ACTAS  
 
9/2/2008
Jantar-Conferência com Drª Leonor Beleza
 
Dep.Carlos Coelho
- Sra. Dra. Leonor Beleza, caras amigas e caros amigos, na avaliação das duas últimas Universidades de Verão, os participantes das edições de 2006 e 2007 deixaram-nos entre outras, a sugestão de que pudesse haver durante a Universidade, alguns momentos (ainda que curtos), que fossem apontamentos culturais. Ficámos na dúvida na edição desta Universidade, se devíamos convidar alguém de fora ou se devíamos fazê-lo com a prata da casa. Achámos que com a qualidade dos participantes na edição de 2008, seria mal interpretado que fossemos buscar alguém de fora. E, assim, cada um dos cinco jantares-conferência desta Universidade de Verão, vão abrir com dois momentos culturais protagonizados por dois grupos diferentes. Cada grupo tem o desafio de escolher um poema e de partilhar esse poema com os colegas e com os convidados da Universidade de Verão. O grupo cinzento vai declamar um poema de Ricardo Reis chamado “Para Ser Grande, Sê Inteiro” e dedica este poema à Universidade de 2008, pois acham que transmite o que cada um está aqui a fazer. Quem vai declamar é a Vânia Caldeira. A seguir, o grupo azul através da Helena Antunes vai declamar uma poesia de Sophia de Mello Breyner chamada “Pátria” porque acharam importante um poema que fala da Pátria e da vida. São estes dois poemas com que vamos abrir o primeiro jantar-conferência da Universidade de Verão 2008.
 
Vânia Caldeira

"Para ser grande, sê inteiro: nada

Teu exagera ou exclui.

Sê todo em cada coisa. Põe quanto és

No mínimo que fazes.

Assim em cada lago a lua toda

Brilha, porque alta vive".

 
Helena Antunes

“Por um país de pedra e vento duro

Por um país de luz perfeita e clara

Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência

Que a miséria longamente desenhou

Rente aos ossos com toda a exactidão

Dum longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento

E pela limpidez de tão amadas

Palavras sempre ditas com paixão

Pela cor e pelo peso das palavras

Pelo concreto silêncio limpo das palavras

Donde se erguem as coisas nomeadas

Pela nudez das palavras deslumbradas”

— Pedra rio vento casa

Pranto dia canto alento

Espaço raiz e água

Ó minha pátria e meu centro

Eu minha vida daria

E vivo neste tormento

 
Paulo Pinheiro
Que enorme honra e que enorme privilégio que recebemos nesta Universidade de Verão e que também temos esse privilégio de fazer neste jantar o brinde a uma figura tão importante no Partido Social Democrata, por todo o seu percurso político, toda a sua capacidade que demonstrou quando esteve à frente da causa pública e que demonstrou assim, que neste Partido existe verdadeiramente e de forma irrefutável, mulheres com enorme qualidade para estar à frente do nosso País. À Dra. Leonor Beleza, a saudamos.
 
Dep.Carlos Coelho
- Sr. Secretário-Geral Adjunto do PSD, Sr. Dr. Duarte Marques, Sr. Dr. Rodrigo Moita de Deus, senhores conselheiros, senhores avaliadores, minhas senhoras e meus senhores. Faço minhas as palavras do Paulo. A Dra. Leonor Beleza é uma das mulheres mais ilustres da família Social Democrata. É uma grande senhora que provou a sua qualidade nas funções que exerceu. Hoje é Conselheira de Estado, é uma honra ter entre nós uma Conselheira de Estado, por designação de Sua Excelência o Presidente da República,é Presidente da Fundação Champalimaud e aí está a fazer um trabalho notável, criando um centro de investigação fabuloso, atraindo para o nosso País, dos melhores especialistas em todo o mundo e criando uma rede de conhecimento que torna a colocar, nesta área do saber, o nosso País, na primeira divisão. Só por isso já merecia o nosso reconhecimento e o nosso respeito. A Dra. Leonor Beleza foi também Presidente do Instituto Francisco Sá Carneiro e aí deu particular atenção à formação. Vocês não o podiam saber, mas algumas das soluções que nós fomos buscar para desenhar esta Universidade de Verão foram inspiradas numa iniciativa de formação original para elites que a Dra. Leonor Beleza organizou no Instituto Sá Carneiro quando foi Presidente. Um curso de formação para Deputados, para dirigentes nacionais e distritais do PSD que durante 60 horas ocorreu na Ordem dos Economistas em Lisboa por iniciativa dela e do Instituto Sá Carneiro. A Dra. Leonor Beleza foi Secretária de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, da Segurança Social, foi Ministra da Saúde, como todos sabem, e no Partido desempenhou muitas funções, Presidente do Conselho de Jurisdição, Presidente da Mesa de Congresso, Vice- Presidente da Comissão Política Nacional e poderia ter desempenhado muito mais, se não tivesse interrompido a sua carreira política para se dedicar às causas que hoje abraçou. Já sei que a Net está carregada de ex-alunos da Universidade de Verão. Ainda não tive ocasião de dizer isso à Dra. Leonor Beleza, mas aproveito a circunstância para lhe dizer. Nós estamos a fazer o broadcasting deste debate na Net. Não é em sinal aberto para podermos estar a falar à vontade, em família, mas os antigos participantes das Universidades de Verão 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007, têm acesso a um link e a um código que lhes permite estar a seguir este debate e já sei que estão muitos desse lado do ecrã e saúdo a vossa presença à distância neste debate com a Dra. Leonor Beleza. Mas dizia eu que a Dra. Leonor Beleza foi muito no Partido, podia ter sido mais, e estou certo que ao longo deste jantar lhe vamos fazer muitas perguntas sobre todas estas áreas em que ela desempenhou funções Já que tenho privilégio o de fazer a primeira pergunta, vou-lhe fazer talvez a pergunta mais inconveniente. Já sei que ela, depois, me vai repreender. Por isso, não lhe vou fazer nenhuma pergunta sobre a Fundação Champalimaud, não lhe vou fazer nenhuma pergunta sobre a investigação científica, não lhe vou fazer nenhuma pergunta sobre saúde, não lhe vou fazer nenhuma pergunta sobre a Segurança Social, não lhe vou fazer nenhuma pergunta sobre as causas sociais. Vou mesmo fazer-lhe uma pergunta sobre o nosso Partido. E a pergunta é muito simples. Os dez grupos nesta Universidade de Verão estão a trabalhar num estudo que o Sr. Presidente da República encomendou à Universidade Católica Portuguesa sobre a separação ou o divórcio, como lhe quiserem, entre os jovens e a política. Mas em bom rigor não são só os jovens que têm este problema. A maior parte dos portugueses está afastado da política. Está afastado da participação cívica. E a pergunta que lhe faço, Dra. Leonor Beleza, é esta: como é que acha que os Partidos deviam interpretar, hoje, o seu papel na sociedade portuguesa? O que é que um Partido moderno deve fazer para ultrapassar este espaço de divórcio entre a maior parte dos cidadãos e a causa pública? O que é que nós, que somos quadros políticos empenhados, devemos fazer? Como é que podemos marcar a diferença para chegarmos mais próximos dos nossos concidadãos? Minhas senhoras e meus senhores, para responder à minha pergunta e às vossas questões, a Dra. Leonor Beleza.

(APLAUSOS)

 
Dra.Leonor Beleza
- Meu caro amigo, Eurodeputado, companheiro Carlos Coelho, companheiros e companheiras e amigos, eu não sou capaz sequer de tentar responder a algumas coisas que foram ditas sobre mim nem vou tentar. A única coisa que sou capaz de vos dizer é que sempre que oiço coisas assim, ditas por companheiros do Partido, há uma coisa cá dentro muito funda que mexe. Eu hoje sou uma militante partidária de Base, um pouco mais afastada das coisas da política do que durante muitos anos da minha vida, mas eu continuo a ser a laranjinha de sempre e continuo a prestar muita atenção, e a sofrer muito e às vezes a ficar muito contente, depende das circunstâncias. Há sempre qualquer coisa de muito importante para mim que é, os meus companheiros de Partido de quem eu gosto tanto, dizerem certas coisas a meu respeito. Pronto, isso cala cá muito fundo, eu não sei explicar muito bem. Acho que terei feito algumas coisas certas e outras muito menos certas. A verdade é que passei muitos anos, de facto, exclusivamente em funções políticas, fiz muita coisa no interior do Partido e sempre que essas coisas vêm ao de cima, hoje que a minha vida corre um pouco por outras águas, as coisas tocam-me muito. Às vezes as pessoas perguntam-me, tem saudades? Não tem saudades? Gostava de ainda lá estar? Eu não sei bem responder. Há uma parte de saudade que a gente sempre tem de muitas das coisas por onde andou e das coisas que fez, e muitas causas de que a gente pode, aliás, falar sobre coisas que deviam ser feitas doutra maneira e que a gente tende a pensar, se fosse eu que estivesse lá, era assim ou era assado, sobretudo nos sítios que a gente conhece melhor. Mas eu tenho, de facto, um privilégio imenso de estar neste momento a fazer aquilo que faço e a última coisa que me poderia passar pela cabeça era não estar profundamente grata por me ter sido concedido esse privilégio. Eu vivo muito feliz a fazer aquilo que faço. Felizmente, há várias coisas na vida que a gente pode gostar de fazer, não é necessariamente só uma. Gostei muito de fazer muitas coisas enquanto estive mais activamente na política, gosto muitíssimo daquilo que faço e, portanto, não tenho nenhuma razão para não dizer que não estou feliz e contente com o que faço e, certamente, terei ocasião de explicar porque é que o digo.

Eu queria dizer-vos também outra coisa, eu não me lembrava nem nunca tinha percebido lá essa história da influência que possa um curso, que é verdade, quando fui Presidente do Instituto Sá Carneiro organizámos um curso para jovens políticos do Partido sobre vários aspectos importantes: política internacional, política europeia, economia, política política, media, essas coisas todas. E foi uma das coisas que me deu um enorme prazer organizar. Nunca me tinha passado pela cabeça, a ligação entre as duas coisas e agradeço muito isto que é, certamente, um exagero. Porque isto é uma criação do Carlos Coelho, o que se passa aqui. E é uma coisa que só ele, desculpem lá os outros todos, mas eu acho que só ele é que conseguia fazer isto. Eu acho um milagre tal, a Universidade de Verão, a forma como as coisas são organizadas, a maneira como as pessoas são escolhidas, a exigência que é posta nos dias em que aqui estão, no trabalho que é dedicadamente feito por todos, eu não sei se mais alguém, além do Carlos Coelho, era capaz de pôr isto em pé e de montar isto e, portanto, sinto uma enorme admiração por ele, como ele sabe há muito tempo, não é só por causa disto. Quando ele saiu do Grupo Parlamentar do PSD na Assembleia, eu achei que o Grupo Parlamentar caía, depois lá nos fomos mais ou menos aguentando. Agora, acho que é o Grupo Parlamentar do PSD do Parlamento Europeu que cairá se ele um dia também sair de lá. Porque tudo o que a gente sabe de lá, todas as informações, todos os montes de coisas que eu recebo permanentemente e que, se calhar, muitos de nós recebemos e que nós sabemos que se passam, é o Carlos Coelho que faz com que a gente saiba para além de muitas coisas importantes que ele tem feito em nome de nós todos no Parlamento Europeu.

Posto isto, e ele fez-me uma pergunta que eu seria um génio se fosse capaz de responder cabalmente. Mas é um assunto evidentemente sobre o qual todos reflectimos. O Sr. Presidente da República achou e muito bem que a questão devia ser colocada de uma maneira politicamente ao mais alto nível e com uma base científica sólida, com dados trabalhados do ponto de vista científico. Porque é que se passa isto? E o outro dia vi no jornal a média dos jovens que aqui estão hoje e o Carlos Coelho há bocadinho confirmou-me, e eu cheguei à conclusão que a vossa média de idade quer dizer que vocês nasceram pelo ano em que eu me tornei Ministra da Saúde. Portanto, estão a ver como eu sou muito mais velha, muito mais velha. Foi o ano em que o Professor Cavaco Silva se tornou Presidente do PSD, foi o ano em que terminou o Governo do Bloco Central, o que também talvez faça explicar porque é que as pessoas hoje quando se fala do Bloco Central se perguntam um pouco do que é que exactamente estamos a falar. Há algumas coisas que talvez seja bom que a gente relembre. Eu estou a falar para vocês mas podia estar a falar para os meus filhos que são ligeiramente mais velhos e que também não se lembram dessas coisas senão da irritação que tinham por a mãe passar quase o dia todo fora de casa. E, portanto, há 22 anos eu era quase Ministra da Saúde. Era Secretária de Estado da Segurança Social e uns meses depois era Ministra da Saúde. Foi há uma eternidade, de facto. E quando as pessoas me falam muitas vezes dos tempos como Ministra da Saúde, e se era assim e se era assado e se era mais não sei o quê. São tempos que, para mim, foram vividos de uma maneira extraordinariamente intensa, quer durante, quer depois. Eu tenho a sensação de que estou mais perto do que de facto estão. E passaram-se imensas coisas de então para cá. Deixem-me só, a propósito disto, do interesse dos jovens na política, eu tinha 25 anos quando foi o 25 de Abril. E nessa altura, a quantidade de jovens que se inscreveram nos partidos políticos, que se dispuseram a participar naquilo que estava a acontecer, que se interessaram vivamente pelo o que é que era uma democracia, como é que viviam os países europeus que muitos portugueses conheciam muito bem porque eram emigrantes ou familiares de emigrantes. E, portanto, tinham uma noção sobretudo em relação a muitos países europeus, o que é que era isso da democracia, do que é que era a alteração que estávamos a sofrer. Muitíssimos jovens mergulharam na vida política, então. E não só muitos jovens, muita gente com mais idade e com muita categoria, muitos grandes profissionais, muitos grandes portugueses se lançaram então na política e naquela fantástica aventura de durante uns anos acharmos que íamos mudar tudo. Quando uma aventura destas começa é assim, vamos mudar tudo. Havia muita coisa que estava mal, Portugal vira-se para a Europa, passa a ser um País europeu, adquire democracia, liberdade, passamos a poder ver filmes. Vocês imaginam o que era um mundo onde nós não podíamos ver filmes senão no estrangeiro ou ler livros senão no estrangeiro, onde as pessoas podiam ser presas porque traziam livros do estrangeiro e os tinham em casa, e os tinham que ter escondidos porque se não estivessem escondidos podiam-lhes acontecer coisas desagradáveis. Há um filme interessantíssimo na televisão, aliás, que tem passado no Canal 1 que se chama “Conta-me como foi”. Extremamente interessante, extremamente interessante na reprodução que faz de tudo, das mentalidades, dos hábitos, do que é que as pessoas comiam, como é que funcionavam, de como é que era a relação entre as mulheres e os homens, de como é que era a influência do Estado, da Igreja, da polícia, de tudo, é interessantíssimo. E é bom, mas eu tenho a impressão que as pessoas mais velhas acham mais graça. Pelo menos, consigo conversar sobre a série, muito mais com pessoas mais velhas a lembrarem-se de como era do que talvez suscite o interesse dos mais novos para aquelas coisas que eram dos tempos dos nossos avós. Bom, a verdade é que eu vivi uma fase em que fazer política era uma coisa nobre, em que a gente que se interessasse por essas coisas era nobre, em que discutirmos isso era nobre. Como é que íamos fazer? Como é que íamos mudar o mundo? E todos nós sabemos, um fenómeno que vamos constatando e que não é, infelizmente, ai de nós, exclusivamente português, todos nós sabemos que as pessoas se foram afastando a pouco e pouco. Embora esteja a acontecer agora num sítio do mundo que não é cá, um fenómeno interessantíssimo de interesse renovado pela política que eu presumo que, se calhar, todos nós estamos a seguir, que o curso aliás da Universidade de Verão vai também seguir muito de perto que é o que se passa com as eleições nos Estados Unidos. Ninguém sabe muito bem como é que isto vai acabar ou começar, não sei, no dia das eleições. Não sabemos. Mas a verdade é que traduz alguma coisa, eu pelo menos sinto-a assim, mesmo em relações a pretéritas eleições nos Estados Unidos. Eu acho que nunca andámos todos tão mobilizados por umas eleições em qualquer sítio ou, pelo menos, há muito tempo que não sentia isso e sentimos que isso existe mesmo lá.

Ora bem, partidos políticos fazem parte da democracia, aprendemos isso tudo, sabemos isso, hoje temos a certeza absoluta e não nos passa pela cabeça que seja reversível uma situação em que em Portugal há partidos políticos que disputam as eleições, que ambicionam exercer o poder, os partidos políticos são para ambicionar exercer o poder, evidentemente e dizemo-lo todo. Quer dizer, qualquer militante do PSD como qualquer militante doutro partido diz, naturalmente, que acreditará mais num governo seu do que num governo de qualquer outro. Aliás, em Portugal as coisas oscilam basicamente entre dois partidos com ou sem alianças com terceiros e acreditamos que somos capazes de fazer melhor. Mas a verdade é que hoje temos dificuldade em explicar bem às pessoas porquê, em que é que nós somos melhores, em que é que nós criamos a diferença, porque é que vale a pena que as pessoas se interessem por isto tudo. E eu gostava de pegar num assunto que a nossa Presidente do Partido falou, embora num patamar diferente, e tentar trazê-lo para o interior do Partido. E estou a falar na importância das coisas sociais. Como sabem, a Dra. Manuela Ferreira Leite quando fez campanha para Presidente do Partido disse com toda a clareza que havia um défice de atenção em relação aos dramas de carácter social que muitos portugueses estão a viver, e estão, nós sabemos. Olhamos para os números, mas não precisamos de olhar para os números, muitas vezes basta-nos olhar em volta, basta-nos entrar numa farmácia, num supermercado, noutro sítio qualquer, na rua e perceber que há, de facto, muitos dramas sociais neste momento a ocorrer em Portugal, que há problemas muitíssimo sérios. E a minha convicção e era sobre isto um pouco que eu queria reflectir convosco, é assim. Nós somos um partido político, o nosso grande objectivo é a conquista, é o exercício do poder. Isso faz sentido em nome de princípios e valores, evidentemente. O Dr. Francisco Sá Carneiro ensinou-nos isso desde o princípio, que havia coisas que estavam acima dos partidos, que eram mais importantes que os partidos e que o PSD, que ele chamou PSD, primeiro foi PPD, mas isto agora faz parte da nossa história porque havia um outro partido que conseguiu registar-se antes nós como PSD. E, portanto, nós tivemos durante uns anos de nos chamar outra coisa até que esse partido desapareceu e o Dr. Francisco Sá Carneiro tomou a iniciativa de dar ao partido o nome original que era PSD. Temos princípios, temos valores e é isso que interessa. Mas temos, evidentemente, de ser capazes de formular esses princípios e esses valores. E temos, se calhar, de olhar para dentro do nosso partido e de pensar como é que nós dentro do partido podemos traduzir essa ideia de que as questões sociais não só em Portugal mas em muitos outros lugares do mundo devem estar no centro da atenção das sociedades em geral. Aliás, estão no centro da atenção das pessoas comuns, das pessoas que não têm militância partidária, das pessoas que sentem essas dificuldades. E como é que, nós, partidos podemos traduzir essa proximidade com a forma como as pessoas sentem esses problemas. Não é dizer só, queremos ganhar as próximas eleições porque somos melhores. Ou temos um programa partidário que é melhor porque aqui e ali e acolá, fazemos doutra maneira e fazemos melhor. E o que eu queria propor um pouco à meditação dos jovens companheiros que aqui estão é: porque é que nós não tentamos envolver mais as nossas estruturas partidárias em questões de carácter social? Isto também tem a ver com a outra questão de que vamos seguramente falar que é a importância da sociedade civil. Estou certa de que isso vai aparecer, já apareceu aí numas perguntas que eu vi por aí. E todos temos consciência de que há uma questão de fraqueza da sociedade civil portuguesa face à presença do Estado ou àquilo que nós esperamos do Estado, daquilo que a gente espera da Administração, da forma como ao mais pequeno problema toda a gente se vira imediatamente para quem é supostamente responsável no Estado ou na Administração e porquê agora? Há uma dose de justiça, naturalmente, em perguntar aos responsáveis políticos e da Administração Pública sobre como é que pensam ou como é que resolvem ou como é que reagem às questões da insegurança, às questões do desemprego, às questões do acesso aos cuidados de saúde e a todas as outras. Mas também há uma dose em que esses problemas são nossos e já agora, não enquanto partidos com programas para quando no exercício do poder actuarmos de acordo com princípios e valores que têm a ver com essas coisas todas. E na oposição também falarmos em nomes de tudo isso. Mas não haverá um espaço para nós enquanto militantes partidários aparecermos de uma forma mais forte e mais presente nesses domínios todos? Não haverá? Há uma coisa aqui que o meu amigo Carlos Coelho fala sempre que é a história das mulheres, e a minha mania e não sei quê. Graças a Deus cada vez é uma mania mais espalhada e sinto imensa satisfação em olhar para esta sala e ver que estou a falar com jovens que são rapazes e são raparigas e que alguém no partido se rala como esses equilíbrios, fico muito satisfeita e muito contente porque sem um empurrãozinho por muito importantes que as coisas sejam, não chegamos lá. Mas essa é uma das causas. Mas é uma entre outras, entre muitíssimas. Porque é que as nossas estruturas do partido que, neste momento, a gente tantas vezes sente como pouco activas, não reúnem muito as secções, as pessoas não vão muito lá, não vão muito discutir. Mas às vezes eu também percebo, vão discutir o quê? Não é só esta história da discussão interna de se a gente gosta da líder se não gosta da líder, se devia ser outro, se devia não sei quê, que são as questões que, aparentemente, são aquelas porque as pessoas dão. Não é disso que estou a falar. São as questões reais que existem na nossa sociedade. Além de as discutirmos, envolvermo-nos. Todos sabem, acho eu, o que é que são instituições particulares de solidariedade social. Presumo que todos sabemos o que isso é. São lares de pessoas de idade, são creches para crianças, são instituições para deficientes, são soluções para inúmeras situações de fraqueza, de fragilidade que existem. Porque é que os nossos militantes, não enquanto militantes, enquanto cidadãos, (que as pessoas sabem que são militantes do PSD), não escolhem, não discutem nas suas estruturas, seja na JOTA, seja nos cursos não sei de quê, seja nas secções, seja nas distritais, como é que podem emitir sinais de real proximidade com aqueles que estão agora a passar por dificuldades mas que podemos ter sido nós, podemos ser nós e quando formos velhinhos, meus amigos, vamos passar todos por isso. Porque já todos percebemos que a sociedade envelhece e que há uma altura a partir da qual, a solidão e as dificuldades e muitas vezes problemas que nem sequer são de carácter material, nos assolarão a todos para além de todos os outros que teremos de enfrentar ao longo da vida. Portanto, a minha sugestão é: pensemos como é que nas nossas estruturas e eu acho que se isso viesse dos jovens era tanto mais interessante, eu admito que muitos dos jovens que estejam aqui e que se interessam pela política e que só por isso, do meu ponto de vista, já merecem a minha admiração e o meu respeito, também estejam envolvidos em estruturas desse tipo. Eu não estou a propor, nem me passa pela cabeça, que estruturas partidárias assaltem instituições particulares de solidariedade social como outras fazem. Não estou a propor tal coisa, nem me passa pela cabeça. São dois mundos distantes tal como, por exemplo, o mundo da Fundação não tem nada com o mundo do partido. Portanto, são dois mundos diferentes. Mas se se sentisse nas nossas estruturas que o partido além de em termos de programa de governo, de problemas nacionais sérios, é feito de militantes que sentem essa proximidade com essas dificuldades, que se aproximam dessas instituições, que ajudam a dar-lhes vida e a dar-lhes juventude, e elas muitas vezes precisam de juventude, não tanto por as pessoas que lá estão terem um bocadinho mais de idade, mas porque precisam de serem pensadas doutra maneira, de serem encaradas no âmbito duma sociedade em que já não é o Estado que vai resolver tudo. As IPSS não são para andar só a pedir ao Estado que lhes entregue mais dinheiro, são para coisas bem mais complexas e difíceis do que isso. Será que as nossas estruturas partidárias não podiam discutir dentro de si, como é que nós que somos cidadãos interessados, somos cidadãos envolvidos, somos cidadãos que queremos as coisas melhores neste País, que sonhamos, evidentemente, com a conquista das estruturas do poder pelo partido porque é para isso que enquanto partido político nós existimos, mas com essa conquista para realizarmos valores e para pormos em execução princípios, não para outras coisas que também podemos aqui falar, se quisermos. Mas, além disso, mostrarmos na nossa vida como cidadãos com inscrição partidária e com preocupações partidárias e com a situação de valores e de princípios partidários que também somos cidadãos envolvidos nas questões sociais, na vida onde estamos inseridos e pode ser nas Universidades onde, provavelmente, muitos de vós o fizeram ou o estão a fazer ou nas instituições de jovens do que quer que seja. Será que não podemos fazer isso? Será que não podemos transmitir que o PSD é um Partido que para além de em termos de oposição ou de poder se preocupar com essas políticas, é um partido feito de gente que vive essas questões, que se envolve nessas questões, que quer conquistar o governo e as autarquias mas não quer conquistar as instituições particulares, nem as misericórdias, nem nada disso. Mas que se envolve na vida dessas instituições, que lhes transmite juventude, ideias novas, um mundo muito diferente onde estamos a viver hoje, enfim, eu presumo, eu sei seguramente que estes jovens que estão aqui serão uns privilegiados no sentido de terem muito mais informação do que muitas pessoas terão sobre o mundo em que vivemos e que não tem nada a ver com o mundo em que eu nasci, nem com o mundo onde eu fui Ministra, nem coisíssima nenhuma. É um mundo muito diferente. Um mundo onde toda a gente está muito mais perto de toda a gente e ao mesmo tempo também está muito mais afastada de toda a gente porque aquela tecnologia que nos permite comunicar de perto também nos permite que esse perto exista entre quem está longe. Portanto, há aqui uma ambiguidade entre as vantagens e as desvantagens. Portanto, eu gostava de vos deixar não soluções para como é que nós podemos trazer mais gente, mas eu acho que se nós fizermos um esforço grande no sentido de quem é militante do partido, quem se aproxima das nossas estruturas, quem frequenta as nossas sedes ou quer que seja ligado ao partido, também está envolvido noutras causas sociais, também está pessoalmente envolvido nisso, interessado nisso, que o partido incentiva que as pessoas o façam, eu acho que esse era um sinal importante para as pessoas, mais importante do que muitos outros, para as pessoas perceberem que somos um partido diferente. Porque, no fundo, é só quando isso for bem compreendido ou é no momento em que isso for bem compreendido que as pessoas nos escolherão. As pessoas hoje sabem que têm uma influência enorme nas eleições, o julgamento sobre o governo que sai e é verdade. Todos nós sabemos isso. Mas nós queremos conquistar o poder também com base na confiança em nós, no partido. E a confiança em nós começa na confiança nas pessoas que são militantes do partido, nos interesses dessas pessoas, nos valores que essas pessoas têm na sua vida, naquilo que fazem, naquilo a que se dedicam. E, portanto, se me permitem, lanço aqui, deixo aqui enfim esta ideia de talvez pudéssemos nas estruturas do partido ser mais activos, mais intervenientes, empurrar mais as pessoas para que participem de uma maneira ou doutra em coisas que são caras, que são importantes aos cidadãos em geral, sejam ou não militantes do partido, a maior parte deles nem sequer são. A maior parte deles até nem terão muito respeito pelos partidos, mas que estão ralados com a saúde deles, com o emprego deles, com a forma como vão envelhecer, como o sítio onde vão deixar as crianças para trabalharem, com a forma como as jovens mães vão poder manter simultaneamente os filhos cuidados como deve de ser e manter a sua carreira profissional, ai, nisso toda a gente está interessada. Estou certa que nós também estamos todos. Dêmos um sinal de que a nossa ligação ao partido também tem essa dimensão.

(APLAUSOS)

 
Dep.Carlos Coelho
- E entramos nas perguntas dos grupos. O grupo laranja, Diogo Açafrão.
 
Diogo Açafrão
- Antes de mais, boa noite. Cumprimentos à mesa, Dra. Leonor Beleza é um grande prazer tê-la aqui e penso que falo em nome de todos os grupos. É uma honra recebê-la. E a minha questão debruça-se sobre as mulheres na política. Todos sabemos que as mulheres, em termos percentuais, têm menos participação na política e está a ser discutido e até possivelmente criada uma lei que é a chamada lei das quotas em que, de certa maneira, os partidos são obrigados a ter um certo número de mulheres nas suas listas para o bom funcionamento. Eu acho que quando vejo aqui as mulheres que estão presentes na Universidade de Verão, nenhuma delas veio cá obrigada. E todas elas têm uma participação muito positiva e algumas delas, se calhar, até mais positivas que até os homens. E a minha questão é se a Dra., é a questão do grupo laranja, ao fim e ao cabo, concorda com esta legislação que vem impor uma certa percentagem de mulheres nas listas. Obrigado.
 
Dra.Leonor Beleza
- Bem, essa é uma história, a legislação não vem, já cá está. Aliás, já foi aplicada em Lisboa, salvo erro, portanto, não foi? Nas últimas eleições em Lisboa, por acaso não tenho a certeza, eu julgava que nas últimas… ainda não foi. Bom, porque a legislação vale para a Assembleia da República, vale para as Autarquias Locais e vale para o Parlamento Europeu. Bom, essa é uma questão em que a posição oficial do PSD foi contra, mas a minha posição pessoal é a favor. Portanto, eu divirjo e isso, enfim, é público, eu disse isso várias vezes, portanto, não é propriamente uma novidade. Sabem, eu trouxe comigo um artigo e, já agora, o Pacheco Pereira vem cá falar convosco daqui uns dias. O Pacheco Pereira não gosta muito de quotas, não se considera femininista e tem às vezes posições muito diferentes daquelas que eu tenho em relação a estas questões. Mas escreveu uma das coisas mais brilhantes que eu alguma vez. Em relação à questão das mulheres, escreveu uma coisa absolutamente extraordinária que eu acho muito melhor do que muitas mulheres escreveram sobre as suas próprias questões. É muito em torno do desemprego e do que significa o emprego/desemprego para as mulheres, enfim, numa fase em que, infelizmente, estavam e estão a fechar muitos empregos em que trabalhavam e trabalham mulheres. E que exprime duma maneira absolutamente notável, eu acho que até o vou deixar cá porque poderá ter escapado eventualmente a alguns, mas que fala duma maneira absolutamente notável sobre porque é que este drama do desemprego actual que é um drama para toda a gente porque passa por ele e para as famílias de toda a gente passa por ele, tem um significado especial, de alguma maneira, para as jovens mulheres. Nos meus tempos não era comum as mulheres todas trabalharem, não era assim uma coisa óbvia. Fazerem política, muito menos. Portanto, a ideologia oficial há aqui uns anos atrás era que as senhoras eram para estarem em casa a tratar da sua família e que quando tinham certas profissões até eram proibidas de se casar porque se achava que não poderiam decentemente tratar dos filhos e dos doentes, por exemplo, e coisas assim… E a verdade é que a taxa de actividade feminina, portanto, a taxa de participação das mulheres no mundo do trabalho era infinitamente inferior àquela que é hoje. Eu hoje imagino que jovens da vossa idade, homens e mulheres, imaginem dificilmente um mundo em que o trabalho não seja partilhado entre homens e mulheres, que as mulheres não estejam no mundo do emprego. E o que ele explica aqui duma maneira, repito, absolutamente notável é o retrocesso na autonomia individual e na liberdade individual de cada jovem mulher que, de repente, se vê privada do seu próprio trabalho e se vê na necessidade de “voltar”, pode não ser a história pessoal dela, mas é a da mãe dela ou da avó, “voltar” a depender de terceiros e nem sempre as pessoas realizarão até que ponto, sendo o desemprego um drama para toda a gente, na vida das mulheres pode representar uma volta para histórias antigas em que as mulheres mais do que os homens dependiam de terceiros para fazer o que quer que fosse, para decidir o que quer que fosse. Quando a minha primeira filha mais nasceu, a Constituição da República Portuguesa já existia e já dizia que os direitos eram iguais para todos e que era revogado tudo o contrário. Mas a verdade é que o Código Civil ainda dizia que o meu marido é que mandava na minha filha. E com isto quero dizer-vos que não tem assim tantos anos, mas aqui há uns anos atrás, as leis, os costumes, a tradição, as mentalidades, a cultura transmitiam ideias muito diferentes daquelas que nós hoje, em geral, vamos tendo sobre qual é o papel de homens e mulheres na sociedade que somos. E também acho que devíamos saber e ter consciência que as coisas a que gente se apega muito, e eu estou a pensar sobretudo nas mulheres, desculpem lá, eu acho que a gente se apega ainda mais a isso, não são coisas ganhas para o resto da vida. E que há situações, hoje, no mundo muito complicadas em muitos países ocidentais aonde certos valores eram considerados adquiridos duma vez e aonde certas ideias que, no princípio pareciam progressistas, o multiculturalismo, aceitar que os outros todos sejam diferentes e que os outros façam tudo de outra maneira e por aí fora, se sobreponha a algumas coisas, entre elas, e uma das que me preocupa muito, não é a única, nem de perto nem de longe, mas uma das que me preocupa muito, o estatuto das mulheres e de muitas mulheres que hoje vivem em países ocidentais e que vivem com direitos, com situações completamente diferentes daquelas que foram muito difíceis a muitas mulheres ocidentais obter. Posto isto, vamos lá um pouco mais à política. É verdade que hoje na generalidade dos empregos há homens e há mulheres, é verdade que hoje as pessoas já não tremem de susto se entram numa cabine de pilotagem num avião e vêm que o comandante é uma mulher, começa a ser uma coisa que acontece muitas vezes. Já não acham que uma Ministra é um Ministro, coisa que me quiseram chamar durante algum tempo quando há 22 anos atrás eu passei a ser o que eles, na altura, diziam, Ministro da Saúde. Mas tive, enfim, a compreensão do Presidente da República e do Primeiro-Ministro para que eu não era o Ministro da Saúde, mas a Ministra da Saúde. Hoje não passava pela cabeça de ninguém chamar Ministros às Ministras que existem, pela cabeça de ninguém. E até tenho um papel muito divertido, não quando fui Ministra, mas quando fui Secretária, eu acho que posso contar esta história. Eu fui Secretária de Estado antes de ser Ministra e aí também tive alguma guerra porque as Secretárias de Estado também eram Secretários de Estado.

E eu fiz saber que eu não era o Secretário de Estado mas a Secretária de Estado. Fui obedecida como seria natural, mas recebi um cartãozinho que guardei, a explicar a Sra. está enganada porque a Sra. não é nada Secretária de Estado. O titular do seu cargo não tem sexo, salvo seja e, (Risos) portanto, é por Secretário de Estado que deve de ser designada e não por Secretária de Estado. Isto foi, há vinte e tal anos, quer dizer, não era mais nada. A verdade é que hoje, eu acho que, em Portugal, ninguém discute que as mulheres ocupem situações políticas, acho que ninguém discute isso seriamente. Não passa pela cabeça de ninguém. Não é esquisito. Não é uma coisa que as pessoas achem, ninguém discute que o líder seja (como eu acho que temos a felicidade de ser) uma mulher. Até mesmo no tempo da Eng.ª Maria de Lourdes Pintasilgo que já foi aqui há muito tempo atrás e em que a questão era politicamente complicadíssima, não fazia assim tanta confusão, nem era a história dela ser mulher que verdadeiramente era o grande problema, embora tenha sido já há muitos anos. O que eu acho estranho é que, aceitando nós todos com facilidade que as mulheres ocupem cargos políticos, não achamos esquisito que haja tão poucas. Eu não sei se me faço perceber. Quer dizer, nós aceitarmos que seja assim. Eu acho que as pessoas já não acham nada estranho que uma mulher mande no que quer que seja. Pode haver muitos comportamentos que depois subtilmente não são iguais e garanto que não são. Pode haver muitas coisas desse género. Agora, o que não há é, generalizadamente, a ideia de que é uma vergonha que um governo tenha só duas mulheres Ministras, por exemplo.

Aliás, saberão e eu, já agora, também vou contar outra pequena história, quanto mais velha sou, mais gosto de contar as histórias que me foram acontecendo. Eu devo ao Dr. Durão Barroso quando era Primeiro-Ministro, ter-me convidado para integrar a delegação portuguesa que foi à Santa Sé assinar a Concordata entre a Santa Sé e Portugal. A Concordata é um Tratado especial ou é um Tratado internacional mas tem uma natureza especial porque uma das partes é sempre a Santa Sé e a outra parte é o Estado. E o Dr. Durão Barroso levou consigo uma delegação praticamente só de mulheres, praticamente só de mulheres porque as havia nesse tempo. Era a Ministra das Finanças, a Ministra dos Negócios Estrangeiros, a Ministra da Justiça, eu que era Vice- Presidente da Assembleia da República, a Presidente da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias. Portanto, eram três Ministras e duas Deputadas, uma Vice- Presidente e a outra, nessa qualidade de Presidente da primeira Comissão da Assembleia, portanto, a Comissão da Assembleia que tinha a ver directamente com esse tipo de questões. E ocorreu uma coisa que no Vaticano nunca devem ter visto. Que era que a primeira fila, havia uma mesa em que o Tratado foi assinado entre o Cardeal Secretário de Estado e o nosso Primeiro-Ministro e, depois, as delegações do Vaticano e de Portugal estavam situadas dos dois lados. E então, eu costumo dizer a brincar, havia saias na primeira fila dos dois lados. (Risos) Eram as saias dos Cardeais e as saias das Senhoras do lado de Portugal. E eu acho que aquela situação, na altura, deve ter causado alguma estranheza. À noite no jantar que houve na Embaixada de Portugal oferecido pelo Primeiro-Ministro aos dignitários da Santa Sé e onde estavam muitos Cardeais, na mesa principal quem representava Portugal eram só mulheres. E os Cardeais perguntavam: quem é aquela? Ministra da Justiça. E aquela? Ministra dos Negócios Estrangeiros. E aquela? Ministra das Finanças. E eu tive a sensação, meu Deus, que coisa tão rara. Eu acho que o Dr. Durão Barroso também achou uma graça especial que aquela situação ocorresse. Aliás, a Comissão dele que tem tantas mulheres como homens, como sabemos. E a verdade é que depois, hoje, temos um governo que tem duas mulheres Ministras e ninguém acha assim uma coisa muito esquisita. É bom ou é mau? As pessoas podem dizer. Está bem, põem lá os competentes e é pela competência que a gente vai lá. Tudo bem. A gente começa a olhar para cada um e, (eu não estou a chamar nada de especial a ninguém), olhando para a Assembleia da República ou para o governo ou para não sei onde, não consigo perceber que seja o critério da competência que pôs lá cada homem e cada mulher que lá está. Deus queira que também tenha contado. Mas não consigo perceber. Por amor de Deus, eu não estou a chamar incompetente a ninguém. Eu só estou a dizer é que o argumento da competência é o argumento falso porque se as pessoas quiserem procurar bem, como o Carlos Coelho quis aqui, é possível, é perfeitamente possível encontrar mulheres e homens competentes e incompetentes. Há-os dos dois lados. Não é nenhum privilégio que exista de um lado ou do outro. Há muitas mulheres que são capazes de fazer muitíssimo bem o que quer que seja o que for que esteja em causa. Há com certeza mulheres, não me venham com esse argumento da história da competência com o qual eu estou de acordo. Eu não peço a ninguém que ponha mulheres incompetentes onde quer que seja. E também agradeço que, já agora, não ponham homens incompetentes. Portanto, não estou a dizer isso. O que eu estou a dizer é, dizer que no critério da escolha só conta a competência e é por isso que as mulheres não estão lá, não é verdade.

Aliás, todos nós sabemos muito bem que há inúmeras quotas que contam para constituir o que quer que seja. Porque são os que são dos distritos daqui e dos distritos dali e dos concelhos daqui e dos concelhos dali, e do equilíbrio profissional, o equilíbrio, Deus queira porque é importante, um equilíbrio de origem, às vezes até de grupos dentro do partido, de locais, de tudo isso. Mas porque é que esse raio desses equilíbrios todos não conduzem a um outro equilíbrio que também é importante? Não é o único, mas que também é importante. E porque é que eu acho que é importante? Eu explico. Nem é só por causa daquilo que Pacheco que, aliás, não tem nada a ver com a política, tem a ver com o emprego. Porque é que é importante? Porque quanto mais diversos forem os corpos que mandam, que escolhem, que decidem, quanto mais diversidade houver, quanto mais experiências diferentes houver, mais probabilidade há de que as coisas sejam vistas de todos os pontos de vista. E a verdade é que não é a mesma, a experiência que ainda hoje a maioria das mulheres e a maioria dos homens têm. Eu não vou falar de sensibilidade, também pode haver problemas desses. Não vou tentar ir por aí, nem por complementaridades, não vou tentar ir por aí. Mas, pelo menos, histórias de sensibilidade e de experiência há, seguramente, com diferenças. E, portanto, por alguma razão, alguns países, alguns daqueles que nós consideramos mais desenvolvidos, alguns daqueles que nem sequer consideramos mais desenvolvidos, têm vindo a evoluir neste sentido. E eu tenho um bocadinho de vergonha quando a gente olha para a Espanha e para a França, e para a Alemanha e para os países nórdicos, sobretudo, porque eu acho que são um exemplo absolutamente notável nisto, eu tenho bocadinho de vergonha. E depois sabem, nós, no PSD já passámos por não sei quantos líderes que prometeram que faziam sem quotas, não era preciso. Que sim senhor que não era preciso fazer isso mas que faziam. E eu já ouvi essas promessas de não sei quantos. Como ando nisto há muitos anos, já ouvi muitas promessas e já comecei a ficar um bocado farta de que as coisas e, por isso, embora eu tenho dito muitas vezes que detestaria ser a Ministra da Quota ou de qualquer outra coisa da Quota. Se é assim que vamos lá, então, pronto, começamos assim. É lançar mão de uma coisa que não é bonita, que não dá nenhuma satisfação a nenhuma mulher e eu acho que é bom que tenhamos a consciência disso. Eu, pessoalmente, não gostaria que olhassem para mim a dizer, ela até incompetente, coitada, mas tem saias e portanto serve. (Risos) Portanto, eu detestaria que alguém olhasse para mim assim, portanto, eu percebo perfeitamente que para as mulheres não é uma coisa que lhes cause muita satisfação, mas eu acho que se é assim que se as coisas se empurram. Eu fui reler há algum tempo, as actas de comissão parlamentar que interrogou os líderes de todos os partidos sobre isto. E os líderes de todos os partidos, alguns deles estão lá, juraram que punham lá tantas mulheres como homens. Juraram que fariam isso. Não é divertido. É que, de facto, ainda é tão pouco relevante. Vocês sabem que as nossas listas de deputados iriam para o lixo em qualquer país nórdico? Em qualquer país nórdico um partido, aonde a lei não tem quotas. Ao contrário do que as pessoas pensam, em nenhum pais nórdico a lei exige quotas nos partidos políticos. Exige quotas na Noruega nas direcções das empresas, o que está a causar uma perturbação muito grande em muitas cabeças. De facto, aí, sim. Passaram a exigir 40% de mulheres nos Conselhos de Administração das empresas. Mas é o único caso. Portanto, nos outros casos foram os partidos que, pura e simplesmente, adoptaram esse tipo de comportamento. Eu preferia vinte mil vezes ver o PSD fazer isso nas suas diversas estruturas de jovens e dos não jovens, e dos não sei quê, em vez de precisar de uma lei que nos obrigue e tenho um bocadinho de vergonha disso ter de ser feito através de lei. Mas eu prefiro que se faça através de lei e que através de lei se dê, de facto, a oportunidade a que as mulheres mostrem que são capazes de fazer coisas, que eu não sei muito bem se precisam ainda de demonstrar, mas para quem ainda ache que sim, do que não se faça coisa nenhuma. E perdi sempre esta guerra, esta guerra perdi-a sempre dentro do PSD. Portanto, nunca consegui convencer ninguém a que o PSD votasse isto. Portanto, voto vencida, mas não convencida.

 
Dep.Carlos Coelho
- Grupo amarelo, Tiago Paulas Santos
 
Tiago Palas Santos
- Boa noite. Reitero os cumprimentos que foram feitos tanto à mesa como aos meus companheiros. A pergunta que o meu grupo queria fazer era: tendo em conta que criticou a partidarização que existe na Administração Pública e todos temos conhecimento do exemplo do Dr. Paulo Macedo que teve mérito na recuperação que fez, que medida ou que medidas o governo pode fazer para, no caso do ordenado, contornar a questão do ordenado para recuperar, neste caso, as finanças? Obrigado.
 
Dra.Leonor Beleza
- Eu vou passar a despachar-me mais, já percebi que tenho que ser mais rápida. A história do Dr. Paulo Macedo não tem nada a ver com a história da partidarização quando eu falo dela. Aliás, saberão que o Dr. Paulo Macedo foi nomeado pela Dra. Manuela Ferreira Leite quando era Ministra das Finanças e se manteve depois quando houve a alteração do governo. E a questão do vencimento é uma história separada da questão da partidarização. Pode ser uma questão muito importante para escolher certas pessoas para certos cargos, evidentemente. Mas é uma questão diferente da partidarização. A minha posição em relação à história da partidarização da Administração Pública ou da eventual, é absolutamente contra. Ainda bem que me dá oportunidade de dizer isto porque eu acho que isso é um dos problemas sérios que nós temos em Portugal. Eu acho que, devagarinho, se foi instalando a ideia de que o partido que está no poder deve escolher dos seus para dirigir ou para estar numa série de lugares da Administração Pública. Essa ideia foi-se cimentando a tal ponto que, hoje, se transformou em lei em relação aos cargos mais elevados da Administração Pública, não no sentido de dizer que as pessoas têm de ser do partido, mas no sentido de dizer que os cargos caem automaticamente quando muda o governo. Eu julgo que isto é errado. E porque é que eu julgo que isto é errado? Porque eu acho que as eleições dão ao partido o direito de governar, de fazer as grandes escolhas políticas e, evidentemente, o direito de dirigir a Administração Pública. Mas a Administração Pública deve ser absolutamente independente. É claro que o Ministro é do partido, que o Secretário de Estado é do partido, que as pessoas do gabinete podem ser do partido ou, pelo menos, têm que ter a confiança política dos membros do governo, que os Governadores Civis são militantes do partido ou da confiança política. Portanto, estou a falar de cargos de confiança política. Mas, para mim, onde chega a Director-Geral isso acabou. E, portanto, a minha posição pessoal resultante de um misto de experiência, quer de carácter político, quer de funcionária pública que eu ainda sou, e da experiência que vi de um lado e do outro, a minha convicção absolutamente firme é que a Administração Pública não deve ter nada a ver com os partidos políticos. Portanto, o Director-Geral é nomeado por não sei quanto tempo, quando termina o tempo o membro do governo de uma maneira ou de outra tem o direito de o substituir, mas não há uma alteração, nem automática, nem semi-automática, nem através de leis que fingem que mudam ou que tentam, através de mecanismos fingidos, permitir a substituição do pessoal, não deve haver isso. Porquê? Porque a Administração Pública deve actuar de forma absolutamente apartidária e também por causa de outra coisa que eu acho que é muitíssimo séria e a que acho que nós não ligamos suficiente importância. E essa coisa tem a ver com estabilidade. Eu acho que a estabilidade em quem manda, seja a que nível for, a estabilidade ao nível do governo, coisa criada pelo PSD e que eu gostaria que fosse o PSD a repor como ideia extremamente importante. Aliás, temos sido coerentes nessa questão mesmo quando a estabilidade não é do nosso lado. Quer a nível do governo e acho, por exemplo, que quando olhamos para a diferença entre a Espanha e Portugal, alguma coisa se explica por sermos capazes de dizer todos os nomes dos Primeiros-Ministros espanhóis desde que eles têm democracia mas, se calhar, não sermos capazes de fazer da mesma maneira em relação a Portugal porque eles tiveram muito menos mudanças a esse nível do que nós tivemos. Mas a estabilidade também na Administração Pública.

Um hospital aonde a pessoa que manda está lá seis meses, não é possível que funcione. Uma escola, uma universidade, a universidade é diferente por causa do regime de eleição e algumas escolas também, mas isso também levanta outro tipo de problemas. Um sector da Administração Pública onde a pessoa que manda não é profundamente conhecedora das coisas, número um, segundo, não garante uma estabilidade interna suficiente no tipo de medidas que são tomadas, sobretudo quando é um organismo de execução, na forma como as coisas são trabalhadas, nos saberes que são transmitidos, de facto, é mau. É mau. Eu estou sempre a falar de hospitais porque isso, para mim, é uma obsessão especial. Um hospital quando vêm eleições ou basta que vá mudar o Ministro, a pessoa que está à frente do hospital perde, imediatamente, o poder. E isso é fatal em termos de definição de estratégia de uma máquina complexa, seja ela qual for. A mesma história se passará com uma empresa, com o que quer que seja, imaginem as diferenças se estivessem a mudar de dirigentes também dessa maneira? E, já agora, também porque a gente anda sempre a ler coisas, um dos últimos números do Newsweek que eu leio habitualmente, trouxe uma série de artigos, de reportagens, de dados sobre a evolução do ensino e da educação em muitos países do mundo. E numa avaliação que faz da educação pré-universitária nos Estados Unidos em relação à qual o julgamento é muito negativo, muito negativo, uma das coisas que diz lá pelo meio, é que a falta de estabilidade de quem manda nas escolas pré-universitárias é dramática. E eu olhei para ali e só estou a falar dum bocadinho, num País onde a gente pode falar de quase tudo e perceber que em quase tudo as pessoas estão sempre a mudar, para além questão da actuação não partidária absolutamente essencial, mas onde as pessoas estão sempre a mudar. Eu nunca tive problema nenhum em trabalhar nem com Directores-Gerais, nem com Directores de hospitais nem com o que quer que fosse, que fossem daqui, dali ou de acolá do ponto de vista partidário e, algumas vezes, não sabia donde é que eles eram. Exigia-lhes lealdade, isso sim. Mas isso é uma outra coisa. Exigia-lhes execução das políticas que eram definidas por mim. Claro. Mas isso faz todo o sentido e um bom funcionário público sabe, muito bem, fazer isso. E se isso violenta as suas convicções profundas também tem um caminho. Portanto, não há nenhum problema desse ponto de vista. Eu própria como funcionária pública trabalhei sob as ordens de um governo socialista e nunca senti que isso afectasse nalguma coisa, a minha dignidade, a minha independência, a minha capacidade e a minha competência na forma como redigia as coisas que eram destinadas a ser apreciadas por alguém que não era do meu partido. Portanto, é assim, para mim. Política para os políticos, Administração Pública para quem sabe servir, para quem chega lá acima ao fim de uma carreira em que estudou, sabe muito, aprendeu muito, tem uma grande experiência e sabe através dessa experiência e dessa competência realmente ajudar o governo que lá esteja seja ele qual for.

 
Dep.Carlos Coelho
- Vamos agora passar para blocos de duas questões e o grupo rosa, Romeu Sequeira, e do grupo roxo Carlos Almeida.
 
Romeu Sequeira
- Boa noite, Dra. Leonor Beleza. Antes desta abordagem quero, mais uma vez, em meu nome e em nome do meu grupo e penso que em nome de todos os presentes que estão neste salão dar-lhe os mais sinceros parabéns por todo o trabalho que tem feito não só ao serviço do PSD mas ao serviço de todo o País. O que me traz cá é uma abordagem um pouco diferente. Recentemente, assistimos a uma acção rara do Sr. Eng. José Sócrates. Digamos que ele inaugurou o Centro de Oncologia de Trás-os-Montes e Alto Douro, digamos que é um aparte daquilo que se tem assistido devido à actual reforma do Serviço Nacional de Saúde que ele tem feito. Ou seja, assistimos a uma diminuição drástica de muitos serviços a nível da saúde. Mas, além disso, verificamos também que no seu discurso, ele teceu um grande elogio à Dra. Leonor Beleza devido a uma diminuição, na altura, com o cargo de Ministra da Saúde, fez uma diminuição dos blocos de operatório para, digamos, os nascimentos de todos os portugueses. Desta forma, gostaria de saber qual foi a forma como recebeu este elogio e também o que acha ou o que pensa também desta actual reforma que Sr. Eng. José Sócrates tem feito no nosso País?
 
Carlos Almeida
- Muito boa noite. Antes de mais, em nome do grupo roxo e penso também de todos os presentes, gostaria de cumprimentar a Dra. Leonor Beleza e agradecer-lhe, mais uma vez, por estar hoje aqui presente. Em relação à pergunta que nós formulamos, tem a ver com as suas actuais funções na Fundação Champalimaud. A Fundação Champalimaud é uma Fundação que tem como objectivo apoiar a investigação, a nível nacional e internacional. E a nossa questão é: até que ponto, a nível nacional, há uma prioridade de apoio aos nossos investigadores, já que nós em Portugal estamos a assistir a taxas de desemprego de quadros altamente qualificados, elevadas, que têm levado a que muitos deles têm que sair deste País e ir para outros países, nomeadamente os Estados Unidos da América? Muito obrigado.
 
Dra.Leonor Beleza
- Ora bem, eu vou tentar não entrar em questões de carácter muito pesadamente político, mas queria dizer-vos o seguinte. Sobre a história do fecho das maternidades e essa coisa toda, saberão, de certo, espero, que a taxa de mortalidade infantil em Portugal, hoje, é uma das melhores do mundo, das mais baixas. Tão baixa que eu confesso que nunca nos meus melhores dias acreditei que pudéssemos chegar, de facto, aonde neste momento chegámos. Isso deve-se ao esforço de imensa gente, de muitas coisas que aconteceram que tiveram a ver com uma organização minuciosa de serviços e com uma participação muito grande de muita gente, nomeadamente de muitos médicos das especialidades relacionadas. E que nalguma medida tiveram a ver, sim, com o fecho de maternidades. Esta é uma história que, naturalmente, as pessoas vêm sempre com alguma dificuldade mas que eu acho que, neste momento, as pessoas percebem porque é que é. Se uma mulher a dar à luz, aparece num lugar onde a experiência é muito baixa, com uma situação de alto risco das que não pôde ser prevista antes do parto, essa mulher pode correr risco de vida e a criança também, inutilmente. Esta é uma história que é assim. Quer dizer, isto não é uma coisa que os políticos dizem. Isto vale, aliás, para a obstetrícia como vale para todas as áreas de exercício da medicina. Um serviço qualquer de medicina é bom se trata o número suficiente. É bom se tem lá gente boa e por aí fora, e muitas outras coisas, equipamento e tudo isso, mas precisa de um certo nível de situações para que o pessoal esteja em condições de atender o melhor possível o que quer que seja que lá apareça. Portanto, isto não é só verdade para a obstetrícia. Também não é só verdade que a mortalidade infantil, e a mortalidade materna desceram muito em Portugal, só porque se fechou locais onde havia partos, mas também é verdade que aconteceu por causa disso. Eu lembro-me que um dos meus piores dias como Ministra da Saúde, foi um dia em que uma mulher morreu a dar à luz. É inaceitável! É bom que as pessoas saibam. Num País como Portugal com os meios que nós temos que uma mulher morra por causa da maternidade é inaceitável. Não há nada que o justifique. Ela pode ter outra coisa qualquer que a mate. Agora, a situação de maternidade, de dar à luz, o estar grávida, o pós-parto, não há nenhuma justificação que um País com o nível do nosso possa ter situações dessas. E eu lembro-me que um dia em que era Ministra, uma dessas maternidades que estava para fechar ou numa dessas maternidades, uma mulher morreu a dar à luz. E foi um dos piores dias como Ministra que eu passei. Porque se essa Senhora em vez de ter dado à luz ali, tivesse dado à luz no sítio que era recomendado, onde havia todas as respostas possíveis para a situação dela, essa Senhora não tinha dado à luz crianças que hoje não têm Mãe. Não sei se era uma ou se eram duas. Não tenho a certeza já se era um parto de gémeos se era de uma criança só. Portanto, é bom que as pessoas tenham consciência disto. O problema não é a gente querer ali, o médico ao pé da porta. O problema é ter uma equipa onde haja o obstetra, o pediatra, o anestesista, a máquina, as coisas todas e uma ambulância como deve de ser para a transportar para outro sítio se for preciso serviços de carácter neonatal de grande nível. Portanto, foi isso tudo que foi feito e eu, desculpar-me-ão, às vezes também já tenho idade para fazer umas queixinhas, mas maça-me um bocado que no meu partido algumas pessoas não tenham estudado, bem, bem, bem, esta história. E que cada vez que esta história volta ao de cima, as pessoas reajam de uma maneira instintiva. Perdoem-me se há alguém de lá, eu lembro-me no meu tempo, então, vai deixar de haver Olhanenses porque era uma das maternidades que foi fechada. Pior, fechei a maternidade da terra do meu marido que é o Montijo. Então vai deixar de haver Montijenses, eles achavam que tinham uns direitos especiais porque era a terra do meu marido. Esse processo foi politicamente difícil. Agora não é só isso que faz descer a mortalidade, é uma série de coisas conjugadas. E eu, uma das penas que eu tenho cá dentro, é que cada vez que esta história é falada, nós não nos tenhamos mostrado capazes de explicar como é que as coisas foram, que nem sequer tenhamos usado o relatório que foi feito no tempo do Ministro Correia de Campos sobre a situação nas maternidades e aonde se propunha que determinadas outras fossem fechadas. A leitura desse relatório dava pano para mangas para a gente sobre o assunto sem estarmos só com aquela obsessão de fechar ou de deixar de fechar maternidades.

     Quanto à história da Oncologia, não sei o suficiente, mas também vos digo é uma história sobre a qual eu não quero falar porque o Centro Champalimaud vai fazer Oncologia. E, portanto, eu estou nesse ramo neste momento e, portanto, não quero, prefiro não emitir publicamente muita coisa porque compreenderão, vou ser competidora também com muitas outras instituições nesse domínio e competidora no bom sentido. Eu apenas quero fazer as coisas um bocadinho melhor, bastante melhor do que é que se fazem e, sobretudo, fazê-lo melhor através duma investigação de nível, de facto, enfim, mundial que se pudesse fazer em qualquer outro País.

     Quanto à história nacional e à história dos investigadores. É verdade que há algumas décadas a esta parte e, em particular, na área em que eu me insiro, portanto, da investigação biomédica, Portugal tem uma elite de gente, não é só na área da investigação biomédica, também há nas outras, mas eu nesta conheço melhor. Conheço as pessoas, tenho falado com muitas delas, conheço-os melhor. Portugal tem uma elite de gente muito jovem, muitíssimo qualificada que andou e anda pelos melhores sítios do mundo e que perguntada se querem voltar para casa, normalmente respondem, sim, se houver condições, não, se não houver vou para São Francisco. E essas pessoas encontram, de facto, que fazer em qualquer lado. Eu devo dizer que o que eu tenho pena não é tanto de que haja tantos portugueses que fiquem lá fora como que a gente não recupere em investigadores nacionais e estrangeiros, o número de investigadores nacionais que mandamos lá para fora. Porque os centros de investigação ideal são centros onde há gente de origens muito diferentes. Se entrarem, num grande centro numa universidade americana, não fazem a mais pequena ideia de qual é o País das pessoas que estão ali sentadas. Pela cara deles conseguimos, mais ou menos, perceber de que continente vêm, mas acabou. O resto, o que percebemos é que há uma diversidade enorme na origem das pessoas. E nós queremos isso também cá. Queremos uma ciência que seja feita por gente vinda donde quer que seja e as pessoas trabalham em conjunto bem, são de línguas diferentes, de culturas diferentes, se olham para as coisas de maneira diferente. A ciência não tem fronteiras. Pode ser feita por gente de qualquer lado mas o apport que cada um traz é um apport marcado pela sua origem, pela sua cultura, pela forma como aprendeu, pela forma como vê o mundo e é enriquecido o mundo. Agora, atenção, não estejamos a pensar que são as instituições do Estado que têm de resolver, sozinhas, esta questão. Porque quando normalmente falamos nisto o que dizemos é: os laboratórios do Estado, os laboratórios das universidades, os não sei quê, não absorvem estes, não absorvem aqueles. Não. O nosso problema é que o sector público e o sector privado não absorvem tantos investigadores de alto nível quantos aqueles que nós mandamos lá para fora para se qualificarem. Mas o sector privado também ainda não tem uma cultura suficientemente forte de precisar e de pedir, e de empregar gente muitíssimo qualificada. É um problema de carácter nacional. Como muitos outros, não é um problema do Estado e dos laboratórios do Estado.

 
Dep.Carlos Coelho
- Mais duas perguntas. Grupo encarnado, João Almeida e grupo cinzento, Bruno Barracosa.
 
João Almeida
- Sra. Dra. Leonor Beleza, muito obrigado pela sua presença, mais uma vez, já foi repetido vezes sem conta durante esta noite. Antes de mais, eu gostaria de referir uma nota algo pessoal mas creio que todo o meu grupo concordará comigo, agradecer por nos ter presenciado com este discurso à pergunta anterior em que mostrou que as boas ideias não dependem de cor partidária, mas, sim, de boas ideias, única e exclusivamente e muitas vezes isso tem sido negado. A nossa pergunta é a seguinte: gostaríamos de saber quais as dificuldades que encontra para o bom funcionamento de uma Fundação como a que preside no nosso País? Maiores dificuldades. Obrigado.
 
Bruno Barracosa
- Dra. Leonor Beleza, muito boa noite, antes de mais. Devo começar por dizer que tive oportunidade de ler, não agora mas há cerca de um ano atrás, alguns excertos da sua intervenção no ano passado. E fiquei bastante satisfeito por ter demonstrado claramente que defende, apoia e acredita na participação dos jovens na política. E a pergunta acaba por se enquadrar um bocado nessa área, aproveitando também um paralelismo que fez relativamente, por vezes, à avaliação que é feita das capacidades e competências das pessoas para a selecção para os quadros e associando, obviamente, já que falamos de juventude, aos jovens. Por isso, contextualizando o que o grupo cinzento gostaria de saber é a sua opinião relativamente ao relacionamento entre o PSD e a JSD e uma avaliação histórica relativamente ao comportamento do partido no que concerne à integração nos seus quadros de jovens talentos da JOTA. Obrigado.
 
Dra.Leonor Beleza
- Em relação ao que chamaram dificuldades da Fundação, para mim, a primeira dificuldade foi descobrir o que é que a Fundação devia, efectivamente, fazer. E porquê? Porque o Sr. António Champalimaud quando a criou disse que a Fundação se destinava a apoiar a pesquisa científica na área da medicina, é a expressão que ele utilizou, e não disse se a Fundação devia fazer investigação própria, se devia apoiar investigação feita em universidades ou noutras instituições, não disse que se devia tratar de cancro, de neurociências, de coração, de diabetes, de doenças mentais, o que quer que fosse. Portanto, não emitiu instruções, apesar de, na única conversa que teve comigo em que me perguntou se aceitaria ser Presidente duma Fundação que ele ia criar, eu lhe ter pedido, transmita-me pela forma que quiser, instruções, por favor, sobre como é que quer que as coisas sejam feitas. Mas, de facto, ele escolheu não transmitir instruções. E, portanto, as coisas mais difíceis, às vezes as pessoas podem pensar diferente, sobretudo porque a liberdade que eu tinha e a minha equipa tinha era muito grande. Era muito grande porque o património da Fundação é, de facto, enfim, muito suficiente para podermos fazer muitas coisas, nunca é suficiente para fazer tudo o que nos passa pela cabeça, mas é muito suficiente para podermos fazer muitas coisas. Depois porque, de facto, as escolhas eram imensas, porque podíamos olhar para o que se faz em Portugal ou para o que se faz noutro sítio qualquer. Porque podíamos escolher ajudar outras instituições, enfim, tínhamos amplitude de escolhas muito grande. A coisa mais difícil foi fazer as escolhas como, aliás, fazer escolhas é sempre muito difícil. Até mesmo em coisas pequeninas. Sabemos que quando temos que escolher é dificílimo. Portanto, a parte mais difícil, pelo menos até agora, foi fazer as escolhas. Foi escolher o perfil de funcionamento da Fundação em que assentámos e que é basicamente fazer investigação sob nossa conta e risco, directo, num centro de investigação nosso. As áreas em que intervimos, basicamente, cancro, neurociências e visão. Como é que escolhemos parceiros? Como é que íamos à procura daqueles que nos podiam ajudar? Isso foi muito do caminho percorrido até agora. Depois, todos sabem que escolher pessoas, escolher o sítio, mandar fazer um edifício, tudo isso é difícil e, portanto, tudo isso encontra dificuldades. Mas eu quero deixar claríssimo e honestíssimamente deixar claríssimo que eu tenho contado com toda a colaboração possível e imaginária por parte do actual governo e por parte da Câmara de Lisboa, como por parte, aliás, de outras entidades que intervêm neste processo. Portanto, tenho, de facto, contado com uma enorme ajuda, com uma enorme colaboração e, por isso, muitas das dificuldades que eu poderia estar a enfrentar em relação à escolha do sítio, em relação a questões de licenciamento etc. O edifício que nós vamos construir vai-se situar numa área de 60.000 m2, na melhor zona de Lisboa, possível e imaginária. À beira do Rio Tejo, muito perto da Torre de Belém. A área de construção, nesta primeira fase, vai ser 50.000 m2. É, de facto, uma coisa extremamente complexa, precisa da intervenção de muitíssimas autoridades de toda a ordem, de projectistas, de equipas, de muitíssimas coisas. Foi da minha responsabilidade e da responsabilidade, evidentemente, da Administração da Fundação, escolher os projectistas, quem é que faz, como é que é, como é que o edifício é, tudo por aí fora. Mas contei com uma enorme ajuda das autoridades e, portanto, não posso, desse ponto de vista, dizer nada, antes pelo contrário, em relação a dificuldades que tenha encontrado, embora aqui e ali elas surjam, mas as pessoas ajudam a ultrapassá-las. Agora, eu quero honestamente dizer-vos, a nossa aposta que é fazer um centro de investigação de nível mundial para onde investigadores dos melhores queiram, de facto, vir, não porque está cá a Mãe deles ou a mulher deles ou a terra onde nasceram ou outra coisa qualquer. Não só por isso. Graças a Deus, isso às vezes também ajuda. Mas não só por isso, mas porque é bom. Isso é em si muito, eu não quero estar a armar-me, mas é difícil de fazer. A dificuldade maior em fazer isto é a dificuldade nossa da Administração da Fundação, daqueles que trabalham na Fundação. Temos sido ajudados por quem está de fora, temos tido a sorte de encontrar até entre as pessoas que trabalham connosco e que dirigem o projecto e tudo isso, colaboração, temos encontrado entre, por exemplo, grandes cientistas em todo o lado, uma colaboração extraordinária. Acho absolutamente extraordinário que eu entre num sítio e que um Prémio Nobel qualquer, uma pessoa reconhecidíssima tenha pachorra para falar comigo durante não sei quanto tempo e de me explicar imensas coisas. É certo que eu transporto uma história fabulosa em si. Uma história de uma Fundação criada desta maneira é uma história fabulosa em qualquer sítio do mundo. As pessoas reconhecem isso e têm curiosidade em saber como é e como é que é foi, e o que ele mandou fazer e o que é que a gente vai mandar fazer. E também têm gosto em ajudar-nos. Mas é extraordinário como se encontra essa colaboração quando ela é procurada. Lá porque somos portugueses ou porque estamos num País no qual a gente, às vezes, gosta mais de se queixar do que pensar noutras coisas, nós não somos incapazes de fazer coisas boas, bem feitas. Aliás, alguns dos melhores disseram-me isso mesmo. A Senhora perca lá essa ideia de que porque é portuguesa ou porque trabalha num sítio cientificamente mais isolado do que outros, não vai poder fazer uma coisa world class. Quer dizer, pode fazer, pode, tem é que criar as condições, de fazer saber que a Fundação existe. Eu há bocadinho estava aqui a dizer que a semana passada tive um gosto extraordinário em ver nos Los Angeles Times que eu nunca tinha lido sequer, não sei se alguma vez quando passei lá por esses sítios se terei lido o jornal, não me lembro sequer disso, nunca tido lido, um artigo sobre a Fundação Champalimaud. Fiquei cheia. Porquê? Tudo começou com uma coisa publicada na Nature que é uma das mais importantes revistas mundiais de ciência em torno de um americano que dirige o programa de neurociências e que está cá, e que quis vir para cá em vez de ir para outro lado. E, portanto, a Nature veio cá tentar perceber que esquisitisse é que havia para aí. E depois os grandes jornais pegam nisso e descobrem que isso existe. É claro que temos feito tudo para que isso aconteça porque se não souberem lá fora o que é isso, Champalimaud, as pessoas também não se lhes põe a hipótese de vir para cá. Portanto, temos feito tudo para nas instituições científicas aparecerem lá uns painéis com o nosso patrocínio, com o nosso logo. Tivemos imenso cuidado na construção do logo. O Rodrigo nos tempos em que estava connosco também nos ajudou nessa coisa. Portanto, a identificar um logo que as pessoas olhem e vejam que somos nós e em pôr isso em todos os lados onde pudermos. Cada vez que damos um patrocínio para uma coisa que achamos que muita gente lê, muitas cientistas, (são esses que a gente quer), pôr lá o logo, Fundação Champalimaud e suscitar-lhes o interesse em ver. Mas ouçam, eu sei que nós temos dinheiro que nos permita também fazer isto. Mas eu acho que aquilo que nós podemos fazer em Portugal, que pode ser muito bom, percebem? Nós temos de acreditar nisso. Pode ser muito bem. Eles que achem esquisito, lá aquele país, de repente, tenha lá assim umas criaturas. Mas nós podemos, de facto, fazer. Essas criaturas aparecem, vêm, algumas que eu nem sabia que sabiam quem nós éramos. Neste momento, já não há universidade inglesa que não me tenha escrito a fazer imensas perguntas. Eles são, aliás, habilidosíssimos a descobrir quem é que tem algum dinheiro, habilidosíssimos. Portanto, todas as universidades inglesas me escrevem a perguntar o que é que a gente faz e o que é que não faz e não sei quê, e algumas americanas. Eu sou visitada periodicamente por pessoas das grandes universidades americanas que fazem um périplo por todo o lado à procura de tudo, de dinheiro, de gente, do que é que há, do que é que se está a passar. E a gente tem de aprender com eles e tem que começar a fazer as mesmas coisas. Também ir atrás deles e também perguntar-lhes, e também tentar seduzir as pessoas, e também tentar explicar às pessoas que somos um País lindíssimo, que nunca tem 20 graus abaixo de zero, como no sítio onde há, provavelmente, mais cientistas do mundo, de vez em quando, têm 20 graus abaixo de zero. Não deve ser muito divertido. A gente nunca tem isso. Temos um sítio bonito e vamos ter, sobretudo, boa ciência feita ali dentro porque é isso a coisa mais importante, é que a ciência valha aquilo que o Sr. António Champalimaud sonhou que queria para a Fundação.

A questão é sobre o relacionamento entre o PSD e a JOTA. Eu hoje tenho alguma dificuldade em saber, não estou dentro dos meandros como estive noutros tempos. Mas aquilo que eu sei é que desde o princípio, o PSD valorizou e valoriza as questões da juventude. Isso é um ponto em que acho que ninguém estará em desacordo. Eu acho que o ponto mais importante daquilo que me perguntou é assim: quando o PSD anda à procura de pessoas para fazer coisas, pensa nos jovens como eu gostava que pensasse nas mulheres ou não? É isso que perguntou? É isso? Então, se é assim, eu respondo-lhe, nas mulheres não pensam, de certeza, que chegue. Eu acho que pensam um bocadinho mais nos jovens por razões que têm a ver com a organização interna do partido, eu, desculpar-me-á, mas eu acho que pensam um bocadinho mais nos jovens do que é que pensam nas mulheres. O que eu tenho pena é que a JOTA ainda não pense nas jovens, o suficiente. Eu não sei muito bem como é que as contas hoje estão, não sei muito bem, ainda não perguntei, não sei muito bem. Mas eu gostava que a nossa JOTA fosse a mais activa e mais resistente às mãezinhas das jovens que não querem que elas vão não sei aonde ou aos paizinhos ou lá o que é que é, a dizer nós só fazemos bem as coisas se as fizermos em equipa, se as fizermos em partilha, se as fizermos a pensar nas coisas todas e por aí fora. Mas não sei ir muito mais longe na resposta porque, hoje, tenho um conhecimento muito mais limitado de como é que as coisas no interior do partido são, de facto, determinadas. Agora, eu tenho a certeza que a JOTA sempre entrou mais para a história das quotas que eu vi que são importantes no partido, do que entraram as mulheres, jovens ou sem serem jovens.

 
Dep.Carlos Coelho
- Eu vi os vossos retratos falados e uma das perguntas mais interessantes é saber o que é que vocês querem ser daqui a dez anos. Um dos vossos colegas diz que quer ser um político respeitado.

Gostei muito do adjectivo. E essa resposta de alguém que daqui a dez anos quer ser um político respeitado faz-me obrigar a fazer uma coisa feia. Que é violar uma promessa. Eu tinha-vos dito, ontem, que só fazia um brinde, que era o brinde ao nosso Presidente da Câmara e que, a partir desse dia os brindes eram todos vossos, mas não posso deixar de propor-vos um brinde a alguém a quem eu vou passar a palavra depois. Que só soube mais tarde no nosso convívio e de forma discreta, de que ontem fez 26 anos. Portanto, eu proporia que levantássemos os nossos copos ao Luís Castro que daqui a dez anos vai ser um político respeitado. Luís, a palavra é sua.

(Brinde e Aplausos)

 
Luís Castro
- Bem, depois disto não é fácil falar. Antes de mais, um muito obrigado a todos pelo gesto, sem dúvida estou muito sensibilizado, até um pouco nervoso, mas acho que estou perdoado. Em nome do grupo castanho, é um enorme orgulho e satisfação que nos congratulamos por estar aqui na presença de uma figura tão ilustre da nossa sociedade portuguesa. Prometo ser breve e não me vou alongar muito mais porque os meus colegas já disseram tudo o que poderia haver para dizer e a questão é a seguinte: será a saúde, o negócio do futuro? Muito obrigado.
 
Dep.Carlos Coelho
- Muito obrigado, Luís. E agora passo a palavra ao representante do grupo anfitrião e não posso deixar de, em nosso nome, de toda a organização, mas também da Dra. Leonor Beleza, de agradecer o vosso convívio e o facto de nos terem recebido na vossa mesa porque esta é a mesa do grupo verde como nos próximos 4 jantares será a dos outros 4 grupos a quem coube o privilégio de serem anfitriões dos nossos convidados. E passo a palavra à Rita Batista.
 
Rita Batista
- Boa noite a todos. Quero, antes de mais, agradecer a possibilidade de privarmos com personalidades de tamanha elevação intelectual e faço este agradecimento em nome do grupo verde. A Sra. Dra. tem demonstrado uma grande preocupação pelas questões sociais e tem demonstrado também uma preocupação com a insegurança e com a indisciplina nas escolas. Que medidas propõe para que isso seja alterado? Obrigado.
 
Dra.Leonor Beleza
- Ora bem, em relação à história do negócio, isso mexe evidentemente com o carácter público ou privado do sistema. Ouça uma coisa. A saúde foi sempre um grande negócio. Sempre. Porque hoje quando nós falamos no público e no privado e mais não sei o quê, o que é que a gente está a pensar? Nos hospitais e na prestação de cuidados, basicamente. Mas algumas das maiores empresas do mundo vendem quê? Medicamentos, equipamento médico, material variadíssimo necessário à prestação de cuidados de saúde. Essas entidades têm um poder e eu vou usar uma palavra um bocado forte, desmesurado. E porquê? Porque de uma maneira ou de outra, essa questão hoje é tão falada nos Estados Unidos que eu acho que nós, europeus, até temos alguma dificuldade em perceber porquê. Nos Estados Unidos há dezenas de milhões de cidadãos sem cobertura de cuidados de saúde e tem sido um dos assuntos mais discutidos durante a campanha eleitoral, em particular por parte dos democratas, talvez alguns já não se lembrem mas a Sra. Hillary Clinton quando era Primeira Dama foi encarregada pelo marido de dirigir um grupo que fizesse uma alteração profunda no sistema de saúde americano. Esse grupo trabalhou, foi muito discutido por muitíssimas razões, aliás, eu acho que em larga parte começou aí uma grande oposição pessoal a ela de que ela ainda hoje ainda fala. Há muitos americanos que não gostam nada dela, em parte porque ela presidiu a esse grupo sem ter passado, nem por uma eleição, nem por aquilo que se chamam os hearings do Senado Americano que talvez saibam, portanto, os cargos mais importantes nos Estados Unidos que não são eleitos, as pessoas que os exercem passam pelo Senado por uma discussão com os Senadores que ou dizem ou dizem não e, às vezes, dizem não. Ela não passou nem por uma coisa nem por outra, era First Lady. E isso foi um dos problemas, mas outros problemas muito mais fundos eram a profundidade da alteração do sistema que ela propunha e que, basicamente, transformava o sistema em universal. Como é próprio de um País como eles, rapidamente identificaram quem eram os que perdiam e os que ganhavam. A história era para as companhias de seguros com grande poder e a verdade é que a reforma foi para dentro de gavetas que ninguém sabe quais são. E o Presidente Clinton fez que toda a gente esquecesse que essa tentativa tinha, na altura, existido. Hoje, voltamos a essa questão e os democratas falam nela com grande insistência porque há, de facto, uma situação do outro mundo nos Estados Unidos em termos de pessoas que têm direito a cuidados de saúde. É uma coisa que nós na Europa temos dificuldade em perceber porque é que é tão complicado. Também é verdade que eles têm o mais caro sistema de saúde do mundo, conseguiram arranjar um esquema caríssimo. Agora, negócio como eu lhe disse, sempre houve e sempre haverá porque há inúmeros sectores aonde não se vão meter outros. Há uma palavra hoje que se usa muito que é translação entre a investigação e o sector da indústria. Até as universidades portuguesas, hoje, já falam muito nisso, e, depois há problemas complicadíssimos de conflitos de interesses. Mas a verdade é que a saúde é, desde há muito tempo, uns dos maiores negócios que existe. E é um dos maiores negócios por uma coisa. Porque como os Estados, digo os governos, não suportam que os cidadãos se sintam desprotegidos nos países onde têm direito a cuidados de saúde, porque a máquina x,y,z que é fantástica curaria todos os cancros se o governo se dispusesse a pagar o respectivo preço. Mais tarde ou mais cedo, a máquina entra naquilo que o governo, de facto, aceita pagar para que os cidadãos tenham acesso. Eu estou a caricaturar, mas não estou a mentir. Estou a caricaturar. Quem diz isso da máquina, diz dos medicamentos. Por exemplo, às vezes, eu não sei quem entra em Centros de Saúde, em Hospitais, vê anúncios, num sítio qualquer, por exemplo, em Trás-os-Montes alguém falou na oncologia em Trás-os-Montes vai haver um encontro para ensinar os médicos a usar a máquina não sei das quantas. Isso é naturalmente organizado pelo produtor da máquina e, naturalmente, organizado para convencer os médicos e, através deles, o sistema que sem aquela máquina as pessoas estão arrumadas. Quem diz isso para a máquina diz para os medicamentos. Muitas vezes, isso é verdade. É verdade que a investigação dos medicamentos e das máquinas é caríssima, mas também é verdade que o que gastam em marketing essas empresas ainda é mais do que aquilo que gastam para conseguir descobrir as moléculas dos medicamentos ou conseguir construir as máquinas. Portanto, não é nenhuma novidade para ninguém. Nada disso. A saúde sempre foi e será sempre um monumental negócio. Repare que o Estado podia ter escolhido pagar a comida ou a habitação, podia ser? Nós também precisamos todos de comer, se o Estado nos pagasse, o que é que a gente ia querer comer? Se o Estado nos pagasse as casas, o que é que a gente queria? O Estado paga-nos a saúde falando, enfim, duma maneira muito simplificada. O Estado paga-nos a saúde e, evidentemente, ainda por cima a saúde, quer dizer, aquilo que é mais caro a cada um de nós. Portanto que cada um de nós quer, evidentemente, o melhor. O que, certamente, os governos também querem, mas vêm-se aflitos para pagar. E muitas vezes, a tal moleculazita que custa uma loucura, de facto, é produzida por uma centésima daquilo que custa. Portanto, o negócio é monumental. Mas eu acho que a sua pergunta era outra. É negócio, agora, em termos de prestação de cuidados. Eu devo dizer que há aqui uma coisa, para mim, básica. E a coisa que, para mim, é básica é acesso de todos a cuidados de saúde em condições de ter cuidados. Eu daqui não saio. Acho que isto é um adquirido, digamos, da nossa cultura, da nossa civilização, não há direito que seja doutra maneira. Aqui há uns tempos atrás, ter dinheiro ou não ter dinheiro poderia querer dizer morrer numa cama formidável ou morrer numa enxerga(?) qualquer. Mas, hoje em dia, quer dizer viver ou morrer. Portanto, não é a enxerga ou a cama, a diferença. A diferença, hoje, pode ser a pessoa ter a operação de que precisa para sobreviver ou não ter ou ter remédio de que precisa para viver de uma maneira decente, ou para viver de uma maneira autónoma ou não pode. E, portanto, o acesso a cuidados de saúde essenciais, em termos universais, é um princípio básico, para mim, que não deve sofrer discussão. Quer dizer, se eles pensam o contrário podem discutir comigo eu não mudarei de ideias sobre isso. Já me é muito menos importante, se isso é tudo feito pelo sector público, tudo pelo privado, tudo feito por uma mistura dos dois. Eu sei que o sector privado tende, naturalmente, a escolher o que lhe convém. É assim. Aonde o que está em causa é negócio e é lucro que não são palavras nenhumas que me metam medo, atenção, aonde aí tendem, naturalmente, a escolher as situações que lhes são também mais interessantes. Mas ao Estado também cabe, se admite que o sector público intervenha e intervenha em algum pé de competição com o sector privado, também compete ao Estado ir lá ver o que é que eles andam a fazer. O que é inaceitável é um sector privado que o Estado paga e não quer saber depois o que é que lá se passa. Isso é que é inaceitável. Como é inaceitável o sector privado, aonde trabalham os funcionários de Estado, para o qual desviam as pessoas que entram para os hospitais. E eu não estou a falar de teoria nenhuma. Isto não é teoria nenhuma. Nem médicos, nem o resto. Se o sector privado tem acesso à prestação de cuidados que o Estado, de uma maneira ou doutra, suporte, então, primeiro, tem que fazer as coisas como deve de ser, segundo, tem que receber as situações que são difíceis e as que são fáceis, e as que estão contratualizadas pelo Estado. O Estado tem que saber o que é que andam lá a fazer. E não podem ser dirigidos, nem ter lá dentro, em qualquer posição, pessoas que possam desviar. E, meus amigos, a história de que as pessoas que precisam de uma operação a um cancro que num hospital público talvez seja feito daqui a uns meses, mas que num hospital privado, muitas vezes em piores condições, é feito no dia a seguir ou na semana que vem, isso é absolutamente inaceitável. Inaceitável. Esse relacionamento entre o público e o privado, eu sou absolutamente contra. Eu não tenho nada contra o sector privado em concorrência leal e devidamente controlado pelo Estado. Nada. O que eu tenho tudo é contra o sector privado que se aproveite da incapacidade e da incompetência do sector público e desta treta. Eu lembro-me também quando era Ministra, uma vez vi num jornal, andavam no Hospital de S. José, não era assim num sítio qualquer, no Hospital de S. José, à noite nas urgências a perguntar aos médicos porque é que estavam a trabalhar ali? E não é que há um médico que respondeu e veio no jornal, e não aconteceu nada, que andava lá para encontrar doentes para o seu consultório. E as pessoas não acharam esquisito. Quer dizer, estão a ver? Estas coisas que se aplicam imediatamente e facilmente na concorrência dentro do sector privado têm de se aplicar também noutros sítios. Grande negócio pode ser, se for bem feito, se as pessoas fizerem as coisas como deve de ser, se prestarem cuidados como deve de ser. Tudo bem. Não tenho nada contra o facto de ser uma instituição privada. Nada. Lucrativa ou sem ser lucrativa, eu sou uma sem ser lucrativa e hei-de prestar cuidados de saúde, isso não me faz qualquer espécie de confusão. Agora, as coisas têm de ser, de facto, muito bem feitas. O que não pode é ser utilizado para as situações, que não oferecem grande dificuldade e onde, as pessoas acham que, não estão para fazer fisiatria e não estão para fazer as outras coisas como, cuidados paliativos em camas que é uma coisa muito complicada. Enfim, há sectores que ninguém quer ou ninguém está muito interessado em pegar neles. Mas se há uma contratualização com Estado que exige que seja assim, então, vamos fazer as coisas a sério, a sério. Eu quando fui Ministra da Saúde proibi, foi uma das coisas que paguei caro, proibi convenções com entidades privadas onde houvessem funcionários do Estado. Portanto, onde qualquer funcionário do Serviço Nacional de Saúde trabalhasse. Já lá foi o tempo, mas proibi.

Bom, quanto às escolas e essa parte é, provavelmente, muito mais complicada, não mais complicada de resolver porque as da saúde não são fáceis, mas eu quando, aqui há milhões de anos, ainda ninguém era nascido aqui, menos eu, andei no liceu, como se chamava, na altura, à escola secundária. Era um liceu do Estado, era uma escola do Estado e eu recebi um ensino de elite, pura e simplesmente. Um ensino de elite, que eu recebi no Estado. Já não sei se pagava alguma coisa, se se pagava era certamente ridículo, como aliás, depois, na faculdade também pagava aquelas propinas esquisitas doutros tempos. Mas era um ensino, de facto, de elite. E não passava pela cabeça de ninguém fazer certas coisas. Quando os meus filhos passaram pela mesma área, numa escola privada, eu já achava esquisito a maneira como eles falavam dos professores, já achava que aquilo não era muito normal. E, de facto, não sei, se calhar da minha idade, tenho quase 60 anos e será de muitas coisas, eu acho que a perturbação entre a relação entre os professores e os estudantes… oiçam, quando eu andava no dito liceu, houve uma vez que na minha aula, a gente fez uma habilidade qualquer que nem sequer era nada de muito extraordinário. Aquilo havia umas árvores lá ao pé e a gente pendurou não sei quê nas árvores, uma coisa qualquer assim inocente. Bom, a reitora que nunca saia do sítio dela subiu dois lances de escadas para nos ralhar e aquilo ficou marcado na nossa cabeça como se tevessemos cometido um pecado inacreditável. Para a reitora do liceu subir as escadas todas, ela já tinha alguma idade, subir escadas não era assim uma coisa, para chegar lá acima e dizer, as meninas são umas malcriadas, umas não sei quê, não sei quê, só havia meninas, claro. Portanto, era um liceu feminino, nessa altura. E aquilo aterrou-nos completamente. Eu não preciso desse terror, nem proponho esse terror, não é nada disso. Mas se eu, na altura, não tivesse algum respeito pelos professores, eu não sei o que é andaria lá fazer. Também quereria que eles me respeitassem, que diabo. O respeito tem que ser mútuo, quer dizer, não de um lado. Eu não estou a propor que os professores voltem àquelas coisas todas estranhas que havia. Muitas vezes olharam para mim como se eu fosse um bicho esquisito sobre a história das eleições. Eu acabei com as eleições nos hospitais. Quando eu fui para Ministra da Saúde, o Director do hospital era um médico eleito pelos médicos colegas. Eu achava aquilo uma aberração do outro mundo e tinha vergonha de dizer lá fora que era assim. A primeira vez éramos um governo minoritário, aquilo chumbou na Assembleia da República, tendo toda a gente percebido que o governo estava cheio de razão. A segunda vez já éramos maioritário e acabou-se aquilo, não houve mais eleições e, depois, ainda houve um restabelecimento, a certa altura, em parte dessas eleições e depois o próprio Partido Socialista acabou com as eleições todas outra vez, de vez, porque era óbvio que não podia ser assim. Quando aconteceu isso nos hospitais, eu ouvi uns dizerem-me no Conselho de Ministros, o pior é que isto se pega à educação. Porque eram as universidades, as escolas, tudo, era tudo eleições. E eu acho que não dá. Acho que não dá que quem governa a escola, seja uma pessoa eleita pelos colegas porque tem de mandar nos colegas. Quer dizer, precisa que a autoridade exista logo entre essa pessoa e os colegas. Com os médicos era a mesma coisa. Um médico cuja vida dependia dos colegas, alguma vez os ia maçar? Quer dizer, maçar no bom sentido, alguma vez ia fazer isso? Quer dizer, os hospitais existem para os doentes e, portanto, a prioridade não podia ser posta na defesa corporativa dos interesses de quem quer que fosse. E eu acho que nas escolas, a história é a mesma. Eu não estou a dizer que os males começam todos aí, eu acho que o primeiro mal começa assim: a família acha que a escola é que tem que educar o menino e a escola acha que a família é que tem que educar o menino. Ora, é melhor porem-se de acordo e o único acordo possível é que ambos têm responsabilidade no assunto. Nos países civilizados, os pais vão às escolas, vão lá, intervêm, varrem a escola se for preciso, organizam as festas. Eu estou a falar dos países ricos. Em vez de reivindicarem que a escola tenha milhares de ajudantes para fazer o trabalho todo, vão lá os pais e as mães, e fazem isso tudo, intervêm, estão nas reuniões, varrem, tomam decisões, discutem com eles. Eu estou a falar dos países nórdicos, dos ricos mesmo aonde o ensino é gratuito, mas aonde os pais não acham que não é nada com eles. E, portanto, há de facto uma coisa que eu acho que começa nas famílias e depois há outra coisa que não é só da escola. Nós, cá, agora, achamos assim. Temos um problema para funcionar porque o tecto está a cair. Fechamos até o governo pôr o tecto no sítio. Temos um problema porque durante o mês de Agosto não há médicos para fazer os partos todos em Lisboa. Eu acho uma coisa extraordinária, com a diminuição de nascimentos que ocorreu neste País, eu não consigo perceber, juro, eu não percebo como é que desceram tanto os números de partos em Portugal, tanto, que conseguem não ter médicos suficientes nas maternidades de Lisboa para fazer os partos. Não percebo. Onde é que os meteram? Então quando em vez de nascerem os meninos que nascem hoje, nasciam o dobro ou mais, como é que era? Claro que nem todos os partos ocorriam nos hospitais até uma certa altura. Mas os partos eram muitíssimos mais do que aqueles que são hoje e todos eram assistidos por médicos. O hospital não sei de aonde diz, agora tenho dificuldade em obstetra no mês de Agosto. Fecho. A Maternidade Alfredo da Costa que se arranje e que faça os partos todos porque, depois, há sempre uma coisa qualquer que resolve. O Tribunal não sei aonde, chove não sei aonde, coisa, aliás, inaceitável. Fecha até que o Ministério da Justiça resolva. Eu não estou a dizer que o Ministério da Justiça não tem que resolver e da Educação e da Saúde e esses. Não estou a dizer isso. Mas dizer sempre que a responsabilidade está no lá de cima, a gente não achar que quem está na escola e no hospital, e no tribunal tem de resolver aquilo é errado. É errado. A pessoa, nem acordou ainda, ainda nem sabe o que é que aconteceu e já está a TSF a telefonar às 7 da manhã a dizer que, durante a noite, resolveram não sei o quê. Aconteceu no meu tempo, acontece de certeza, continua. Desculpem lá mas ainda vou contar uma história. Só uma, só uma, daquelas que é verdadeira, já aconteceu há tantos anos, ninguém se há-de zangar. Eu tinha um problema com o Hospital de Beja, por acaso não é assim muito longe daqui. Ao fim de semana nunca havia anestesista no Hospital de Beja. Estava doente, não havia que chegasse, eu nem cheguei bem a perceber o que é que era. Eu sei que todos os fins-de-semana quando chegávamos ao fim da semana, telefonavam para o meu Gabinete e dizia, vou fechar a cirurgia porque não tenho anestesista. Eu tentei tudo. Convencer internos a ir para lá, fazer trinta por uma linha, tentei todas as coisas que eu achava razoáveis e era sempre a mesma coisa. Até que me ocorreu uma coisa que eu ainda hoje acho que não sei como é que me ocorreu. Telefonei ao Ministro da Defesa e disse assim, tem aí um Coronel anestesista? Ele disse, tenho sim. Então, mande-o para Beja, se faz favor. E eu não sei o que é que aconteceu a seguir, eu sei que nunca mais disseram que não tinham anestesista.

 
Dep.Carlos Coelho
- A Dra. Leonor Beleza conhece as regras da casa, deu-nos o prazer de estar na edição do ano passado e, portanto, sabe que a última palavra é da nossa convidada e, portanto, eu vou dar a palavra aos dois últimos grupos para dirigirem as perguntas, mas não regresso ao privilégio do uso do microfone. E, portanto, esta é a oportunidade para em vosso nome, em nosso nome, lhe agradecer, uma vez mais, a disponibilidade para estar connosco nesta Universidade de Verão e para responder a todas as nossas questões. Últimas perguntas, grupo bege, Nuno Pais, e grupo azul, Maria Pires.
 
Nuno Pais
- Boa noite, Dra. Leonor Beleza. Também faço palavra do nosso grupo bege agradecer a sua presença de nos ter embelezado este nosso jantar. E nós queremos colocar duas questões muito simples e que, no fundo, vão no seguimento de já respostas dadas a outros colegas que tem a ver com a presença das mulheres na política e com a Administração Pública. A primeira questão era: gostávamos de saber até que ponto acha que o PSD teria a ganhar com o Departamento das Mulheres Social Democratas? E a segunda, se acha que o seu cargo na Fundação Champalimaud, neste momento, é mais importante, aliciante para o País que outros cargos públicos?
 
Maria Pires
- Boa noite. O grupo azul gostava de saber qual é o seu parecer acerca dos critérios que são escolhidos para a reforma administrativa na saúde em que se procede ao encerramento de Centros de Saúde e Hospitais, sem olhar às situações e necessidades específicas de uma população que é reduzida a números e estatísticas, retirando-lhes a sua dimensão humana. E, para finalizar, também gostávamos de perguntar, qual é o seu sonho ainda para Portugal depois de tantos anos a servir e depois de uma vida tão preenchida e bem sucedida? Obrigada.
 
Dra.Leonor Beleza
- Essa história das mulheres social democratas, para mim, é uma história com trinta anos, sabe. Quer dizer, no princípio houve algumas ideias em torno disso. Eu devo dizer, em abono da verdade, o Dr. Francisco Sá Carneiro pediu-me no primeiro comício que o PPD fez no Pavilhão dos Desportos que falasse dos direitos das mulheres. E é uma coisa que eu nunca mais me esqueci. Portanto, o fundador do nosso partido, aquele por quem temos, eu tenho um respeito profundo, considerava que as questões dos direitos das mulheres eram das questões importantes da sociedade. E, para mim, isso marcou, desde o princípio, a ideia que eu tenho do partido. Aliás, quero-vos dizer uma outra coisa. Quando ele era Deputado da chamada Ala Liberal, sabem o que era a Ala Liberal? Numa coisa que se chamava a Assembleia Nacional que era o que existia no tempo da ditadura, que era o que estava onde hoje está a Assembleia da República, era o Parlamento da altura quando, evidentemente, as eleições não eram eleições. A partir de certa altura, já na altura em que o Prof. Marcelo Caetano era Presidente do Conselho, ele tentou que um grupo de pessoas não particularmente afectas ao regime aceitassem serem incluídas nas listas da União Nacional, que era o partido único da altura. Coisa que, aliás, não durou muito tempo. Uma dessas pessoas era o Dr. Francisco Sá Carneiro e ele foi autor de uma lei de reforma da magistratura que abria a magistratura às mulheres. Eu não sei se sabem, em 1974, quando eu me formei, foi antes, eu não podia ser Juíza, nem Diplomata, nem Magistrada no Ministério Público. Eu não podia. A lei dizia que eu não podia. Que eu não tinha capacidade, nem discernimento, acho eu. Acho que era isso que eles pensavam porque algum tempo depois a revolução iraniana fez a mesma coisa quando já tinha permitido às mulheres o acesso à magistratura, dizendo que elas não tinham discernimento, aliás, uma mulher a quem ocorreu esse processo foi Prémio Nobel recentemente. O que eu quero dizer com isto é, eu acho que está na base do Partido Social Democrata uma certa ideia de igualdade. Na altura, pensou-se muito se devia haver um grupo de mulheres separado ou se não devia, mas nunca a maioria no partido foi muito favorável a essa ideia. Eu devo dizer que, nesta altura, já não é uma coisa que me fizesse mexer ou me ralasse muito. Eu acho que há um período em que isso poderia ter tido razão de ser. Não me parece que fosse uma coisa que fosse a algum lado porque já desisti de olhar para estas coisas sem ser no sentido de partilha do poder. É disso que a gente está a falar, desculpem lá, não é de fazer umas coisas como outras quaisquer. É, de facto, partilhar o poder. É, de facto, tomar decisões. É, de facto, de influenciar as decisões que são tomadas.

Se é mais importante a Fundação ou outra coisa qualquer. Olhe, eu na semana passada tive o privilégio de estar com uma pessoa por quem eu tenho uma inesgotável admiração que se chama Fernando Henrique Cardoso, foi Presidente do Brasil e assisti a uma conferência que ele fez sobre ambiente, eu não fui lá por causa do ambiente, mas circunstancialmente assisti porque calhou, ia ter com ele e falar ele, e ele fez uma conferência lá. E contou coisas interessantíssimas sobre a evolução dos governos ou quando olham para as questões do aquecimento global, Protocolo de Quioto, dessas coisas todas, Al Gore, por aí fora. E contou como o afastamento de quem foi Presidente da República há muitos anos e não voltará, naturalmente, a ser, mas quem desempenhou funções com a mais elevada responsabilidade que é possível, contando realmente como era. Quando é que os governos se ralavam ou não se ralavam e fingiam que se ralavam e quando é que passavam a ralar-se e a actuar de outra maneira? E contou histórias interessantíssimas sobre isso. Estava na altura presente, (isto passava-se no Estado de São Paulo), o Secretário do Governo Estadual de São Paulo do Ambiente, e ele dirigiu-se para ele e disse-lhe, olhe, sabe, o Senhor tem o azar de ter que resolver essa coisa agora e eu tenho a sorte de poder contar como é que era e de dizer as coisas como me apetece porque eu sou um ex-político e falo à vontade. Bom e eu quando ouvi aquilo, aquilo soou aos meus ouvidos, não só como tendo uma verdade profunda mas como uma a que eu vou achando a minha graça, embora eu nunca tinha sido Presidente de coisíssima nenhuma, nem tenha nada a ver com a responsabilidade. Mas é assim, eu durante muitos anos estive exclusivamente em funções de carácter político. Durante muitos anos dediquei muito da minha vida a isso. Tenho muitas recordações boas e muitas menos boas. Não sei, hoje, entender muito bem que as pessoas tenham um grande encantamento por terem certas funções, mas enfim. Mas não percebo, hoje, muito bem isso, embora ache que é muito importante. Eu não percebo para é que levaram um ano para perceber que os oftalmologistas em Portugal podiam muito bem fazer as operações todas às cataratas. Não percebo. E quando vejo estas coisas, digo assim, se eu lá estivesse, aquela coisa, se eu lá estivesse era a primeira que eu tinha explicado que não era preciso ir para Cuba ser operado às cataratas. Não fazia sentido nenhum. Lembram-se que andamos um ano nisso? Primeiro foi uma Câmara Municipal, depois foi outra não sei de aonde, depois foi mais não sei o quê e depois andámos nisto, isto vinha nos jornais todos os dias, era uma grande glória na terra que ia tudo para Cuba ser operado às cataratas. A operação às cataratas é uma coisa de uma simplicidade, do ponto de vista, digamos, do cirurgião oftalmológico, enorme. Não tem dificuldade nenhuma. Pode fazer uma data delas por dia. A coisa só se tornou séria mesma quando um hospital em Portugal contratou um espanhol para fazer operação às cataratas. O que é engraçado. Acho que foi o Hospital do Barreiro. E então, o espanhol chegou lá, fez numa semana mais do que as operações que os outros todos faziam em vários meses. E aí foi um escândalo monumental. As pessoas perceberam, não pode ser. Quer dizer, finalmente. Levou um ano esta história, a andar para trás com as cataratas, não sei quê, levou um ano. E a Ministra da Saúde teve, naturalmente, de responder e agora como é que é? Começaram todos a falar em listas disto e listas daquilo, e programas disto e programas daquilo, e ela exigiu aos hospitais que resolvessem as coisas e não é que os hospitais resolveram. Reparem, resolveram ou, pelo menos, alguns resolveram. Eu já não sei se, neste momento, já há lista de espera ou se não há. Mas resolveram. Portanto, há coisas que nós não fazemos porque não nos organizamos. E eu quando vejo estas coisas tenho pena de não ter começado logo a gritar, logo à primeira, quer dizer, que diabo, não é preciso ir para Cuba fazer aquilo. Aliás, tomara os cubanos todos serem operados. Mas isso é outra conversa. Portanto, isto para responder se é muito mais importante na Fundação ou não. A minha história com a Fundação não é só uma história de se é importante ou se não é importante. Eu acho que é importante. Eu acho que fazer uma grande instituição de investigação biomédica em Portugal, acho que é muito importante. Honestamente. Acho que estou a fazer uma coisa importante, acho que é importante fazer aquilo com que o Sr. António Champalimaud sonhou. Mas o problema não é só esse. Eu tenho um compromisso com um homem que já não está cá. Ele perguntou-me se eu aceitava fazer isso, eu disse-lhe, aceito. Quando ele morreu, o testamento foi aberto, eu era Deputada e, na altura, tomei a decisão, cumpro o meu mandato até ao fim, estava aliás pelo distrito onde estamos. É sempre uma satisfação para mim voltar a este distrito e vou sempre a ver se as ruas e as estradas todas ainda estão como quando eu era Deputada, ou como estão aqueles desvios que, entretanto, foram feitos, as variantes, a GAP e aquelas todas que naquela altura se discutiam muito. Tenho imensa satisfação em voltar a este distrito. Mas, nessa altura, eu tomei uma decisão. Eu cumpro o meu mandato de Deputada até ao fim, eu aceitei ser eleita Deputada, tenho obrigação de cumprir o mandato a cumprir. Quando o Sr. Presidente da República dissolveu a Assembleia da República, não foi decisão minha, foi dele, acabou-se aquela Legislatura e, portanto, eu entendi que o que eu tinha para fazer era cumprir o compromisso que eu tinha adquirido com uma pessoa, um compromisso que eu acho eticamente acima de muitas coisas. Quer dizer, um compromisso com uma pessoa que fez, criou em testamento aquela Fundação, só se soube no testamento e a quem eu tinha dito que faria isto. Portanto, para mim, não é só de eu achar que é muito importante, que é não sei quê. É um compromisso de uma natureza tal que nem sequer, para mim, é imaginável alguma vez pô-lo em causa, nunca o porei em causa. Devotarei toda a minha vida enquanto tenha juízo e capacidade mental, e capacidade para saber o que é que estou a fazer, todo o esse tempo vai ser devotado a pôr em pé a Fundação, tanto quanto possível, nos termos em que o Sr. António Champalimaud sonhou que isso devia acontecer.

Encerramento de unidades de saúde. Isto é uma história, muito, muito, muito, séria, por um lado, é evidente. Mas também complicada. Em Portugal, há umas regras estranhas que a maior parte dos cidadãos não conhecem sobre para onde é que as pessoas são levadas em situações de emergência. E estas regras, que eu descobri quando era Ministra da Saúde e que, em parte, modifiquei na altura, são algumas extremamente perigosas. Por exemplo, uma pessoa tem um acidente de saúde sério, por exemplo, um enfarte e, segundo algumas regras que se chamam Serviço Público de Emergência, esse serviço tem de o levar para o serviço de saúde mais perto. O que é que acontece? O Centro de Saúde mais perto não pode tratar aquilo e a sequência é manda-o para o hospital onde aquilo pode ser tratado. E quando a pessoa lá chega, o que é que aconteceu? É tarde demais. Portanto, isto é uma história muito mais séria do que, simplesmente, fechar o serviço aqui ao pé onde a gente podia ir buscar a pastilha para a dor de cabeça. Eu tenho que pôr mesmo as coisas assim porque isto é exactamente assim. E continua a ser assim. Um amigo meu estrangeiro teve no Verão passado, uma situação destas das que eu vos estou a descrever, em Portugal.Para sorte dele tinha dois médicos ao pé que tomaram as medidas imediatas. Chamaram o 112. A ambulância chegou e queria à viva força levar o Senhor para o Centro de Saúde. Os médicos que estavam sabiam que o Centro de Saúde não podia tratar aquilo e, portanto, não o leva para Centro de Saúde nenhum. Então, a responsabilidade nossa terminou, levem-no para onde quiserem. Como eram médicos agarraram nele e levaram-no para o hospital que eles sabiam que tinha capacidade para tratar aquilo. Portanto, isto é uma história muito mais série do que, simplesmente, fechar o que está aqui ao pé ou está menos ao pé. Quer dizer, há situações em que a proximidade do Centro de Saúde é um engano para as pessoas, como pode ser a proximidade da maternidade também, pelas razões que expliquei há bocado. O que há é uma coisa muito importante que é assim. Se tem de fechar por razões deste tipo ou por outras quaisquer garante que a pessoa chegue ao sítio onde tem de chegar. O que não é possível é fechar uma maternidade qualquer e a maternidade para onde as pessoas têm de ir não estar ainda em condições de receber as pessoas. Por exemplo, ou dizer deixa-te levar para o Centro da Saúde entre as 8 da manhã e as não sei das quantas e não há uma maneira de transportar a pessoa para o hospital para onde a pessoa tem de ir. Agora, atenção, normalmente quando as pessoas precisam mesmo de cuidados de saúde, normalmente, não é no Centro de Saúde que a questão em causa pode ser resolvida. Se a questão não pode esperar pelas 8 da manhã, pela abertura do Centro, eu não estou a dizer que os fechos são todos bons, não estou a tentar dizer nada disso. O que eu estou a tentar chamar a atenção é que eu já vi vezes demais histórias em que as regras vigentes são perigosas para as pessoas ao contrário daquilo que as pessoas pensam. E vou-lhes contar mais uma história, só, que aconteceu comigo. Houve um desastre muitíssimo grave, um acidente de carro que tinha 3 Deputados do PSD todos da JOTA, aqui há uns anos atrás. Um deles morreu, dois sobreviveram. Esses três Deputados foram transportados para o Hospital de Leiria, isto é uma história exactamente assim. Foram transportados para o Hospital de Leiria, era o hospital mais perto. Telefonou-me a Conceição Monteiro, presumo muitos de vós ainda saibam que é a Conceição Monteiro, que tinha sabido do acidente e que estava na Assembleia da República e disse-me, passa-se isto, nós não sabemos nada do que é que está a acontecer, nós não conseguimos saber coisíssima nenhuma do hospital. E eu telefonei para o Hospital de Leiria, eu sou fulana, quero saber o que é que acontece com três pessoas que foram aí parar, assim e assim. Uma grande confusão, não sei quê, em todas as histórias eram traumatismos cranianos, o que quer dizer que em todas histórias o Hospital de Leiria não tinha medo suficientes para tratar. E, então, o que é que fez? Mandou os três para Coimbra. Vai daí, a Ministra da altura telefona para uma coisa que se chama Hospitais da Universidade de Coimbra que é um edifício enorme que está lá, quem conhece Coimbra saberá, foi já inaugurado no meu tempo, aonde existem todos os médicos, onde existiam, na altura, presumo que, hoje, continue a ser assim, todos os meios possíveis e imaginários para tratar o que quer que fosse tratável. Evidentemente, há situações em que ninguém consegue tratar de ninguém. Telefonei para esse hospital e disse, eu acabo de saber do Hospital de Leiria que foram mandados para aí três pessoas resultado de um acidente de aviação em situação extremamente grave com traumatismos cranianos. Ah, não entraram nada. Não entraram? Desculpe, disseram-me do Hospital de Leiria que foram para aí, devem estar a entrar. Vá lá ver ao Serviço de Urgência. Ah, não entraram não. Não entraram? Oiça, minha senhora, onde é que foi acidente? Foi perto de Leiria? Ah, então, não foram para aqui foram para o CHC. Quem é de Coimbra sabe talvez do que é que eu estou a falar, Centro Hospitalar de Coimbra. Bom, Hospital dos Covões. O que é acontece? O Hospital dos Covões não tinha, na altura, os tais aparelhos que eram precisos para tratar aquela situação. E porque é que eles foram para os Covões em vez de irem para o outro lado? Eu confesso que ainda hoje me passo, para usar a palavra que, certamente, conhecem melhor do que eu, quando penso nesta história. Porque é que tinham ido para os Covões, sabem? Porque quando abriu o Hospital novo, apesar de todas as instruções que tinham para passar para aquele Hospital tudo o que pudesse passar porque eles tinham, maiores que os outros todos, tinham mais pessoal que os outros todos, tinham tudo o que havia de aparelhagem, os dois hospitais fizeram um acordo entre ambos e é assim: acidente ao norte do Mondego vai para o hospital novo, acidente a sul do Mondego vai para o velho. E se eles não tiverem lá TACs para ver se as pessoas têm, tanto pior. E houve um, não sei se dois dos nossos Deputados dessa altura que foi fazer um TAC fora do Hospital dos Covões porque não tinham lá TAC, aos saltinhos na ambulância, em vez de o mandarem para o hospital aonde ele tinha o TAC e mais tudo o que era preciso. E como aconteceu que o Sr. Presidente da República, na altura, foi visitar os nossos Deputados que estavam doentes, os dois que sobreviveram, a primeira coisa que aconteceu foi, Sr. Presidente da República não temos um TAC neste hospital o que é uma vergonha. Evidentemente que o Sr. Presidente da República fez saber ao governo que não havia TAC no Hospital dos Covões. Ao que o governo respondeu, mas há nos Hospitais da Universidade de Coimbra, isso e tudo o resto e não há direito que essas pessoas não tenham sido transportadas para o sítio onde havia tudo. E o que é que aconteceu a seguir? Já agora, também lhes conto, vou ficar como o outro, conto tudo. O que é que aconteceu? Mandei fechar a urgência durante a noite no CHC, pura e simplesmente. Há urgência que chegue para toda a gente nos Hospitais da Universidade de Coimbra, durante a noite aquilo é ao ladinho um do outro, não precisa para nada, a história é mais complicada. Porque o CHC, Hospital dos Covões quando abriu a urgência, o abriu forçado pelo Ministério da Saúde porque os outros não tinham instalações como deviam ser. E, portanto, foram forçados. Mas depois não queriam fechar quando os outros já podiam fazer tudo. Bom, fechei durante a noite, tomei eu a decisão, durante a noite acabou-se a urgência no CHC e a minha ideia era, mais tarde, depois, fechar o resto. Bom, o que é que aconteceu? Ah, e pus uma série de ambulâncias à porta do hospital que era para o que desse e viesse, no que estava fechado. E, então, apareceram coisas fantásticas. Táxis com 4 pessoas para a urgência, dentro de cada táxi. Estão a perceber? Portanto, metiam-se aos 4 no mesmo táxi e iam todos para a urgência à noite no CHC, metia-se tudo na ambulância e ia tudo para o outro hospital. E andámos nesta cena durante uns tempos. O que é que aconteceu a seguir? Houve eleições em Coimbra, o PSD perdeu as eleições, a culpa era da Ministra da Saúde e depois a Ministra da Saúde, graças a Deus, já não teve que resolver o problema daquilo tudo. E quando algum tempo depois vi um acidente ao sul do Mondego, torceu-se a alma, a pensar que aquelas almas iam todas parar ao sítio onde fossem todos onde não se pôde fazer mais. Mas, o que é que eu quero dizer com isto? Não é o sítio mais perto que, só por si, é o sítio mais adequado. Portanto, cuidado, cada coisa tem que ser vista muito bem, se deve ser assim ou se deve ser de outra maneira. E os serviços de saúde deviam determinantemente ser proibidos de fazerem acordos entre eles, seja sozinhos entre eles, seja com as ARS, ou seja com quem quer que seja, que não tenham em atenção, primeiro, antes de tudo, que o doente que está em causa, tem o melhor tratamento ou o tratamento que precisa naquela altura. Não é se é perto, se é longe, se é não sei quê. Não perde tempo a andar a passear por sítios que só pode …

(Dois minutos inaudíveis)

 

 

 

 
10.00 - Avaliação da UNIV 2008
12.00 Sessão de Encerramento da UNIV