington, nas conversas que tive a propósito da investigação da CIA, tive com um grande responsável da CIA que foi o responsável do contra-terrorismo, um homem duro, um falcão, não é uma pomba, Vicent Canistra, o homem que organizou os “contra” na Nicarágua, um homem que matou e mandou matar, que me dizia com muita piada: Sr. Presidente, respeito muito a sua posição ética relativamente à tortura, mas a minha posição não é a mesma, o Sr. não concorda com a tortura, dizia ele para mim, por uma questão de direitos humanos, respeito a sua posição. Eu não concordo com a tortura porque ela é ineficaz. E depois contou-me o caso de três grandes investigações desenvolvidas pela CIA, depois do 11 de Setembro, onde gastaram centenas de agentes e milhões de dólares e meses de trabalho, a perseguir três pistas que conseguiram graças a tortura que eram completamente falsas que, eles inventaram para acabarem com o sofrimento. Sr. Prof. Miguel Maduro.

 
Prof. Dr.Miguel Poiares Maduro
- É claro que durante esse período e com esses recursos provavelmente podiam ter prevenido outro tipo de acções.
 
Dep.Carlos Coelho
- Sr. Prof. Miguel Maduro muito obrigado por ter vindo até nós e por ter respondido a estas questões.

 

(APLAUSOS)

 

 

 

 
10.00 - Avaliação da UNIV 2008
12.00 Sessão de Encerramento da UNIV